- 18 de junho de 2025
CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE
JOBIS PODOSAN
Os partidos políticos são da essência da democracia e eles, que são o mais, é que devem ser fortalecidos e não seus filiados, que são o menos. É por causa de tais interpretações estranhas que temos mais de trinta partidos no Brasil, formando um mercado de candidatos eleitos sem nenhum ideal a cumprir. À ideia de partidos vincula-se a de maioria legislativa e, não havendo maioria, o governante terá que “comprar” apoio para governar, pagando com diversas moedas, sendo as mais comuns cargos e dinheiro. Agora, nas eleições de 2020, uma profusão de partidos elegeram um ou dois vereadores. Os prefeitos terão de ou inocular civismo nesses edis ou lhes comprar o consentimento. O que será que os prefeitos farão?
Com tais palavras encerrei a matéria publicada na semana passada. Nesta semana pretendo demonstrar que os requisitos exigidos para a eleição permanecem presentes ao longo de todo o mandato. Sem mandato, o cidadão pode tudo, mas, uma vez eleito, não pode alterar as condições de elegibilidade, sob pena de caducidade do mandato para o qual foi eleito. Ou é assim ou a Constituição é letra morta, transformando-se tão somente em uma mera lei a serviço de certas pessoas que se elegem, segundo ela, e a violam em seguida. Valendo a advertência de que uma sociedade só se modifica quando cada um dos seus componentes se modificam e de que não adianta fazer tudo igual e pretender obter resultados diferentes. Vejamos quais são as condições de elegibilidade que a constituição estabelece (art. 14, § 3º).
1. A nacionalidade brasileira – a constituição reconhece a possibilidade de se ter mais de uma nacionalidade, porém todas devem ser originárias ou admitidas expressamente na constituição. Se um brasileiro adotar, voluntariamente, nacionalidade derivada, perderá a nacionalidade brasileira. Assim, se o cidadão brasileiro se eleger Presidente da República ou ocupar qualquer outro cargo público, perderá o mandato ou o cargo que ocupar, pois estrangeiros não podem ocupar cargo público no Brasil, ressalvadas certas possibilidade admitidas na própria constituição. Portanto, esse requisito de elegibilidade é permanente, sob pena de caducidade do mandato;
2. O pleno exercício dos direitos políticos – por óbvio, se o cidadão perder os seus direitos políticos ele perde a cidadania política mesma, pois não poderá votar ou ser votado e, corolariamente, não poderá exercer mandatos políticos. Requisito, portanto, permanente;
3. O alistamento eleitoral – o alistado, para exercer direitos políticos, deve permanecer alistado por todo o tempo. Há certas pessoas que se recusam a cumprir obrigações a todos impostas, por motivo religioso, por exemplo, entre elas o alistamento eleitoral. Se não se alista, não pode concorrer em eleições. E se, depois de eleito, adotar religião que não admite o alistamento? Perderá o mandato, que é consequência do alistamento (art. 15. IV), pois sem alistamento perde os direitos políticos. Requisito também permanente;
4. O domicílio eleitoral na circunscrição – para ser prefeito ou vereador tem de ter domicílio eleitoral no Município. Governador ou deputados estadual, federal ou senador, tem de residir no Estado pelo qual concorrerem. Para ser presidente, tem de residir no território nacional. É possível a uma pessoa ter mais de um domicílio eleitoral, mas somente podem concorrer a cargo eletivo se nele tiver domicílio reconhecido pela Justiça Eleitoral, claro que se depois de eleito perder o domicilio eleitoral, o mandato caduca e assim pode ser declarado pela Justiça. O domicílio eleitoral é condição que se prolonga por todo o mandato, sob pena de caducidade do mandato;
