Há dois meses na mira de denúncias de irregularidades, o ministro da Previdência Social, Romero Jucá, foi ontem ao Tribunal de Contas da União (TCU) para participar de uma agenda positiva com o presidente da entidade, Adylson Motta, o ministro Ubiratan Aguiar e representantes do Ministério Público Federal. Saiu de lá com a cobrança de que se comprometa oficialmente a apresentar medidas práticas para reduzir o ralo previdenciário, que atrapalha o bom atendimento à população e ajuda a provocar um déficit que ultrapassa os R$ 35 bilhões.
Ministros do Tribunal de Contas da União pedem ao ministro da Previdência compromisso na apresentação de medidas práticas para reduzir o ralo por onde escoa dinheiro público
Ana Maria Campos Da equipe do Correio
Carlos Vieira/CB
Jucá com presidente do TCU, Adylson Motta, e o ministro-relator Ubiratan Aguiar: "Tenho compromisso de mudar a realidade da Previdência"
Há dois meses na mira de denúncias de irregularidades, o ministro da Previdência Social, Romero Jucá, foi ontem ao Tribunal de Contas da União (TCU) para participar de uma agenda positiva com o presidente da entidade, Adylson Motta, o ministro Ubiratan Aguiar e representantes do Ministério Público Federal. Saiu de lá com a cobrança de que se comprometa oficialmente a apresentar medidas práticas para reduzir o ralo previdenciário, que atrapalha o bom atendimento à população e ajuda a provocar um déficit que ultrapassa os R$ 35 bilhões.
Os procuradores da República Raquel Branquinho e José Alfredo Silva propuseram ontem a Jucá um Termo de Ajustamento de Conduta, respaldado pelo TCU, em que ele assuma o compromisso de estabelecer metas, a curto e longo prazo, para reduzir o rombo da Previdência. "Seria um acordo histórico e paradigmático", acredita Silva. "Mostraria o compromisso do governo com a Previdência", acrescenta. O descumprimento a um acordo como esse pode resultar em ações de improbidade.
Mas o acerto ainda não saiu. Jucá disse na reunião que recebeu "carta branca" do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Estou na função há apenas 60 dias. Mas tenho o compromisso de tentar mudar a realidade da Previdência que é muito ruim", afirmou. No dia 8 de junho, Jucá e técnicos do Ministério da Previdência vão se reunir com o ministro Ubiratan Aguiar e sua equipe. No dia seguinte, o ministro deverá fazer uma visita à Procuradoria da República no Distrito Federal.
A intenção do presidente do TCU, Adylson Motta, e do ministro Ubiratan Aguiar, relator dos processos relacionados à Previdência, é transformar promessas em realidade. Segundo eles, o Tribunal de Contas tem encontrado diversas irregularidades nos órgãos vinculados à Previdência - Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) e na Dataprev, que processa as aposentadorias.
Apesar das falhas, indícios de irregularidades e fraudes, as determinações do TCU para corrigi-los têm sido desprezadas pelo governo federal. "Lamentavelmente os setores que mais apresentam irregularidades são a Previdência Social e o Dnit (Departamento Nacional de Infra-estrutura em Transporte)", sustenta Motta. "Temos de estabelecer um verdadeiro quartel para vencer a guerra contra a corrupção que tanto nos envergonha", pediu o presidente do TCU.
Fraudes Aguiar disse, na reunião, que está preocupado com as fraudes no sistema de aposentadoria do país. Segundo o ministro, um dos processos, sob sua relatoria, que normalmente deveria ser analisado numa sessão aberta teve de tomar um caráter sigiloso porque continha inúmeros mecanismos de desvios de recursos da Previdência. "São tantas fragilidades no sistema que mostrá-las à população seria o mesmo que dar o mapa da mina para novos fraudadores", sustenta Aguiar.
