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SEM PRAZO DETERMINADO - Márcio Accioly

No festival de cinismo que assola o país, o depoimento prestado pelo deputado federal Zé Dirceu (PT-SP), ex-ministro-chefe da Casa Civil, foi apenas mais um exemplo de descaramento dentre os tantos já acontecidos na Comissão de Ética da Câmara.


No festival de cinismo que assola o país, o depoimento prestado pelo deputado federal Zé Dirceu (PT-SP), ex-ministro-chefe da Casa Civil, foi apenas mais um exemplo de descaramento dentre os tantos já acontecidos na Comissão de Ética da Câmara. A questão mais grave é a da impunidade. Os implicados sabem que basta apenas renunciar, candidatar-se ao mesmo cargo no próximo pleito, comprar votos dos famosos "bocas-de-urna" e reassumir o posto de predador.

Mas o melhor depoimento, acontecido ao longo desta semana, não esteve sob o foco de refletores televisivos na transmissão direta para todo o país. Ele foi prestado pela ex-assessora financeira da campanha petista em 2004, Soraya Garcia, aconteceu em Londrina (PR) e quem o ouviu foi o delegado-chefe da Polícia Federal daquela cidade, Sandro Roberto Vianna dos Santos. Serviu para comprovar o que todo mundo ouve em rumores diários. Por quê?

Porque Soraya declarou que Gilberto Carvalho, atual chefe de gabinete pessoal do presidente Dom Luiz Inácio, era "contato do comitê financeiro da campanha do PT de Londrina para assuntos de dinheiro". Carvalho foi secretário de governo do então prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT), assassinado em janeiro de 2002, numa história super mal contada e que envolve altíssimos figurões do Partido dos Trabalhadores, inclusive Zé Dirceu.

O delegado Sandro dos Santos, por incrível coincidência, foi transferido de Londrina para a cidade de Marília, interior de São Paulo (um dia depois do depoimento), mas o superintendente da PF no Paraná avisou que a transferência já era do conhecimento de todos.

Logo depois que tomou conhecimento do depoimento de Soraya, o chefe do gabinete presidencial afirmou que irá processá-la judicialmente, pois classificou como "absurdas" as suas declarações, já que nunca soube de nada a respeito de dinheiro para financiamento de campanha. E acrescentou estar "assustado" com o assunto, pois já inha visto seu nome envolvido, de maneira "totalmente irresponsável", no episódio da morte do ex-prefeito de Santo André.

Percebe-se que, em qualquer das hipóteses, a situação é mais do que preocupante: Se ninguém sabe de nada, o que faz, por exemplo, o presidente Dom Luiz Inácio no Palácio do Planalto? Não é possível que sua excelência empregue todo o seu tempo no consumo de bebidas alcoólicas, ou de charutos cubanos Cohiba especialmente importados. Mas se alguém sabe de alguma coisa e nada fez, o que se pretende colocar em prática para a remoção de tanta sujeira?

As instituições brasileiras são tão frágeis que não se tem como domar crise desta dimensão. O pior de tudo é que nada se faz: os envolvidos terminam por retornar a seus postos e se envolvem nas mesmas falcatruas, criando bola de neve que mais à frente irá sufocar a nação inteira.

Soraya disse ainda que o atual ministro do Planejamento, Paulo Bernardo (PT-PR), "foi intermediário do dinheiro do Diretório Nacional do PT para a campanha". E ilustrou a declaração ao complementar que "ele chegava num dia e o dinheiro aparecia no outro, às vezes no mesmo dia". Simples assim, como se não fossem milhares e milhares de reais.

Os fatos se processam numa velocidade tão grande, descortinando novos escândalos aos montões, que a CPI dos Correios ainda não se lembrou de convocar o presidente da empresa Novadata, Mauro Dutra, amigo pessoal do presidente da República, detentor de contratos com os Correios que atingem a soma de quase quatro bilhões de reais. É muito, mas muito dinheiro! Alguns dos contratos são mais do que suspeitos e estão a exigir apuração.

No meio da confusão, o presidente nacional do PT, Tarso Genro, pretende negar legenda ao deputado petista que renunciar para evitar a cassação dos direitos políticos, como forma de punição. O deputado João Paulo Cunha, por exemplo, que foi presidente da Câmara (2003-05), é alvo todos os dias de boatos que garantem a iminência de renúncia. Ele está atolado até o pescoço no saque de altos valores das contas do publicitário Marcos Valério.

Como presidente da Câmara, João Paulo Cunha autorizou a Polícia Militar do Distrito Federal invadir dependências daquela Casa para agredir velhinhos e aposentados que protestavam contra a reforma da Previdência. Nem na fase mais dura do regime militar (1964-85) tinha-se assistido a tamanho despautério. Depois que percebeu a gravidade de sua decisão, João Paulo foi chorar diante das câmeras televisivas, tentando desculpar-se pelo fato.

Mas eram lágrimas de crocodilo. De farsante sem o menor pudor. Pois enquanto chorava, mandava a mulher efetuar retiradas milionárias no Banco Rural, ganhando por baixo do pano valores que talvez tenham alguma coisa a ver com o contrato publicitário que realizou entre a Câmara e as empresas de Marcos Valério, totalizando cerca de dez milhões e meio de reais.

O fato é que o PT, completamente desmoralizado, mostra não ter qualquer compromisso com o país. Está tudo paralisado. Todos aguardam o desfecho de imbróglio interminável. Dom Luiz Inácio assegura que jamais irá renunciar, pois não pretende parar de viajar e de utilizar o avião que custou tão caro aos cofres públicos. O clima é de desencanto e de perplexidade com a possibilidade de desdobramentos que não têm como ser previstos.

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