- 12 de novembro de 2024
FÁBIO ZANINI
FERNANDO RODRIGUES
Folha de S. Paulo
O governo pôs em prática ontem uma estratégia de desqualificar as novas acusações feitas pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), apegando-se ao fato de o próprio ter dito não ter provas do pagamento do "mensalão" a deputados de PP e PL.
Em nova entrevista à Folha, Jefferson afirmou que o dinheiro para o pagamento de R$ 30 mil mensais aos deputados viria de empresas, estatais e privadas.
Segundo Jefferson, os "operadores" do esquema seriam o publicitário Marcos Valério, amigo do tesoureiro do PT, Delúbio Soares, e o líder do PP na Câmara dos Deputados, José Janene (PR), com o conhecimento do ministro José Dirceu (Casa Civil). Todos negam as acusações.
Para o Palácio do Planalto, é necessário colar no petebista a pecha de fonte não-confiável para apontar irregularidades na administração petista. Depois de lerem a segunda entrevista que Jefferson concedeu à Folha, governistas começaram a ligar para jornalistas fazendo essa interpretação.
O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, mais conhecido em Brasília pelo apelido Kakay, foi acionado no sábado para interpretar os novos fatos a partir da entrevista que sairia no dia seguinte na Folha -a edição dominical fica disponível já na tarde do dia anterior.
Kakay leu com cuidado as respostas de Jefferson e tranqüilizou o ministro Dirceu, a quem é ligado: "A entrevista é ótima para nós. Ele diz não ter provas, é uma pessoa acusada de corrupção que tenta atacar os outros. É muito frágil". Em evento no sábado à noite, em São Paulo, Dirceu procurou demonstrar tranqüilidade.
"O Roberto Jefferson está construindo uma nova parte de sua peça de teatro, mas precisa de fatos. Qualquer pessoa que acusa precisa de provas, ou então vira um circo", afirmou o deputado federal Professor Luizinho (PT-SP), um dos maiores defensores do Planalto na Câmara.
Para outro membro da tropa de choque petista na Câmara, Devanir Ribeiro (PT-SP), "a entrevista de Jefferson poderia ter sido escrita por Paulo Coelho [escritor de ficção]". "Não vi novas revelações na entrevista", declarou Ribeiro, amigo próximo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
"Ele [Jefferson] inventa, cria, chega ao ponto de fazer histórias e avaliações, denunciando de maneira irresponsável e mentirosa quem ele quer. Ele quer sair da condição de acusado para ser acusador", disse o presidente do PT, José Genoino, na noite de sábado.
Genoino disse disse ainda que Jefferson é um "poço cheio de ódios" e anunciou que o partido entrará na Justiça contra o parlamentar.
Desqualificar Jefferson, um "desequilibrado" que estaria falando sem provas documentais, é a parte mais importante da operação governista. Controlar a investigação na CPI dos Correios, enquanto a Polícia Federal faz seu trabalho, é a segunda perna da estratégia.
Vários integrantes do governo foram chamados a Brasília neste fim de semana. Amanhã, haverá o primeiro depoimento de Jefferson sobre o caso, ao Conselho de Ética da Câmara. Também haverá uma nova reunião da CPI, para escolher presidente e relator.
Embora a cúpula do Palácio do Planalto tenha optado por desqualificar Jefferson e sustentar que não há provas materiais sobre o "mensalão", a preocupação da administração Lula é saber o que pode aparecer mais adiante.
Um dos chamados a Brasília ontem foi o diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), Mauro Marcelo. A Abin está acompanhando as apurações de irregularidades em vários órgãos que poderiam ter servido de origem do dinheiro do "mensalão".