Oposição ironiza declaração do ex-ministro da Casa Civil de que tinha pouca influência nas decisões do governo. Mas parlamentares pedem investigação sobre a relação com grupo de telefonia português. "O governo vive síndrome de desinformação. Lula não sabia de nada e Dirceu também", disse o senador Arthur Virgílio.
Rudolfo Lago e Mariana Ceratti Da equipe do Correio
José Varella/CB/7.10.04
"Precisamos investigar muito bem essa história da Portugal Telecom" Senador Jorge Bornhausen (PFL-SC)
Célio Azevedo/Agência Senado
"Jefferson começou a envolver o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas suas denúncias" Senador Arthur Virgílio (AM), líder do PSDB
José Varella/CB/20.7.05
"Acho que ele (José Dirceu) foi mais convincente, por exemplo, do que o Roberto Jefferson" Deputado Maurício Rands (PT-PE)
"Mas ele mandava no Palácio do Planalto menos que o Very Well", reagiu o líder da minoria no Senado, José Jorge (PFL-PE). Very Well é o apelido de José Henrique Nazaré, um velho e famoso contínuo da Presidência da República, que há mais de 40 anos trabalha no Comitê de Imprensa do Palácio. A estratégia do ex-ministro da Casa Civil deputado José Dirceu (PT-SP) de tentar desfazer a impressão de que era superpoderoso foi um dos pontos que mais chamou a atenção dos parlamentares no Congresso, que parou para assistir ao seu depoimento no Conselho de Ética da Câmara. "Essa linha piora a sua situação. Ninguém vai passar agora a acreditar que Dirceu de nada sabia, que Dirceu nada mandava. É uma mentira de perna curta, que não se sustenta por muito tempo", avalia José Jorge.
Além da postura humilde de Dirceu, chamou a atenção a menção que o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) fez ao papel do ex-ministro na suposta intermediação de um encontro de representantes do PT e do PTB com executivos da Portugal Telecom. Dirceu negou. Jefferson não entrou em maiores detalhes. Mas, para os parlamentares, estava claro que Jefferson, mais uma vez guardava informações que surgiriam mais tarde. "É evidente que ele não soltou isso no ar à-toa. Precisamos investigar muito bem essa história da Portugal Telecom", comentou o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), que assistiu ao depoimento de seu gabinete.
"Esse é o ponto mais sério", concordou o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). "E se agrava se somado a outro ponto: Jefferson começou a envolver o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas suas denúncias", completou. Virgílio assistiu ao depoimento com os senadores Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Sérgio Cabral Filho (PSDB-RJ). Três momentos, nesse sentido, chamaram a atenção de Virgílio. Ele disse que Lula sabia da história sobre a Portugal Telecom, assistira a uma conversa sobre as indicações do PTB para Furnas e completou dizendo que Dirceu "era poderoso, mas não mandava tanto assim".
A denúncia sobre a Portugal Telecom e a estratégia de Jefferson de envolver o presidente também chamaram a atenção do deputado ACM Neto (PFL-BA). "O depoimento de José Dirceu trouxe duas informações importantes: a primeira é a relação que pode ter havido entre dirigentes do PT e do PTB com a Portugal Telecom, a mando do ex-ministro. Segundo, o fato do presidente Lula ter presenciado o momento em que o deputado Roberto Jefferson falou sobre possíveis denúncias de corrupção em Furnas", comentou ACM Neto.
"É uma fala que esclarece muito pouco", considera o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR). "Ele quer dar aos fatos uma dimensão menor do que eles têm. Isoladamente, o fato de Marcos Valério ter se reunido com o ministro de Obras em Portugal sobre a possibilidade da TAP comprar a Varig não quer dizer nada. Assim como, isoladamente, não quer dizer nada o fato de o José Dirceu ter se reunido com a diretoria do BMG. Assim como, por si só, não quer dizer nada o fato de a ex-mulher dele (a psicóloga Angela Saragoça) viver em um apartamento vendido pelo advogado do Marcos Valério - e, na seqüência, ela ter arranjado um empréstimo e um emprego. Mas na hora em que você começa a ver uma sucessão de coincidências como essas, é preciso lembrar que o José Dirceu foi o coordenador da campanha do Lula e foi responsável pelo apoio de vários partidos", emendou o parlamentar.
"História diferente" Para os petistas, no entanto, o depoimento foi um sucesso. "Ele se mostrou firme ao não aceitar as provocações do petebista. Entre Dirceu e Jefferson, prefiro o ex-ministro. O Jefferson foi o chefe do governo mais corrupto do país, já mudou de lado tantas vezes e a cada vez que aparece conta uma história diferente", atacou o deputado Henrique Fontana (PT-RS). "A indicação que José Dirceu deu, de que não vai renunciar, é algo honroso para mim e para todo o partido", completou a deputada Maria do Rosário Nunes, que concorre, em 18 de setembro, à presidência nacional do PT. "Ele pediu para não ser julgado e não vou prejulgar. Acho que não são somente os depoimentos que vão nos permitir aferir a verdade. Também precisamos confrontá-los com os documentos", afirmou "Eu não fiquei satisfeito ou insatisfeito, a fala de Dirceu é parte de um mosaico que ainda vai se completar. Acho que ele foi mais convincente, por exemplo, do que o Roberto Jefferson. Foi firme ao rechaçar a acusação de relações ilícitas com a Portugal Telecom e com dirigentes de Furnas", considerou o deputado Maurício Rands (PT-PE).
O depoimento de Dirceu esvaziou por completo as sessões da Câmara e do Senado. Enquanto ele duelava com Jefferson, o deputado Natan Donadon (PMDB-RO) presidia uma esvaziada sessão, na qual dois petistas desprezavam o depoimento do companheiro Dirceu: da tribuna, Dr. Rosinha (PT-PR) prestava solidariedade a Wasny de Roure (PT-DF) pelo fato de ter sido erradamente citado pelo líder do PFL, Rodrigo Maia (RJ), como beneficiário do mensalão. No cafezinho do Senado, Paulo Paim (PT-RS) sentava-se para assistir ao duelo de Dirceu e Jefferson. Independentemente do desempenho, no entanto, Paim já dizia: "Tá ruça a situação".