- 18 de junho de 2025
NINGUÉM ALÉM DE NÓS
JOBIS PODOSAN
Nenhum outro ser vivo é portador de livre arbítrio. É um privilégio imenso, que nos permite proteger a nós mesmos, aos outros seres vivos, explorar, proteger e até destruir a natureza, porque esse livre arbítrio nos trouxe a ideia de poder. É o lado negativo da balança. Quando a emanação do poder nos embriaga, passamos a pensar que o único livre arbítrio que importa é o nosso, eliminamos o livre arbítrio de todas as demais pessoas. Os que querem dominar outra pessoa, um grupo de pessoas, uma nação ou até o mundo, o que fazem é reduzir essas pessoas à condição de animais, que podemos conduzir para onde queremos, restando a eles apenas a obediência. Essa ideia de condutor iluminado exerce enorme fascínio sobre as mentes fracas e as conduz à submissão voluntária, que ocorre quando o indivíduo abdica de si mesmo e se entrega à mente de outra pessoa.
Porém, discurso bonito não substitui a competência. Boas intenções não significam competência. Origem humilde não significa competência. Falta de estudo não significa competência. Competência é saber fazer para poder fazer. Não há ninguém além ou aquém de nós e as distinções sociais são baseadas tão somente nas virtudes e talentos de cada um. Pessoas que se deixam cegar e dominar, cedem o livre arbítrio e abdicam de discernir e criticar. Só se modificam quando a decepção se instala, os olhos abrem e a antiga adoração se converte em ódio profundo, mais por si mesmos, por se terem deixado enganar.
Nascemos famintos, nus, desabrigados, desagasalhados, sujos, desprotegidos, limitados, chorando e em estado bruto. Para superar essas desvantagens que temos em relação aos outros animais, necessitamos da ajuda (melhor dizendo: cooperação) dos outros. Porém, com o tempo e a superação das dificuldades, esquecemos que somos seres resultantes ou consequentes e passamos a crer que somos seres causais. Nos promovemos a seres originários da felicidade dos outros. Ficamos cegos aos resultados da vida. Entre os 30 e os 60 anos atingimos o topo da nossa potência, inclusive a da presunção, mas os que têm o poder como razão da vida, esquecem as condições da chegada e desprezam as já visíveis condições da partida. Não percebem que o arco vai se fechando e aproximando o princípio do fim. Pessoas felizes são as que percebem, desde o início, a necessidade de cooperação dos outros e, no fim, a necessidade do retorno aos outros dessa mesma cooperação. O fim e o começo se entrelaçam e nos revela que o fim pode ser menos doloroso, a depender do que fizemos no miolo: até os 30 somos poucos coisa, depois dos 60 somos cada vez menos, é quando a realidade nos escapa e as más ações praticadas em nome do poder se tornam cadáveres impossíveis de carregar. As decisões fundamentais são tomadas antes dos trinta anos e, daí até os 60, realizamos os sonhos e, após os 60 anos descobrimos a linha do horizonte e passamos à bela fase da contemplação retrospectiva, onde reside a felicidade dos velhos.
Todavia, temos ainda um fardo: só aprendemos pela nossa própria experiência, sendo raros os que aprendem pelo exemplo alheio. Cada geração acha que é o princípio de tudo, relega as lições da vida e se acha capaz de dominar o mundo. Somos os seres mais poderosos que Deus colocou na terra e acreditamos não haver ninguém além de nós, porém nenhum outro é tão tolo como nós, uma vez que basta uma simples facite plantar (inflamação na planta dos pés), para descobrirmos que sozinhos, não somos nada. Se acontecer nos dois pés, descobrimos o sentido verdadeiro da palavra inútil.
Embora todos sejamos dotados de livre arbítrio, pois nascemos iguais, em certo momento, alguém olha o horizonte e se vê maior que os demais e se apodera da mente dos outros, que se deixam submeter, venda os olhos, reduz-se apenas aos instintos e entregam suas vidas e destinos e alguém tão finito quanto todos. Mas...
Onde estão Júlio Cesar, Mahatma Gandhi, Napoleão Bonaparte, Alexandre, o Grande, Franklin Roosevelt, Luther King, Abraham Lincoln, Getúlio Vargas, Nelson Mandela, Adolf Hitler, que foram grandes condutores, uns do bem outros do mal? Todos sucumbiram à Ceifa divina, onde todos somos verdadeiramente iguais, voltamos tão nus quanto chegamos, apesar de alguns partirem envoltos de ouro! Todos são hoje pó, revertidos ao pó, pois pó em potência já éramos antes de nascer e, enquanto vivos, entre o nascimento e a morte, também somos pó, animados pela força da vida ou da força do espirito, segundo crença de cada um, mas o fato inconteste é que em algum momento, essa força vital ou espiritual nos deixa e resta tão somente a embalagem, o pó, cuja ruína começa tão logo a morte se instala.
Essa finitude é bendita, como tudo que a Criação ou Evolução nos deu e dá. Não fosse esse fim, que todos sabemos que virá, e comtemplaríamos o resultado da não extinção da vida, pois restaríamos transformados em figuras apavorantes, a nos conduzir à loucura.
Pois bem, apesar de sabermos disso tudo, porque nos elevamos a superiores ao invés de cooperadores uns dos outros, em benefício de todos? Pior ainda, porque aceitamos que alguém nos conduza ao precipício, como uma manada insana, transformando um igual em desigual, abrindo mão do que mais nos distingue dos outros animais?
Há quem acredite que os cargos fazem os homens. Uma pessoa que nada aprendeu, nada fez por si mesmo, foi sempre um zero à esquerda, de repente, por força da investidura num cargo eletivo, se transforma em senhor da razão e muitos se dobram aos seus pensamentos (repetição de mantras ou palavras de ordem), como desmentindo o Sapiens, que andam erectus.
Porém, os cargos não fazem o homem brilhar. É o homem que faz o cargo reluzir, por suas virtudes e talentos. Por exemplo, a camisa 10, no futebol continua sendo mítica e por todos pretendida, porque houve um jogador que a fez reluzir no Santos e na Seleção Brasileira. A camisa em si nada é com relação às demais, o que a singularizou e a fez resplandecer foi uma pessoa brilhante dentro dela. Nos anos 60, o ataque do Santos era devastador, formado Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe, chamado o melhor ataque da história. Todos sabemos o rosto de quem usava a camisa 10, mas e do rosto dos outros, quem se lembra?
Na CPI da Pandemia, é frequente a seguinte frase: "Me respeite, eu sou um senador da República!". Segundo Augusto Nunes, essa nova versão do velho e lastimável "você sabe com quem está falando?" é dita por integrantes da bancada majoritária da comissão a qualquer depoente que fale algo que os desagrade. Para o colunista, nesses casos, os depoentes deveriam responder à altura, lembrando que são os pagadores de impostos que garantem os salários e benefícios de um senador, que é, essencialmente, um funcionário público, a serviço do público.
A pergunta revela, antes de tudo. que quem a faz pode ser tudo menos um Senador da República, é apenas alguém avisando que precisa gritar alto para que os outros saibam “com quem está falando”! Pedro Simon, Rui Barbosa, Josaphat Marinho ou Franco Montoro, para citar alguns, não precisariam dizer isto, eles eram o Senado. Em resumo: Quem é não precisa dizer, pois o Senador vai além da figura humana na qual temporariamente habita.
A carteirada é apenas o “Triunfo das Nulidades”, é ninguém bradando ser alguém!