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ORÁCULO

Todas as normas contidas na constituição são dotadas de juridicidade


CAPITULO XIII – AS CONSTITUIÇÕES HOJE


JOBIS PODOSAN


O MOMENTO ATUAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL

Nos países desenvolvidos as constituições estão envelhecendo, a americana 1789,  a primeira constituição escrita do mundo, já passa dos 233 anos. As europeias (França 1958, Itália 1948, Portugal 1976, Espanha 1978), para citar apenas algumas, caminham para a maturidade. Sedimenta-se a ideia de superioridade da Constituição. Nos países da América do Sul, apenas o Chile parecia estar num momento evolutivo de normalidade, mas, ao que consta, entrou em sintonia deletéria com os demais países da região e passou a sofrer da sofreguidão de inovar as Constituições, que os tornam cada vez mais frágeis. As autoridades eleitas para cumprir as constituições as consideram empecilhos aos seus projetos governamentais. Aqui no Brasil parece que governar é mudar a constituição. Em cada campanha política a palavra mais comum é mudança e suas variantes. Mudar, mudar, mudar, eis a plataforma política de todos os candidatos e, pior, ganha o que promete mudar mais. Ou a ideia de constituição está errada ou nós absorvemos a ideia errada de constituição. O ideal de uma constituição repousa, logicamente, nos pilares da estabilidade, fundamentalidade, superioridade normativa, limite à ação do Estado, garantia dos cidadãos, preservação da liberdade, decência, moralidade, busca da máxima igualdade possível, continuidade institucional, soberania popular, cidadania política, acesso de todos aos direitos sociais mínimos, busca da felicidade, alternância do poder pelos partidos, enfim de tudo que induza à ideia de suporte, de escora, de base, de fundamentos. Se tudo isto é contingente, não temos ideia sobre o valor de uma constituição. Se é possível a cada governante torcer e distorcer a constituição para atender a conveniências suas, a constituição é um nada, é menos que um decreto ou portaria, pois o dano à ordem pública e descrença popular que inocula no povo são irreversíveis. Quanto mais constituição se promulga, menos constituição se tem. Talvez venha daí a impossibilidade de se ensinar à juventude a importância da Constituição: se é tão importante, por que se muda tanto?


DA FORÇA NORMATIVA

Todas as normas contidas na constituição são dotadas de juridicidade. Porém, podem ser antecipadas algumas constatações e conclusões que, ao final o estudioso irá fatalmente chegar:


A SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO

Só se justifica a ideia de constituição, como norma ordenadora de um sistema jurídico, se ela é dotada de supremacia sobre todas as outras espécies legislativas desse mesmo sistema. Podemos afirmar, sem medo de errar, que de 09 de abril de 1964 a 1º de janeiro de 1979, não havia constituição formal no Brasil. Havia simulacros. Os atos institucionais e complementares que vigoraram nesse período tinham forma normativa (força bruta) superior à constituição formal, o que tornava esta uma inutilidade para encabeçar o sistema.


HIERARQUIA FEDERATIVA DAS NORMAS

Adotada a federação como forma de estado o poder político foi dividido em esferas de competência, ora exclusivas, ora comuns, ora concorrentes, tendo o país de conviver com normas jurídicas de fontes diversas. O princípio federativo não se submete somente às competências exclusivas, mas atua fortemente nas competências comum e concorrente, fazendo prevalecer as normas do ente federativo maior sobre o menor, em caso de conflito.




A SOCIEDADE ESTÁ SEMPRE EM MUDANÇA

A sociedade é viva e mutante e isto exige que as leis se adaptem a essas mudanças.  Por isto mesmo a constituição não é uma a carta de minúcias sendo seu papel tratar dos lineamentos fundamentais da sociedade, das estruturas e escoras, a fim de não se ver, constantemente, exposta a esse caminhar incerto da sociedade. A constituição minuciosa corre o risco da descrença e pode provocar a mudança de constituição, quando o ideal é que possa haver mudança na constituição, atualizando o seu texto ao evoluir da sociedade.


