- 12 de novembro de 2024
Bernardo de la Peña
BRASÍLIA
Acusado de operar o suposto mensalão para o PT, o publicitário Marcos Valério funcionou, desde que o partido chegou ao poder, em 2003, como uma espécie de intermediário nas relações da direção petista com setores do empresariado. Ao depor na Polícia Federal no dia 8 passado, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares admitiu isso pela primeira vez, contando que foi Valério quem apresentou a ele e ao partido os dirigentes dos bancos BMG e Rural, que fizeram empréstimos de R$ 2,4 milhões e R$ 3 milhões ao PT. As duas operações tiveram o publicitário como avalista.
No depoimento ao delegado federal Luís Flávio Zampronha de Oliveira, tomado na Polícia Federal em São Paulo, Delúbio também contou que Valério foi o intermediário de uma visita feita por ele e pelo ex-presidente do PT José Genoino à siderúrgica Usiminas. O tesoureiro contou ainda que foi Valério quem promoveu uma reunião sua com o empresário Carlos Rotenburgo, do grupo Opportunity. No encontro, Rotenburgo teria solicitado uma aproximação com o PT para melhorar a imagem do grupo Opportunity. Segundo Delúbio, era comum nos encontros entre ele e Valério estarem presentes outras pessoas.
Amizade começou em 2003
O tesoureiro explicou que os dirigentes do BMG apresentados por Valério ofereceram as melhores condições para o empréstimo, que já tinha sido negado pelos bancos Santos, Bradesco, Schahin, ABN-Real, entre outros que o ex-tesoureiro disse não se lembrar mais. O banco exigia, entretanto, um avalista com bens para lastrear a operação. Delúbio tentou isentar o ex-presidente do PT José Genoino de participação no caso. Disse que ele sabia do pedido de empréstimo, mas não participou da escolha do banco ou do avalista. Delúbio declarou à PF ter como patrimônio R$ 163 mil numa conta bancária e um carro Corola, comprado parcelado.
O petista informou ainda que o pagamento da parcela de R$ 350 mil feito por Valério, referente aos juros, não foi contabilizado no Tribunal Superior Eleitoral.
No depoimento, Delúbio contou ter sido apresentado a Valério pelo deputado Virgílio Guimarães (PT-MG) no fim de 2002 no comitê central eleitoral do partido em São Paulo. No começo de 2003, Valério passou a coordenar a campanha do petista João Paulo Cunha (SP) à presidência da Câmara, quando ele e Delúbio ficaram amigos. Segundo o ex-tesoureiro, Valério queria atuar na área de marketing político, mas como o PT já tinha o publicitário Duda Mendonça, acabou fazendo apenas as campanhas petistas em São Bernardo do Campo, Osasco e Petrópolis, em 2004.
A partir de então, os dois passaram, segundo o relato de Delúbio, a se falar duas vezes por semana para tratar de política e a se encontrar em quartos de hotéis em São Paulo, Belo Horizonte e Brasília. No depoimento, Delúbio cita o Intercontinental em São Paulo, o Ourominas em Belo Horizonte e o Blue Tree em Brasília.
No depoimento, o ex-tesoureiro do PT negou conhecer o petista José Adalberto Vieira da Silva - preso com R$ 200 mil numa maleta e US$ 100 mil na cueca, em São Paulo - e disse ser infundada a denúncia feita pelo motorista da deputada Neide Aparecida (PT-GO) de que teria transportado US$ 200 mil de carro do PT paulista para ajudar nas campanhas em Goiás. Segundo Delúbio, em 2004, o PT teve um déficit de R$ 20 milhões - arrecadou R$ 48 milhões e gastou R$ 68 milhões.
Sigilo ainda protegido
O presidente da CPI dos Correios, senador Delcídio Amaral (PT-MS), afirmou ontem que a comissão está aguardando os originais dos documentos em que ex-dirigentes do PT abrem mão de seus sigilos bancários, fiscal e telefônico. A autorização de Genoino, Delúbio, do ex-secretário-geral Sílvio Pereira e do ex-chefe da Casa Civil José Dirceu foram apresentadas na semana passada pelo senador Sibá Machado (PT-AC), que recebera os documentos por fax, em meio a uma acalorada discussão entre governo e oposição.
- Já pedi os originais dos documentos. Se elas não forem apresentadas até a próxima quinta-feira (amanhã), a CPI terá o nosso apoio para quebrar o sigilo dos quatro - anunciou o senador Sibá.
Sibá encaminhou ontem à CPI uma carta da nova direção do PT, assinada pelo presidente, Tarso Genro, o secretário-geral, Ricardo Berzoini, e o secretário de Finanças, José Pimentel, abrindo o sigilo bancário do partido por livre e espontânea vontade.