- 12 de novembro de 2024
RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
SILVIO NAVARRO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA
O deputado Jairo Carneiro (PFL-BA) leu ontem no Conselho de Ética da Câmara o seu parecer recomendando a cassação do mandato de Roberto Jefferson (PTB-RJ), autor das denúncias sobre o suposto "mensalão" no Congresso.
A leitura do voto de Carneiro foi tumultuada após o vazamento da informação de que o principal argumento do seu parecer era o de que Jefferson não conseguiu provar a existência do "mensalão".
O relator sofreu enorme pressão da oposição e acabou incluindo um adendo no qual reconhece a existência de "atos de corrupção por formas e contornos os mais distintos".
O parecer de Carneiro, que pode resultar na primeira cassação da atual crise política, deve ser votado na quinta-feira no conselho. Se aprovado, vai para votação secreta no plenário da Câmara, onde será definida a cassação -são necessários pelo menos 257 dos 513 votos. O pedido de cassação foi protocolado pelo PL.
Em seu relatório de 67 páginas, Carneiro listou ao menos cinco ações de Jefferson que caracterizariam a quebra do decoro parlamentar. 1) não ter comprovado o "mensalão" nos moldes descritos; 2) ter feito a denúncia apenas para "tirar de si mesmo o foco das atenções"; 3) ter confessado o recebimento de caixa dois para a campanha de 2004; 4) ter se omitido ao não revelar o suposto "mensalão" assim que soube; e 5) ter admitido tráfico de influências em estatais, especialmente no IRB (Instituto de Resseguros do Brasil).
O parecer cita ainda que o líder do PTB na Câmara, José Múcio (PE), "desmontou um dos vértices de sustentação do depoimento" de Jefferson ao negar "ter recebido qualquer proposta de "mensalão'".
A votação ficou para quinta-feira porque o deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP) pediu "vista" ao voto. O pedido foi uma recomendação do próprio Jefferson, que busca, com isso, ganhar tempo.
Os advogados do petebista, que juntos discursaram por mais de uma hora na sessão, afirmaram que seu cliente não teve direito à ampla defesa e que ele não pode ser punido devido à prerrogativa constitucional de "inviolabilidade de suas opiniões".
"Convicto de que o proceder do representado [Jefferson] revelou-se incompatível com a ética e o decoro parlamentar ao ofender, levianamente, a honra de seus pares e a dignidade da instituição Câmara dos Deputados, abusando da prerrogativa constitucional da inviolabilidade, não tendo comprovado a participação dos deputados que citou no esquema do "mensalão", o voto [é pela] pena de perda do mandato", diz o texto de Carneiro.
O relator afirma também "estar convencido" de que Jefferson "cometeu outras faltas incompatíveis com o decoro" que podem "configurar delitos tipificados na legislação brasileira".
Segundo Carneiro, das testemunhas ouvidas pelo conselho desde a instauração do processo contra Jefferson, em junho, "nenhuma trouxe contribuições seguras que pudessem apontar a participação efetiva dos deputados nominados" por Jefferson no esquema de mesada.
Em entrevista à Folha, no dia 6 de junho, o petebista acusou o PT de pagar mesada mensal de R$ 30 mil a parlamentares do PP e do PL em troca de apoio político no Congresso.
Em seu parecer original, Carneiro diz não excluir a possibilidade de existência do "mensalão" e sugere que as CPIs em curso aprofundem a investigação. "Somente com o avanço das investigações realizadas pelas CPIs é que se poderá conhecer, caracterizar e definir os contornos dos atos delituosos sob a denominação de "mensalões", propinas ou qualquer tipo de vantagem escusa."
A pressão que sofreu decorreu do temor de que o relatório do Conselho de Ética servisse como base de defesa para deputados envolvidos no suposto esquema. Durante o dia, ele recebeu uma bateria de telefonemas de pefelistas e se reuniu duas vezes com Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA). "Considero fora do contestação a ocorrência de corrupção por formas e contornos os mais distintos", acabou acrescentando.