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JOBIS PODOSAN
Um órgão interno da PM está conferindo a legalidade de uma decisão judicial


ESTÁ ACONTECENDO NA BAHIA


JOBIS PODOSAN


É escandaloso editar um ato normativo que pretende eliminar o direito adquirido, a coisa julgada e o ato jurídico perfeito, retirando a autoridade da Constituição Federal e do Poder Judiciário, por consequência. Um ato projetando efeitos retroativos e rescindindo a coisa julgada. Aconteceu na Bahia, sempre nela. Triste Bahia!


Sobre o limite de remuneração para os servidores do Poder Executivo do Estado da Bahia, foram impetrados mandados de segurança visando a estabelecer como teto o subsídio de desembargador do Tribunal de Justiça local, o pleito foi acolhido, na generalidade dos casos, por todas as instâncias do Poder Judiciário. Confira-se a ementa abaixo, uma de centenas:


MANDADO DE SEGURANÇA - LIMITE DA REMUNERAÇÃO - POLICIALMILITAR – MEDIDA LIMINAR CONCEDIDA. AGRAVO REGIMENTALPREJUDICADO EM FACE DO JULGAMENTO DE MÉRITO DO MANDMUS.MÉRITO – REMUNERAÇÃO DO SERVIDOR DO PODER EXECUTIVO – REVALIDAÇÃO DO ARTIGO 34, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DA BAHIA – OBSERVÂNCIA DO TETO REMUNERATÓRIO DOS DESEMBARGADORES DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA– PRECEDENTES DA EGRÉGIA CORTE DE JUSTIÇA ESTADUAL DA BAHIA - SEGURANÇA CONCEDIDA. O objeto deste writ é a análise sobre a validade e a vigência do artigo 34, § 5º da Constituição do Estado da Bahia, que estabelece como teto remuneratório dos membros integrantes de qualquer dos Poderes do Estado o subsídio mensal, em espécie, dos Desembargadores, inexistindo a arguição de inconstitucionalidade de qualquer norma inserta no ordenamento jurídico pátrio.Com a entrada em vigor da EC nº 47/05, houve expressa revalidação do § 5º,do artigo 34, da Constituição Estadual, na medida em que o referido diploma remeteu os seus efeitos à mesma data em que passou a viger a EC nº 41/03. Entendimento já adotado por esta Egrégia Corte de Justiça Estadual: MANDADO DE SEGURANÇA, processo nº 10273-6/2009, SEÇÃO CÍVEL DEDIREITO PÚBLICO, Relator: JOSE CICERO LANDIN NETO, Data do Julgamento: 22/10/2009.Precedentes. Segurança Concedida.


            Esses mandados de segurança obtiveram liminares, foram julgadas, transitaram em julgado a maioria e alguns processos ainda estão em andamento. Poderiam até não estar transitada em julgado, mas já ajuizada a ação. Poderiam até não estar ajuizadas as ações, bastaria tão somente que a situação jurídica estivesse definida com base na legislação anterior. Aliás, o Estado tem o desplante de implantar o teto de desembargador para os servidores da  Secretaria da Fazenda e tem a temeridade de negar aos outros servidores. Crime, improbidade ou o que mais? O Executivo tem dois tetos: um só para a SEFAZ e outro, para os demais servidores. Na SEFAZ implantou o aumento! Aos demais suspendeu, apesar das ordens judiciais. Quid juris?

            Assim, o teto a ser observado pelo Estado, em relação aos impetrantes, é o de desembargador do TJBA, como vinha sendo e deve continuar a ser. É isto que significa respeito à coisa julgada e a outras decisões do Poder Judiciário dotadas e imperatividade, que não podem ser rediscutidas ou reabertas, por força de legislação posterior, ou seja lá porque motivo for. Esta é a essência da autoridade do Poder Judiciário. Desvestida desse caráter, a decisão judicial se transforma em um nada, no máximo num apelo sem força coativa, ou, pior, numa súplica sujeita a um olhar de desdém daquele que verdadeiramente tem a força, aquele perante o qual a Justiça assiste e se acomoda, genuflexa, aos mandos e desmandos, deixando o cidadão nu e desprotegido, perante o retardatário monarca absoluto, quiçá o último no Brasil!

Pior mesmo é se o Poder Judiciário atirar no próprio peito e exigir que o cidadão impetre um novo mandado de segurança para fazer cumprir a decisão contida em mandado de segurança anterior.

A tanto, porém, com certeza, não vai o Poder Judiciário baiano, espera-se.

