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ORÁCULO

O governo já é de militares, o palácio está repleto deles.


A IMPACIÊNCIA PRESIDENCIAL


JOBIS PODOSAN


            O Presidente da República perdeu a paciência depois que um Ministro do STF suspendeu a posse do delegado nomeado para o cargo de Delegado Geral da Polícia Federal, atendendo à impetração de um mandado se segurança coletivo impetrado por um partido político. Disse alto e bom som que não toleraria mais nenhuma interferência do Poder Judiciário em atos da sua competência. Muito poderia ser dito sobre todo o imbróglio envolvendo a nomeação, se ela poderia ser apreciada pelo Judiciário ou não. Formaram-se correntes a respeito, houve confusão sobre os conceitos e competência e finalidade, para muitos houve invasão de competência, para outros houve desvio de finalidade por não atendimento a princípios constitucionais que norteiam toda a administração pública.

Há muito que se escrever sobre esse tema, mas aqui voltaremos nossos olhos para a ameaça do Presidente de adotar providências se sobrevier outra “interferência” em atos da sua competência. Tratando-se de decisão judicial como é de todos sabido, só restam duas alternativas legais: cumprir e/ou recorrer. A terceira, de descumprir ou ignorar a decisão, resulta em crime comum e crime de responsabilidade, podendo ambas levarem à perda do mandato presidencial. O Presidente não quis recorrer, haja vista que tornou sem efeito a nomeação e, com isto, praticou ato incompatível do o desejo de recorrer, até porque o mandado de segurança perdeu o objeto, nada mais havendo que discutir em eventual recurso ao Plenário do STF.

Então o que quis o presidente dizer, sabendo-se que presidentes não dizem (ou não deveriam dizer) palavras vãs?

Não havendo solução dentro do direito, onde o presidente vai buscar a propalada providência para acalmar a impaciência presidencial?

Muitos dos seus ardorosos defensores estão sugerindo a reedição do Ato Institucional número 5, porém não há qualquer fundamento que justifique a quebra da normalidade constitucional. Somente uma revolução justificaria a devolução do poder constituinte originário ao povo ou a algum delegado do povo, por este autorizado.

Quando a “revolução de 1964” assumiu o poder constituinte originário e editou o Ato Institucional número 1, o fez sob os seguintes argumentos:


EMENTA - Dispõe sobre a manutenção da Constituição Federal de 1946 e as Constituições Estaduais e respectivas Emendas, com as modificações introduzidas pelo Poder Constituinte originário da revolução Vitoriosa.


À NAÇÃO

“É indispensável fixar o conceito do movimento civil e militar que acaba de abrir ao Brasil uma nova perspectiva sobre o seu futuro. O que houve e continuará a haver neste momento, não só no espírito e no comportamento das classes armadas, como na opinião pública nacional, é uma autêntica revolução.

A revolução se distingue de outros movimentos armados pelo fato de que nela se traduz, não o interesse e a vontade de um grupo, mas o interesse e a vontade da Nação.

A revolução vitoriosa se investe no exercício do Poder Constituinte. Este se manifesta pela eleição popular ou pela revolução. Esta é a forma mais expressiva e mais radical do Poder Constituinte. Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma. Ela destitui o governo anterior e tem a capacidade de constituir o novo governo. Nela se contém a força normativa, inerente ao Poder Constituinte. Ela edita normas jurídicas sem que nisto seja limitada pela normatividade anterior à sua vitória. Os Chefes da revolução vitoriosa, graças à ação das Forças Armadas e ao apoio inequívoco da Nação, representam o Povo e em seu nome exercem o Poder Constituinte, de que o Povo é o único titular. O Ato Institucional que é hoje editado pelos Comandantes-em-Chefe do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, em nome da revolução que se tornou vitoriosa com o apoio da Nação na sua quase totalidade, se destina a assegurar ao novo governo a ser instituído, os meios indispensáveis à obra de reconstrução econômica, financeira, política e moral do Brasil, de maneira a poder enfrentar, de modo direto e imediato, os graves e urgentes problemas de que depende a restauração da ordem interna e do prestígio internacional da nossa Pátria. A revolução vitoriosa necessita de se institucionalizar e se apressa pela sua institucionalização a limitar os plenos poderes de que efetivamente dispõe.

O presente Ato institucional só poderia ser editado pela revolução vitoriosa, representada pelos Comandos em Chefe das três Armas que respondem, no momento, pela realização dos objetivos revolucionários, cuja frustração estão decididas a impedir. Os processos constitucionais não funcionaram para destituir o governo, que deliberadamente se dispunha a bolchevizar o País. Destituído pela revolução, só a esta cabe ditar as normas e os processos de constituição do novo governo e atribuir-lhe os poderes ou os instrumentos jurídicos que lhe assegurem o exercício do Poder no exclusivo interesse do País. Para demonstrar que não pretendemos radicalizar o processo revolucionário, decidimos manter a Constituição de 1946, limitando-nos a modificá-la, apenas, na parte relativa aos poderes do Presidente da República, a fim de que este possa cumprir a missão de restaurar no Brasil a ordem econômica e financeira e tomar as urgentes medidas destinadas a drenar o bolsão comunista, cuja purulência já se havia infiltrado não só na cúpula do governo como nas suas dependências administrativas. Para reduzir ainda mais os plenos poderes de que se acha investida a revolução vitoriosa, resolvemos, igualmente, manter o Congresso Nacional, com as reservas relativas aos seus poderes, constantes do presente Ato Institucional.

Fica, assim, bem claro que a revolução não procura legitimar-se através do Congresso. Este é que recebe deste Ato Institucional, resultante do exercício do Poder Constituinte, inerente a todas as revoluções, a sua legitimação.

Em nome da revolução vitoriosa, e no intuito de consolidar a sua vitória, de maneira a assegurar a realização dos seus objetivos e garantir ao País um governo capaz de atender aos anseios do povo brasileiro, o Comando Supremo da Revolução, representado pelos Comandantes-em-Chefe do Exército, da Marinha e da Aeronáutica resolve editar o seguinte” ato institucional.


Observe-se que desde a ementa, se diz uma inverdade: o AI 01 na verdade passa a ser o fundamento de validade da Constituição de 1946, invertendo-se toda a teoria constitucional que a Constituição no topo da pirâmide normativa, não havendo atos superiores a ela.

Será que o presidente está se referindo a este tipo de solução ou a uma outra ainda mais exótica?

O governo já é de militares, o palácio está repleto deles,O governo já é de militares, o palácio está repleto deles, seria um autogolpe? Getúlio Vargas fez isto em 10 de novembro de 1937 e mergulhou o país nas trevas do Estado Novo.

Na próxima semana falaremos sobre o conteúdo do AI 01 e os poderes do presidente, que passou a segurar o chicote pelo cabo cabendo a todos nós sermos as costas para o desaguar da sua ira.

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