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ORÁCULO
A resposta para sua pergunta está lá

PARA QUE LER TANTO

JOBIS PODOSAN

 

Após o término da aula, pouco antes da turma sair, um aluno me fez uma pergunta que a turma paralisou para ouvir a resposta:

          - Professor, o senhor citou 16 livros durante os dois tempos da aula. Isto não seria soberba, exibição inútil de cultura?

          - Vou citar o livro 17. Recomendo-lhe a leitura do livro O Homem que Calculava, do Malba Tahan. A resposta para sua pergunta está lá. Mas antecipo para você. Eu leio muito, não para me exibir, mas para tentar compreender o tamanho da minha ignorância. Beremiz Samir, o homem que calculava, era considerado um grande sábio. E era. Mas observava que se o Saber fosse representado por uma enorme quantidade de açúcar, do tamanho do monte Everest, nenhum homem conseguiria ser maior que um grão de açúcar, de modo que ninguém pode jactar-se de ter o domínio do saber. É por isto que a sabedoria é modesta e a ignorância agressiva. Não é por outra razão que a filosofia significa amizade ao saber e não domínio sobre ele. Por mais sábio que seja um indivíduo, o que ele ignora predomina superlativamente sobre o pouco que ele consegue aprender, de maneira que chamamos sábio tão somente àqueles que detém um pequeno saber sobre certo ramo do conhecimento. O saber profundo exige que se saiba cada vez mais de cada vez menos, o que chamamos hoje especialistas.

Eis algumas pérolas fragmentárias, aparentemente desconexas, que li ou escrevi, do pouco que compreendi nas minhas andanças na vida:

1.    Jorge Amado escreveu uma interessante anedota girando em torno de uma eleição para uma cadeira da ABL. O livro é de leitura deliciosa e se chama Farda, Fardão, Camisola de Dormir, escrito na época mais dura da Ditadura Vargas. Há ingredientes políticos interessantes e uma inusitada resistência dos velhinhos da Academia. Bom de ler, delicioso de reler, melhor ainda de ler de novo e de novo. A cada leitura mais e mais escamas caem dos nossos olhos.

2.    Leia com os olhos de hoje. Você já não é o mesmo que leu na primeira vez e o livro não será o mesmo aos seus olhos experimentados de hoje. Com as retinas fatigadas vemos com maior clareza e profundidade, pois, como nós ensinou nosso escritor maior, "há coisas que só a madureza vê".

3.    A primeira leitura é sempre a entrada do apetitoso ágape, que será saboreado na segunda, na terceira...

4.    Aconteceu comigo um fato curioso: em 1982: Gabriel Garcia Márquez, o Gabo, ganhou o Nobel de literatura com o livro Cem Anos de Solidão. Sofregamente, comprei e li o livro quase de um fôlego só. Decepção profunda. Não gostei e pouco entendi do que li. Porém, meu espírito especulativo me avisou que a primeira leitura é sempre difícil. Meditei, deixei passar alguns dias, li sobre os comentários da crítica e descobri que o defeito poderia estar no leitor e não na obra. Li novamente, com vagar. Reli. Pedi perdão a Gabo e lhe conferi o prêmio Nobel, com louvor.

5.    Já que a meditação de hoje nos fez nostálgicos, vale a pena reler e reler e reler D. Casmurro. Há lições maravilhosas sobre a madureza e vale a pena rever os "olhos de ressaca" de Capitu, segundo aguda observação do agregado e atento José Dias. O velho Machado vale sempre a pena ser relido. A cada releitura, uma novidade!

6.    Para os ímpios vale sempre a pena o ensinamento de Santo Agostinho: “Nas coisas necessárias, a unidade; nas duvidosas, a liberdade; e em todas, a caridade.”

7.    Sobre a caridade: não se fixe no que Deus lhe tirou, porque Ele tirou o que já era Dele, apenas agradeça o que ele lhe deu e que você ainda tem.

8.    Esperança não se mata, se não houver jeito, deixe-a morrer. Ele morre e renasce forte e robusta, a depender da pureza da sua fé e da bondade do seu coração.

Meu caro aluno, quem sou eu para, sabendo o tamanho da minha ignorância, ter a soberba de me exibir perante um grupo que, no seu conjunto, sabe mais do que eu? Dentro em breve, vocês estarão aqui na frente, ensinando suas leituras e experiências aos mais jovens, alguns de vocês com saber superior ao meu, porque a glória do mestre no processo de ensinar é ser ultrapassado pelos seus alunos. É assim que a sociedade caminha para adiante.


 


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