Ocorre que a lei federal concedeu aumento, ao final do ano passado aos Ministros do STF, deflagrando o gatilho para as magistraturas todas promovessem o reajuste dos seus integrantes, segundo as regras constitucionais que protegem os juízes do poderio e domínio do Poder executivo.

Todos os Estados concederam o aumento através de lei formal ou através de Resolução de cada Tribunal, como permitiu o CNJ, exceto a Bahia – consta que também Roraima ainda não deu o aumento, estando os juízes recebendo auxílio moradia de modo ilegal - sempre o último nas coisas boas. Porém a Bahia, através de ato unipessoal do Presidente do Tribunal, materializado no Decreto Judiciário nº 497, de 28 de agosto de 2019, disponibilizado no Diário Eletrônico nº 2449, de 29 de agosto de 2019, finalmente concedeu o aumento, embora se possa pensar que tal decreto é de duvidosa validade. Porém, o subsídio dos desembargadores foi elevado ao patamar constitucional, impondo-se que todos os servidores que estão abrigados por decisão judicial, transitada em julgado ou não, tenham o mesmo reajuste para que a ordem judicial se cumpra na sua inteireza. O teto para os servidores do Poder Executivo é o subsídio de desembargador, mormente para os que já recorreram ao poder judiciário e conseguiram decisões favoráveis.

Todavia, foi aprovada emenda à constituição da Bahia pretendendo regular de forma diversa o que já foi decidido pelo Poder Judiciário. Confira-se o tento aprovado:

EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 25 DE 19 DE DEZEMBRO DE 2018

Altera o § 5º do art. 34 da Constituição do Estado da Bahia e dá outras providências.

A MESA DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DA BAHIA, no uso da atribuição prevista no § 3º do art. 74 da Constituição do Estado da Bahia, promulga a seguinte Emenda Constitucional:

Art. 1º - O § 5º do art. 34 da Constituição do Estado da Bahia passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 34 - . . . . . . . . . . .............................................................

.......................................................................................

§ 5º - O subsídio, a remuneração, os proventos de aposentadoria, de reserva e de reforma, as pensões e quaisquer outras espécies remuneratórias dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes do Estado e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos submetem-se ao disposto no inciso XI do caput do art. 37 da Constituição Federal." (NR)

Art. 2º - Os limites remuneratórios aplicados acima do quanto previsto no inciso XI do caput do art. 37 da Constituição Federal devem ser imediatamente a ele ajustados.

§ 1º - Ficam, excepcionalmente, ressalvadas do ajuste de que trata o caput deste artigo as situações asseguradas por decisão judicial com trânsito em julgado até a data de promulgação desta Emenda Constitucional, salvo se aquela venha a ser rescindida, hipótese em que será temporariamente mantido, como limite remuneratório, o valor praticado para este fim na data da rescisão, até que o subsídio mensal do Governador o alcance.

§ 2º - O valor aplicado para fins de limite remuneratório, na data de 30 de novembro de 2018, aos servidores públicos, civis e militares do Poder Executivo, em razão de decisão judicial não transitada em julgado até a data de promulgação desta Emenda Constitucional, fica excepcional e transitoriamente mantido para estes, como teto remuneratório, até que o subsídio mensal de Governador o alcance.

§ 3º - O valor assegurado no § 2º deste artigo poderá ser reajustado por Lei, até que o subsídio mensal do Governador o alcance.

Art. 3º - Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.


Analisado este texto, tem-se a impressão de que se trata de Poder Constituinte Originário ou que foi adotada no Brasil uma nova Constituição Federal, pois só o Poder Constituinte Originário não encontra limites na ordem jurídica anterior. O poder constituinte estadual é poder de 2º grau, estando submetido às normas da Constituição Federal (CF/88, art. 25), que não permitem que atos legislativos desrespeitem as normas federais, a coisa julgada, o direito adquirido e o ato jurídico perfeito (CF, Art. 5º, XXXIV). Na verdade esta infeliz emenda está pretendendo substituir decisões judiciais, modificando-as  ao seu bel prazer. Não podem nada contra as decisões já transitadas, nada podem em relação as que estão sub-judice e nada podem em relação às que embora não ajuizadas, estão sob o manto do ato jurídico perfeito. A emenda há de ser interpretada conforme a Constituição Federal, que não permite efeito retroativo para excluir direitos abrigados em legislação anterior.