5. A filiação partidária – sem partido, sem eleição. Sem filiação partidária, sem mandato, não importa o cargo. A filiação é condição de permanência no cargo eletivo. Condição absoluta. Qualquer conflito entre o filiado e o partido resolve-se em indenização na justiça comum. O mandato não pertence ao eleito e nem ao partido, pertence ao povo que outorgou ao eleito de determinado partido. Se o eleito deixa o partido, resolve-se a questão por substituição ou sucessão. Não é possível sair do partido pelo qual o candidato foi eleito. O partido é o veículo que conduz à eleição, não sendo permitido, no Brasil, o chamado candidato avulso e, por consequência o mandato avulso. O troca-troca partidário no Brasil é uma das causas mais próximas da corrupção que nos avassala. Pense-se nas eleição municipal recente. Nenhum partido conquistou maioria nos grandes municípios e um número expressivo de partidos conquistou uma ou duas cadeiras. A consequência é simples. Os prefeitos ficarão reféns dessa minorias inexplicáveis e terão que cooptá-los se desejar fazer alguma coisa. E se esses nanicos formarem uma bancada aí a desgraça está posta. Assim, também aqui, o requisito é permanente, sem necessidade de lei alguma que regule. Não existe e nem pode existir essa história “sem partido”. Se não tem partido, não em mandato. A constituição diz tudo, seja direta (o texto), seja indiretamente (a interpretação lógica). Qualquer político que esteja no exercício de mandato sem filiação partidária ou que tenha mudado de partido saindo do que o elegeu, pode e deve ser afastado do cargo por caducidade do mandato. Não tem mais mandato! A saída do partido implica perda da condição de exercício do mandato outorgado pelo povo. A liberdade de sair do partido permanece incólume, mas sem mandato. Mal comparando, somos mais fiéis aos nossos clubes de futebol do coração do que aos partidos políticos aos quais nos filiamos e desfiliamos sem a menor cerimônia, sendo impossível ou quase impossível, que um torcedor do flamengo se torne vascaíno no Rio de Janeiro, um gremista se torne colorado no Rio Grande do Sul ou um rubro negro se torne tricolor na Bahia. Consideram os políticos que seus clubes merecem mais respeito que os partidos políticos que governam o país. O governo somente funciona se os poderes Executivo e Legislativo tiverem um ligação ou aliança para facilitar a colaboração entre eles, porque o Legislativo é quem emite os comandos que serão cumpridos pelo Executivo, que sozinho nada pode. Se estiverem em confronto ou em conflito o Executivo fracassa. Por isto, não tem lógica um Chefe do Executivo não estar filiado ao partido que o elegeu e pretenda se aliançar com os outros partidos que tem representação no Poder Legislativo, revelando seu desprezo ou menosprezo por todos os partidos. Se o governo não tiver maioria decorrente da eleição terá que buscar formar um governo de coalizão, que é sempre feita com base em concessões recíprocas ou, pejorativamente, como se diz no Brasil, realizar o famoso toma lá dá cá.
6. A expulsão do partido – embora não prevista na constituição, a expulsão do partido deixa o expulso com o mandato e pune o partido que o expulsou, segundo a jurisprudência do STF! A pena é aplicada ao contrário. Fica difícil entender como pode alguém ser expulso de um partido porque ofendeu a agremiação partidária que o elegeu, ficar com o mandato, levá-lo a outro partido e ser recebido pela nova agremiação, o que não aconteceria se o mandato não fosse seu. Na lógica canhestra do sistema praticado no Brasil de agora, com o mandato, qualquer partido recebe até Belzebu! Qual o sentido de exigir filiação partidária se o eleito pode a todo momento deixar o partido que o elegeu, mesmo provocando a sua expulsão?
Afirmo que a lei ou decisões do STF que estabeleceram exceções às condições de elegibilidade acima citadas são todas equivocadas e são causa da nossa instabilidade política. Todavia, como as coisas estão postas agora, é necessário que se dê prazo mínimo para resolver essas questões de filiação e que, no futuro, se aplique a norma constitucional na sua inteireza. Sei que é truísmo, no Brasil, se dizer isto, mas infelizmente a nossa tampa de civilização ainda é muito baixa.
Finalizando, digo que o Poder Judiciário pode ser provocado para declarar a caducidade do mandato de qualquer político que esteja “sem partido” ou que tenha mudado de legenda depois da eleição, tratando-se mera ação declaratória, sendo os atos praticados por tais pessoas validados como meros atos de funcionários de fato. Este raciocínio se aplica a qualquer das condições de elegibilidade acima citadas. Têm legitimidade para propor tal ação declaratória qualquer partido com representação no Congresso Nacional, o Ministério Público, como custos legis e os suplentes desses políticos, para reclamarem a investidura no mandato.
É difícil melhorar esse nosso Brasil, mas não custa tentar!