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ORÁCULO

Lágrimas da imprudência


LÁGRIMAS DA IMPRUDÊNCIA
JOBIS PODOSAN

Dizia Winston Churchil, Premier da Inglaterra,  que  a política é a habilidade de prever o que vai acontecer amanhã, na semana que vem, no mês que vem e no ano que vem. E ter a habilidade de explicar depois por que nada daquilo aconteceu.

Também nos vem da Inglaterra, país que nunca editou uma constituição escrita, mas que tem uma constituição baseada nos costumes, um conceito que nos é estranho aqui na América do Sul. Trata-se do conceito embutido na expressão fair play, que significa tratamento imparcial, equidade,  conformidade com as regras estabelecidas, jogo limpo. Vimos recentemente a aplicação desse conceito quando o primeiro-ministro da Inglaterra que estava no cargo,  David Cameron, renunciou, logo após a decisão de retirada da Inglaterra da União Europeia, decidida pelo voto dos eleitores ingleses, numa eleição muito apertada. O primeiro ministro, derrotado na sua pretensão de que a Inglaterra não saísse  da União Europeia, imediatamente renunciou ao cargo para que outro realizasse o Brexit  ("divórcio” entre o Reino Unido e a União Europeia), já que ele votara contra. Esse Fair play é uma das características marcantes na Inglaterra. Que se manifesta de diversas formas. Cito uma, para exemplificar: por esse princípio, todo novo governo é obrigado a concluir as obras não terminadas pelo governo anterior, mesmo que de oposição. É que ingleses entendem que o governo é do povo e não das pessoas  que momentaneamente  estão no exercício dos cargos públicos.

Aqui no Brasil, apesar do regramento  constitucional que obriga o governo sucessor a continuar as obras inacabadas do governo anterior, através do orçamento de duração continuada, o novo governo, solenemente, ignora as obras inacabadas, que viram sucata. Desperdiçando recursos públicos valiosos. Curiosos é que existem no Brasil instrumentos que podem compelir o governo a dar continuidade às tais obras, mas o problema é de caráter nacional, já que as obras são consideradas como sendo de propriedade dos governos que a realizaram! Essa é mais uma mazela que o tempo corrigirá. Quiçá!

Por que há países que caminham  para o futuro e há outros que não conseguem dar pelo menos alguns passos adiante? Por que na Inglaterra e nos Estados Unidos não há retrocessos institucionais há muitos séculos? O primeiro, é porque, como vimos acima,  jamais precisou de uma constituição escrita e aplicam aos problemas de hoje a solução que aplicaram a esses mesmos problemas ontem.   Os costumes seculares resolvem os problemas atuais. Já nos EEUU, que inventaram a Constituição escrita (1787), como seu povo tem origem no povo inglês, eles editaram uma constituição sintética, de apenas sete artigos e nesses mais de 330 anos de existência, sofreu apenas 27 emendas e consideram seu texto sagrado. Quer dizer: apesar de existir uma Carta escrita, o povo americano sacralizou esse texto e também adotaram costumes constitucionais para resolverem os problemas constitucionais imediatos.
         Aqui na América o problema não foi resolvido em país algum. Pende sobre a América do Sul uma inclinação terrível  de se deixar seduzir sempre pelo atraso, materializado na tendência de, de tempos em tempos, voltarmos os nossos olhos e atitudes na direção, aqui sedutora, de adorar o subdesenvolvimento. Não há como um país se desenvolver, aos trancos e barrancos, solapando a ordem jurídica, cada um achando-se detentor da razão e tentando submeter as regras gerais aos seus próprios devaneios. Cada brasileiro quer inventar sua constituição pessoal e tentar substituir o Tribunal Constitucional na interpretação da Lei Maior, sem nunca ter lido a Constituição sistematicamente, inventando uma Carta Pessoal e substituindo os órgãos de interpretação constitucional. Alegam descumprimento da constituição para poderem descumpri-la também! Um caso atual, que reverbera: O ex-presidente Lula poderia ser candidato à Presidência da República? Seria possível aos seus opositores lhe negar esse direito? Ele estava proibido pelo sistema jurídico de ser candidato?  A resposta a essas questões são óbvias. Pelo princípio da presunção de inocência só pode algum cidadão ser impedido de participar do processo eleitoral se tiver contra si sentença criminal transitada em julgado. Ele tem? Como a resposta é negativa prevalece a presunção de inocência e ele pode  concorrer para a Presidência tanto quanto qualquer outro, eletivo ou não. Ê a condenação transitada em julgado que impede  a cidadania passiva (ser votado). Com Lula não aconteceu isto. Ele foi condenado em três instâncias e, no STF, foi beneficiado por uma decisão processual que anulou os processos. Ele não tem contra ele condenação criminal transitada em julgado, então pode concorrer a cargos públicos e, podendo concorrer, pode ser eleito e tomar posse, segundo as regras constitucionais  e eleitorais. A maioria dos eleitores brasileiros, apesar das condenações, entendeu que Lula poderia ser presidente. Se a maioria dos eleitores disse que pode, então pode. Na verdade, ele não tem qualquer impedimento para concorrer em eleições.  Nas acusações públicas, feitas pelos seus opositores,  pode acontecer isto. Mas na justiça não é assim que funciona.