Essa emenda pode projetar efeitos para o futuro e para os que entrarem no serviço público depois da sua vigência, jamais podem se projetar para o passado, sendo estranho que tenha passado pelo crivo da Assembleia Legislativa sem as ressalvas devidas e pela análise da PGE, se é que o foi, dada a rudeza do texto. O bom Direito passou longe para os efeitos que pretende o Estado lhe atribuir.

A simples leitura do oficio circular SRH Nº011/2019, da Secretaria de Administração do Estado, demonstra que a autoridade judicial foi para o espaço. O Estado recebeu ordem judicial para mandar respeitar como teto o subsídio de desembargador e agora está notificando os servidores beneficiados pela decisão judicial que apresentem documentos que comprovem o seu direito. O que diabo é isto? Que fim de mundo é este? A PGE tem acesso a todos os documentos dos processos judiciais nos quais os servidores conquistaram esse direito, então para que querem que os servidores apresentem documentos “visando a garantir a segurança jurídica”? Segurança jurídica de quem? Vê-se que pretendem reabrir na Administração o que está resolvido no Poder Judiciário. Querendo discutir o direito dos servidores, que vão ao judiciário e nunca ao servidor abrigado pela autoridade judicial. De onde a Bahia tira esses exemplos miseráveis, será que ninguém mais na Bahia abre um único livro de Direito?

É hora de o Estado-Juiz impor os limites jurídicos ao homem “correria” e lhe impor as regras da reflexão benfazeja, ditada por Montesquieu no seu famoso livro L’Esprit des Lois: é uma experiência eterna que todos aqueles que detém o poder tendem a abusar dele. Por isto é preciso que as coisas sejam dispostas de tal maneira que o poder detenha o próprio poder. O pensamento jurídico baiano está em queda livre, ao menos é o que parece e transparece, daí surgirem esses absurdos! Faltam correias jurídicas para por freios no tal “Correria”. Por espantoso que possa parecer, depreende-se do malfadado documento, que se o servidor não apresentar os documentos exigidos, o teto não será mais o desembargador! E o Poder Judiciário? Às favas!!!! A Emenda à Constituição baiana revogou cláusula pétrea da Constituição Federal, rescindiu a coisa julgada, aboliu o direito adquirido e o ato jurídico perfeito, aniquilou o poder dos juízes. Projetou-se para trás e fez das instituições um nada, um verdadeiro tsunami antijurídico!

De onde mesmo será que o Poder Executivo tirou tais conclusões? Pode o Poder executivo rever decisões judiciais? Pode simplesmente parar de cumpri-las e pedir para a parte que reside no processo apresente documentos para verificação de legalidade da decisão judicial? Se tudo isto for possível, feche-se o Poder Judiciário, porque o Poder Executivo passou a falar por último e submeteu os atos do Poder Judiciário à verificação de legalidade???

O absurdo chegou a tal grau de sofisticação que um cliente mandou o e-mail ao seu advogado informando como está acontecendo a tramitação dos processos nos intestinos do Executivo! A execução da ordem judicial foi suspensa pela Administração e esta mesma Administração está deferindo ou indeferindo os pedidos feitos pelos administrados que têm a seu favor ordens judiciais, a maioria transitadas em julgado. Parece brincadeira, mas não é. Surgiu mais uma instância, extrajudicial, para conferir a validade e a legalidade das decisões do Poder Judiciário. Por que a PGE não postulou a suspensão das decisões no Poder Judiciário dentro de cada processo? Porque sabe não ser viável aplicar uma lei para o passado. Simples assim. Todavia confira-se este e-mail:


Prezado advogado.

Estive no DP (Departamento de pessoal da PM)e dei entrada nos documentos.

Os documentos vêm sendo encaminhados, em lotes e eletronicamente, para a SAEB e após análise da PGE retornam com os respectivos pareceres que, não raro, funcionam como subsídios para novos recursos....

A SAEB já se posicionou favorável ou não com relação ao primeiro lote. O segundo lote será enviado ainda nesta semana...

O ... Subdiretor de Pessoal, vem recepcionando os documentos, coadjuvado pelo Cap Roger que é Bacharel em Direito....

Vou continuar acompanhando a tramitação PM/SAEB ...

Forte abraço!


Quer dizer, um órgão interno da PM está conferindo a legalidade de uma decisão judicial, para referendá-la, ou não, com a assistência da PGE!!

Está acontecendo na Bahia!!!

Quo vadis dominus?

O caso é de processo criminal e de improbidade? Ou ambos?

Alguém tem de pagar por tamanha ousadia!


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