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JOBIS PODOSAN
ELEMENTOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL Capitulo III

ELEMENTOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL

Capitulo III

 

JOBIS PODOSAN


ANTECEDENTES DA CONSTITUIÇÃO

O homem é falível e sabe disso, tanto é assim que estabelece defesas contra a sua própria fraqueza. A crença num Deus que nos perdoe os pecados, a criação instituições como a Polícia, a Justiça, o Ministério Público, todas elas se fundamentam na falibilidade humana, todas elas trabalham com instrumentos de correção de ações humanas equivocadas.

A constituição vem da necessidade imperiosa de limitar a nós contra os outros e os outros contra nós. Há mais de dois mil e trezentos anos, no seu livro denominado A Política, Aristóteles identificou a existência de três funções básicas dentro do estado: fazer as leis, executar as leis e julgar os conflitos decorrentes da aplicação da lei. Para fazer as leis, o poder legislativo; para executar as leis, o poder executivo, para julgar os conflitos, o poder judiciário. O grande filósofo usou essas expressões em seu livro, falando ainda em constituição, distinguido entre determinadas leis, umas mais importantes que outras. Seriam constitucionais aquelas estruturantes da Cidade-Estado. Essas ideias do filósofo estagirita são embriões do direito constitucional moderno.

Dois mil anos depois de Aristóteles, entre os séculos XVII e XVIII, explende na França uma geração de pensadores que criaram um ideário que ficou conhecido como o Iluminismo e veio a lançar novas luzes sobre a teoria da constituição, lançando as bases para o constitucionalismo - movimento que se caracterizou pela difusão da necessidade de se adotar constituições escritas em todos os países do mundo. Essas constituições deveriam conter um núcleo mínimo: a separação de poderes e a existência e garantia dos direitos individuais.

 

A SEPARAÇÃO DE PODERES

O principal teórico da separação de poderes, Charles Louis de Secondat, conhecido como Montesquieu, escreveu, em livro célebre denominado L’Esprit des Lois, ou, em vernáculo, O Espírito das Leis, que “é uma experiência eterna que todo aquele que detém o poder tende a abusar dele. Ele vai até encontrar limites, por isto mesmo, é preciso que as coisas sejam dispostas de tal maneira que o poder detenha o próprio poder”. Montesquieu aplicou à teoria do poder a lei da física, segundo a qual uma força só detém outra quando é pelo menos igual e em sentido contrário. Assim, na visão correta do filósofo, o poder seria uma força bruta, impossível de ser contida pela sociedade que subordina. Necessário, então, repartir as funções do poder – legislativa, executiva e judiciária – para que elas, interagindo, segundo um sistema constitucional de freios e contrapesos e exercida por órgãos e pessoas diferentes, pudessem limitar a ação umas das outras, resultando daí mais liberdade para os cidadãos. A ideia é na verdade simples: estando os poderes separados, nenhum deles é tão forte que possa suprimir as liberdades, uma vez que o poder que faz as leis, não as executa e nem julga os conflitos; o que as executa, não as faz e nem julga; o que julga os conflitos, não faz as leis nem as executa.

Segundo as ideias de Montesquieu, que são conclusões de mais de vinte anos de pesquisa em toda a Europa, um povo é tanto mais livre, quanto mais estejam separadas as funções, de modo que da separação surja o equilíbrio na atuação dos poderes. Para ele, a liberdade consiste em cumprir as leis, pois, se alguém pudesse descumpri-las impunemente já não haveria mais liberdade, uma vez que igual direito se haveria de reconhecer aos demais. Da divisão e dos freios surge o equilíbrio que sustenta a liberdade.

 

A CEGUEIRA

Entre nós, ao longo da história, podemos colher alguns exemplos que confirmam a essa tese. Toda vez que alguém assume o poder através revolução ou golpe, a primeira providência que toma é unificar as funções nas mãos de um só, para melhor exercer o poder absoluto, logo, arbitrário. Assim foi em 1930, quando caiu a República Velha e os poderes foram unificados em mão de um só, seja direta, seja indiretamente, como quando se subtrai do Poder Judiciário a apreciação de certos atos do governo. Assim foi em 1937, por ocasião da instalação do Estado Novo, quando não funcionou o poder Legislativo e o Judiciário foi posto sob garrote, podendo o Presidente até aposentar compulsoriamente os ministros do Supremo Tribunal Federal. Assim foi em 1964, quando o regime militar também unificou as funções de governo em diversos atos institucionais culminando com o de nº. 05. Em todos esses casos, a liberdade desapareceu. A leitura do romance/realidade Memórias do Cárcere, de Graciliano Ramos, bem mostra a dor que reside na supressão dessa maravilha chamada liberdade, cuja presença não sentimos mas cuja ausência nos faz tanto padecer. No caso da unificação do Poder só é livre aquele que está segurando o cabo do chicote, os demais apenas suportam os grilhões e a liberdade se converte em sonho, primeiro de uns poucos e depois de muitos, até o dia em que a explosão do desespero faz sucumbir a tirania. Frequentemente isto acontece aqui e ali, mas não aprendemos nunca: há sempre algum desavisado querendo a tomada do poder para entregá-lo a esta ou aquela classe ou pessoa, esquecido da lição de Montesquieu. Há alguns dias um cidadão escreveu num jornal que agora é o momento adequado para convocar eleições presidenciais para 2020! Quem convocar? Com fundamento em que convocar? Por que convocar? Esse tipo de pensamento só serve para estimular a ruptura da ordem constitucional e conquistar adeptos mais loucos ainda. O modo de aquisição, exercício e transmissão está todo previsto na Constituição e não pode ser alterado ao sabor das vontades, até porque o sistema de governo entre nós é o presidencialismo e não o parlamentarismo. Detalharemos isto adiante, no momento apropriado.

A liberdade é filha dileta da limitação do poder, pois, como dizia John Emerich Edward Dalberg-Acton, ou Lord Acton, "O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente, de modo que os grandes homens são quase sempre homens maus."


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