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ORÁCULO

Fatos que ensinam.


LIÇÕES DA VIDA I


JOBIS PODOSAN


UMA DE TOMÁS DE AQUINO

"Conta-se na ordem de São Domingos que, certa vez, estando São Tomás de Aquino em sua cela no convento de São Jacques, estudando e trabalhando sobre obscuros manuscritos medievais, entrou de repente um frade folgazão que foi logo exclamando com escândalo:
– Vinde ver, irmão Tomás, vinde ver um boi voando!

O grande doutor da Igreja, muito serenamente, ergueu-se do seu banco, saiu da cela e, dirigindo-se ao átrio do mosteiro, se pôs a olhar o céu, com a mão em pala sobre os olhos fatigados do estudo.
Ao assim o ver, o frade jovial desatou a rir com estrépito.

 Ora, irmão Tomás, então sois tão crédulo a ponto de acreditardes que um boi pudesse voar?

– Por que não, meu irmão? – tornou o santo.

E, com a mesma singeleza, flor da sabedoria, completou:

– Eu preferi admitir que um boi voasse a acreditar que um religioso pudesse mentir."

 

UMA DA MARICA

Num casal de muitos filhos, o pai botou o nome Maria em duas das várias filhas. Para distingui-las, a mais velha passou a ser chamada Marica e a segunda, Maria Pequena. Marica casou e teve muitos filhos, a segunda não casou e nem teve filhos. Os muitos filhos de Antônio de Felix e Angélica formavam uma descendência singular. Uma parte dos filhos era morena e os outros avermelhados, ruivos. O primeiro grupo era calmo, jeitoso e pacato, já o segundo, os vermelhos, tinham o coração perto da goela, pegavam corda rapidamente e explodiam com facilidade. Marica era do lado dos vermelhos. Era alta, tinha os olhos azuis e opiniões definitivas sobre tudo. Quando falava, era ouvida e ai de quem não a ouvisse! Forte no trabalho, definitiva nas opiniões, rígida nos costumes, Marica não tolerava condutas equivocadas e a todos repreendia enérgica e às vezes rispidamente. Não dizia impropérios e não falava palavrões e sua sentença, de caráter lapidar, era uma só, e a proferia com um jeito e profundidade indiscutível. Era uma palavra única, inapelável, que reduzia o sujeito ou a sujeita a pó. Fosse qual fosse a conduta, desde que a considerasse errada, era atingida pela condenação: sem-vergoooonha!

Dita entre dentes, os olhos azuis chispando de indignação, o silêncio sepulcral no entorno, repetia: sem-vergooonha! E o ou a sem-vergonha, baixava os olhos e ia cumprir a sua pena.


DUAS DO HÉLIO

Hélio da Rocha foi meu mestre na faculdade de Direito, era professor de prática jurídica. Aparentava mais idade do que tinha, mas beirava os 70 anos. Fala mansa, modos corteses, sempre atento às nossas abordagens. Recordo-me duas passagens de profundo ensinamento, para aqueles de coração puro. Conto-as:

1. Ele era juiz numa Comarca do interior, na qual ele realizava as audiências aos sábados, dia da feira, quando grande parte do dos moradores do interior do Município se deslocava para a sede levando a produção agrícola para vender. A Comarca ganhou um novo promotor, em início de carreira, que, como todo jovem, era adepto do Dura Lex Sede Lex. Certo sábado um casal se apresentou para fazer uma separação consensual. O promotor leu com atenção o pedido e o acordo das partes. Pediu prazo para melhor examinar a questão. O casal foi dispensado para voltar o sábado seguinte. No entanto, o promotor pediu mais tempo e isto durou quatro sábados. No quinto, o promotor devolveu os autos com um alentado parecer examinando cada parte do acordo, esmiuçado os detalhes do casamento e propondo nova reflexão sobre o assunto. No fim, disse não ter objeção à homologação do pedido. O juiz se deu ao trabalho de ler atentamente todo o parecer e homologou a separação. Ao final do trabalho, o jovem promotor pediu a opinião do juiz sobre o seu parecer.

Muito profundo meu jovem, porém, nas próximas vezes que o senhor examinar um novo pedido no qual não tenha objeção, basta dizer: NADA A OPOR e assinar. Eu considerarei que as razões estarão embutidas no seu excelente parecer, assim o senhor não terá tanto trabalho e nem eu, além de as partes serem atendidas com mais celeridade. Parabéns, pelos seu minucioso parecer!

2. De outra feita, ele estava dando sua aula, quando alguém percebeu que estava calçado com meias diferentes, uma preta e uma azul escuro. A notícia correu a sala e os risinhos e manear de cabeças ficaram intensos, chamando a atenção do mestre. Podem me dizer o que há? A aluna que tinha percebido a "gafe", rindo agora a bandeiras despregadas, disse: professor o senhor está tão velho que não percebe mais a cor das suas meias, uma é preta e a outra azul escuro! E o professor respondeu com sua vez macia e inalterada: minha filha, é que a idade me fez ficar mais gentil. Quem arruma meus pares de meias é a minha esposa, que têm a mesma idade que eu. Percebi que cores eram ligeiramente diferentes, mas optei por ficar em silêncio para não magoá-la, afinal que importância tem calçar meias diferentes para não ofender a pessoa que a gente ama e respeita? Preferi passar eu mesmo pela crítica, no caso de alguém curioso perceber a diferença das meias e se escandalizar com o fato, do que agastar minha querida esposa apontando-lhe a falha involuntária, cometida pelo carinho que me devota. A sala ficou em silencia sepulcral, a aula continuou, mas a lição daquele dia já tinha sido dada.

 

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