Entre as determinações do TCU, sistematicamente ignoradas pelo governo federal há mais de uma década, está o estabelecimento de metas para que aos poucos a Dataprev se torne independente da empresa Unisys, que presta serviços à União há 30 anos. A empresa privada detém toda a tecnologia e base de dados do instituto que concede, altera e cancela aposentadorias, pensões, licenças e auxílios. A Dataprev também é responsável pela base de dados da arrecadação, com a cobrança de contribuições de patrões e empregados.
Para o Ministério Público e o TCU, não há controle nos sistemas de arrecadação e de concessão de benefícios e ainda por cima a Previdência está nas mãos da Unisys. Embora os problemas não tenham começado no governo Luiz Inácio Lula da Silva, pouco tem sido feito para revertê-los na gestão atual, segundo o TCU. Dois episódios, ocorridos entre 2003 e 2004, constam da lista de preocupações dos técnicos e ministros do TCU e do Ministério Público.
Em junho de 2003, a Dataprev fez um contrato emergencial com a empresa Cobra Tecnologia S.A., que oferece soluções de tecnologia de informação. Posteriormente, a Cobra venceu uma licitação - que disputou como única interessada - para um contrato no valor de R$ 126 milhões. Segundo o TCU, no entanto, a Cobra não tinha capacidade para realizar o trabalho e teve de subcontratar a Unisys. O TCU e o Ministério Público Federal também apontaram direcionamento e superfaturamento em dois pregões para aluguel de computadores da Dataprev, ocorridos no ano passado.
As irregularidades
Relacionamento Dataprev e Unisys - A estatal, ligada ao Ministério da Previdenciária que processa as aposentadorias em todo o país, tem uma "dependência crônica" em relação à tecnologia da empresa Unisys. O TCU aponta contratos celebrados com a empresa superfaturados, sem justificativa de preços e pagamentos indevidos. O TCU pede há mais de uma década que a Dataprev assuma um projeto de migração dos dados previdenciários, de arrecadação e benefícios, para uma plataforma aberta, cujo domínio seja da administração pública.
Relacionamento Dataprev e Cobra - Depois de encerrada a vigência do contrato entre a Dataprev e a Unisys, o instituto contratou sem licitação a Cobra para prestar os serviços de armazenamento do banco de dados da Previdência. Depois a estatal, por determinação do TCU, abriu uma licitação. Mas apenas a Cobra apresentou-se como interessada foi a própria Cobra. O Tribunal constatou que a empresa não tinha qualificação necessária para prestar o serviço, já que a Cobra subcontratou a Unisys. O contrato assinado com a Cobra é de R$ 138 milhões para vigorar entre setembro de 2004 a setembro de 2007.
Suscetibilidade a fraudes na área de arrecadação - Segundo o TCU há falta de confiança nos sistemas de informação. Há facilidade para inclusão de dados falsos (dados retroativos e futuros, valores indevidos). Cerca de 42% das certidões negativas de débitos são emitidas por interferência direta de funcionários do INSS mesmo quando o sistema ainda registre pendências.
Falta de confiabilidade nos dados referentes aos benefícios - Muitas informações referentes aos beneficiários são inconsistentes, sem checagem com outros sistemas. As auditorias constataram diversas irregularidades como data de nascimento do beneficiário da pensão posterior à data de óbito do instituidor, titulares de benefícios que já morreram, continuidade de pagamento de pensão a maiores de 21 anos.
Direcionamento de licitações para locação de computadores - A Dataprev lançou, em 2004, dois pregões para a locação de computadores. Um dos pregões foi suspenso por determinação do ministro Ubiratan Aguiar, do TCU. O outro por meio de liminar da Justiça Federal concedida em ação proposta pelo Ministério Público Federal. O problema foram os indícios de irregularidades: suspeita de direcionamento pela alta especificação dos equipamentos e falta de um estudo que comprovasse que a locação era uma medida econômica. Segundo o TCU e o Ministério Público, há estimativas de que o aluguel pago em um ano seria suficiente para a aquisição de todos os equipamentos.