Por outro lado, quem acusa sem provas pode ser condenado a indenizar os danos causados, como provavelmente vai acontecer. Eu sou anti-Lula, mas devo a ele o mesmo que a maioria do povo lhe deu. Foi eleito, deve tomar posse e governar. Caso contrário, trata-se de Golpe de Estado, pois a minoria quer ganhar a eleição no grito. Ao vencedor, as batatas, aos vencidos a conformação. Até porque ele presidirá  a todos nós, então, dói menos se aceitarmos a vontade da maioria. Chama-se a isto DEMOCRACIA.       

Não há no Brasil recurso a ser  julgado pela parte vencida. Para todo aquele que perde, a eleição foi injusta e ilegal. Porém há recurso aos tribunais. Quem perdeu as eleições deve contestá-las perante quem tem a competência para julgar o recurso. O povo já julgou e deu a vitória a Lula. A minoria, que perdeu, não pode contestar a vitória da maioria, que ganhou. O julgamento popular já foi feito. O presidente derrotado foi questionado sobre o que o país poderia esperar em caso de derrota dele. Em resposta, o presidente voltou a afirmar que entregaria o posto, “sem problema nenhum”, em “eleições limpas”. Na sequência, foi indagado, então, como faria esse diagnóstico, ao que Bolsonaro responde: assim como você não tem hoje em dia como comprovar a lisura um processo eleitoral, o outro lado não tem como comprovar que ele foi sério também. A história é muito longa – afirmou o presidente, levantando, mais uma vez, suspeitas sobre a segurança do processo eleitoral. Quer dizer: atribuiu a si mesmo o julgamento sobre a legalidade da eleição! Quer ser juiz de si mesmo. Se ganhar a eleição é legal; se perder a eleição é ilegal!

Esse discurso, apesar de absurdo juridicamente, está levando incautos a querer mudar o resultado proclamado pela Justiça Eleitoral, sem utilizar a via legal dos recursos. Está sendo travada uma batalha, sob alegado manto de realidade, na qual não se sabe precisamente quem é o inimigo e quais os objetivos perseguidos pelo movimento. O método para perseguir esse objetivo é necessariamente legal. Porém, há questões que o movimento hesita ou reluta em responder: 1) quem venceu as eleições? 2) houve recursos aos tribunais competentes manejados pelo candidato ou seu partido? Houve recursos perante as juntas eleitorais onde supostamente ocorreram as alegadas violações? Houve recursos de quais candidatos que disputaram as eleições?

Finalizando, recomendo aos cidadãos que estão fazendo manifestações contra as eleições pelo país afora, que consultem um advogado sobre os crimes previstos na lei número 24.147/2021, sancionada pelo próprio Bolsonaro, pois parece que muitos poderão bater com os costados na cadeia ao pretenderem mudar o resultado das eleições visando a fazer do derrotado vencedor ou derrubar a constituição ou ambos. Pois estão fundamentando suas ações não no direito, mas na suposta força das FFAA, às quais estão pondo em perigo jurídico.

Pondo em perigo também o desenvolvimento do país ao fazer periclitar a força normativa da constituição pretendendo substitui-la pela força bruta das armas. Uma tolice rematada, pois quem resolve problemas políticos é  política e não as armas. O autoritarismo salvador já é bem conhecido no Brasil. Ele chega e se instala exalando o cheiro bom da salvação, porém esse odor positivo cessa logo em seguida porque os salvadores passam a abusar do poder, por falta de limites para lhes deter o uso da força, e de salvadores passam a ser algozes dos cidadãos que engabelaram e começa o movimento de redemocratização com as dores e perdas que esse processo acarreta. Se há nulidade na eleição que se recorra aos órgãos competentes juntando as provas das irregularidades. Gritar na ONU ou plantar notícias na imprensa estrangeira aliada nada resolve em função da soberania nacional, porém serve para tornar negativa a imagem do país, sem beneficio para ninguém e prejuízo para todos. E de sabença geral que o precipício é  muito sedutor e atrai incautos para as profundezas do abismo sem que ele perceba a tolice que está fazendo. Quando percebe e abre os olhos é tarde demais.

O resto são lágrimas provocadas pela imprudência. O apelo à violência é sempre rápido, mas trata-se de uma vitória aparente,  pois a resposta sempre vem, a passos lentos como é sempre a resposta penal. 

Os velhinhos do Brasil estão loucos para matar brasileiros!!!

 

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