A CONSTITUIÇÃO TOTAL E A CONSTITUIÇÃO PARCIAL

Da ideia de constituição material deriva a de constituição formal, sendo aquela a constituição total e esta um fragmento daquela. A constituição total abrange tudo o que acontece na sociedade. A constituição formal é uma parte de um todo constitucional. A constituição formal é parte da constituição material ou total. A constituição formal é um fragmento da constituição material. Tudo o que existe dentro da experiência de uma sociedade, faz parte da constituição material, sendo a constituição formal os limites que submetem ou regulam os fatos sociais, principalmente o poder. A constituição material é viva, dinâmica, em constante movimento. A constituição formal é a contenção dessa força viva. Tudo quanto existe na experiência social ou está de acordo (é segundo a constituição formal) ou afronta (contraria a constituição formal) ou é paraconstitucional (praeter constitucional). É dessa permanente interação entre as constituições formal e material influenciando-se reciprocamente, que a constituição formal retira a sua força normativa, segundo a preciosa lição de KONRAD HESSE, na sua famosa obra denominada A Essência da Constituição.


CONSTITUIÇÃO ABERTA

A constituição formal é um conjunto de princípios e regras extraídas da constituição material e que, por isto, deve estar sempre aberta às influências da constituição material. As normas de uma constituição ou são normas-regra (fechadas) ou são normas-princípio, que são abertas. Essas normas abertas, porque principiológicas, permitem a permanente atualização da constituição sem a alteração do seu texto. A parte da sociedade que não está regulada pelas regras está albergada nos princípios. A constituição é um sistema: jurídico, aberto, normativo e de regras e princípios. Os princípios e regras contidos na constituição possuem diferentes graus de concretude e abstração.


DA UNIDADE DA CONSTITUIÇÃO

O princípio da unidade da constituição forma-se da coerência entre a constituição formal e material. Podemos afirmar que a constituição é lei no sentido formal e no sentido material. No primeiro sentido ela assim o é por ter sido fruto do labor do poder constituinte originário, por alguma das formas de manifestação admitidas. No sentido material é dotada da generalidade e abstração que caracterizam as normas dirigidas à obediência de todos. Mas não se esgotam aí esses dois sentidos. Podemos dizer que a constituição formal é a parte escolhida pelo poder constituinte originário para integrar a constituição, ter forma de constituição. A  parte da matéria social (fonte inesgotável) que não é formalmente constitucional, persiste subjacente à constituição, constituindo fonte permanente de interpretação e evolução.


NORMAS EM SENTIDO FORMAL E MATERIAL

Há na constituição disposições que são constitucionais em sentido formal, outras que o são no sentido formal e material e outras que só o são em sentido material. A disposição do artigo art. 242, § 2º (O Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita federal) é constitucional somente no sentido formal, é constitucional apenas porque foi inserido na constituição; já a norma contida no art. 5º, § 3º (Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais) é constitucional apenas no sentido material, porque o seu conteúdo está fora da constituição; é norma no duplo sentido a disposição contida no art. 1º, caput, (A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos).


TODOS OS ESTADOS SEMPRE TIVERAM CONSTITUIÇÃO MATERIAL

Nunca houve e nunca haverá estado sem constituição. De 1930 até 1934, para exemplificar, não havia constituição formal no Brasil. O golpe de 1930 revogou a constituição de 1891 e somente veio a adotar outra constituição formal em 1934. E o que ocorreu nesses quaro anos? Houve vazio de constituição? De constituição formal sim, mas não de constituição material. A vontade de um único homem era a constituição do Brasil. Antes da constituição formal chamávamos a isto de Absolutismo (que unificava os poderes legislativo, executivo e judiciário numa única pessoa), que, ao que parece, continua a ser o ideal de governantes brasileiros e, até, da parte menos esclarecida da população, que ainda não aprendeu que a liberdade é filha dileta da limitação do poder. A esses recomendamos a leitura de pelo menos dois livros nacionais: Memórias do Cárcere de Graciliano Ramos e a trilogia Subterrâneos da Liberdade, de Jorge Amado. Aquele que torce pelo governo absoluto, deve ter sempre em mente que um dia o arbítrio bate na sua porta e não há a quem recorrer.


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