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O Brasil do cinismo - Francisco Espiridião

É impressionante como no Brasil se tem a capacidade de ser cínico e dissimulado quando convém. É deprimente o espetáculo da "blindagem" (palavra da hora) que se faz em torno do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Pela manutenção do "status quo", pessoas tidas como honradas perdem de vez a dignidade.


É impressionante como no Brasil se tem a capacidade de ser cínico e dissimulado quando convém. É deprimente o espetáculo da "blindagem" (palavra da hora) que se faz em torno do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Pela manutenção do "status quo", pessoas tidas como honradas perdem de vez a dignidade.

Diz-se em todos os arraiais - seja da situação, seja da emporcalhada oposição: "Não, o presidente não sabia de nada. Por isso, deve ser poupado". Outros, mais cínicos ainda: "O Brasil não suporta um segundo impeachment (o primeiro foi de Fernando Collor de Melo - 1990-1992)".

Outros, mais face de madeira ainda, dizem: "A política vai mal, mas a economia vai bem". Vai bem para quem? Pelo amor de Deus, para quem? Para os banqueiros, é claro. O setor vai lucrar este ano mais de 12 bilhões de reais líquidos - sem dever nada a ninguém. A estes não interessa nenhuma mudança de ventos.

A economia vai bem para os investidores estrangeiros, que levam tudo o que o país cria e constrói, restando aos moribundos brasileiros filas escandalosas em portas de hospitais; estradas esburacadas, escolas fechando as portas - só em Roraima são mais de 170.

A economia vai bem para o presidente Lula que havia mais de 20 anos - desde que fundou o famigerado Partido dos Trabalhadores, não sabe o que é dar um prego numa barra de sabão.

Quero saber se a economia vai bem é para os degredados brasileiros que morrem de fome, sede e medo ao cruzar a fronteira do México em busca do chamado "sonho americano". Será que economia vai bem para os mais de 5 mil jovens condenados a enfrentar fila por mais de 48 horas na porta de um estabelecimento comercial no Rio de Janeiro, em busca de se inscrever para adquirir um dos 30 empregos oferecidos, que vai lhes render a fortuna de um salário mínimo (300 reais) por mês?

Que o presidente Lula sabia das maracutaias que minaram as bases de um Partido que se dizia messiânico, isso é fato mais que premente. Só não vê quem não quer. O PT não existe sem o Lula. Não se faz nada dentro do PT sem que Lula não saiba.

A prova maior que Lula sabia de todas as patifarias do partido foi dada de forma cabal na noite de quinta-feira, pela deputada Luciana Genro (PSol/RS), em debate no Programa do Gilberto Barros, da TV Bandeirantes.

Ela lembrou o fato do presidente Lula ter mandado, de forma leninista até, expulsar o deputado João Fontes, sem lhe dar qualquer direito de defesa, sem qualquer processo prévio, só porque João Fontes trouxe à tona uma gravação de 1989, onde Lula chamava o ex-presidente José Sarney (PMDB/AP) de ladrão. Aquilo foi ofensa maior a Lula e ele não perdoou. Cortou a cabeça de João Fontes.

Já no caso de Delúbio Soares, Silvinho Pereira e Jose Dirceu, Lula não se manifestou. Foi para a TV chorar, dizendo-se traído, sem dizer quem o traiu. Se ele não estivesse no comando de todas as patifarias do Partido, já teria mandado cortar a cabeça dos "três mosqueteiros", sem dó nem piedade.

Ocorre que desse pessoal ele tem medo. "Com Dirceu não se brinca". E não é para menos. Tudo era feito por sua estrita determinação. Ele sabia de tudo. Foi ele quem mandou fazer. Basta ele dar uma palavra mais rígida contra o "trio do mal" e a cabeça dele (Lula) rola junto.

O lamentável de tudo isso é que o PT conseguiu enrolar o povo brasileiro por 24 anos. Durante todo esse tempo posou de "bom moço", escondendo a verdadeira identidade. O amigo pessoal de Lula, Frei Betto, quando se afastou do amigo, deixando de fazer parte do governo, muito antes de todo esse tsulama ter irrompido, disse que o homem não se transforma. "Se manifesta". Para Betto, Lula e o PT não se transformaram de salvadores da pátria em entregadores-mor da Nação. Eles já eram tudo isso antes. Só "se manifestaram" ao assumir o poder.

O PT e o governo. O Governo e o PT. Um só, portanto. O conjunto do cinismo, no Brasil do cinismo. Mas, não importa o barulho, durmamos assim mesmo.

(*) Jornalista, autor de "Até Quando? Estripulias de um governo equivocado", nas bancas. E-mail: [email protected]

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