A nova versão da proposta de reforma universitária, divulgada ontem pelo Ministério da Educação (MEC), abre a possibilidade para que os estados e municípios troquem suas dívidas com o governo federal por investimentos nas instituições de ensino superior.
Anunciado ontem, novo projeto prevê a troca de dívidas dos estados com a União por investimentos no ensino superior. Apesar da disposição do MEC, proposta ainda não tem o aval da equipe econômica Erika Klingl e Paloma Oliveto Da Equipe do Correio
Fotos: Kleber Lima/CB
Estudante de jornalismo em faculdade particular, Ionara Talita Silva aprova aumento de vagas e cursos noturnos em instituições públicas
José Varella/CB/4.5.05
A proposta apresentada não é definitiva. Começamos agora uma nova fase de debates antes de enviar o projeto ao Congresso em julho Tarso Genro, ministro da Educação
A nova versão da proposta de reforma universitária, divulgada ontem pelo Ministério da Educação (MEC), abre a possibilidade para que os estados e municípios troquem suas dívidas com o governo federal por investimentos nas instituições de ensino superior.
Apesar da idéia ser defendida pelo ministro da Educação, Tarso Genro, durante o anúncio dos 77 artigos da lei que regulamentará o ensino superior, ela ainda não recebeu o aval do Ministério da Fazenda. "A possibilidade está clara no artigo 29, que abre a possibilidade de que a expansão pública possa ser financiada pela dívida", afirmou Tarso. Esse dispositivo do projeto de lei prevê que a União financie instituições de ensino superior estaduais e municipais mediante convênios ou consórcios.
A proposta foi recebida com cautela entre reitores das universidades estaduais. "É claro que ter recursos para ampliar o número de vagas e a qualidade é bem vindo, mas é necessário detalhar com mais clareza a forma como esse financiamento vai chegar aos cofres das instituições", argumenta Nelson Boeira, reitor da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (Uergs). "Podemos simplesmente ser usados pelos governos para um acerto de contas."
O aumento do financiamento é fundamental para cumprir algumas metas que estão na proposta. De acordo com o texto, em 2011, 40% do total de vagas no ensino superior brasileiro devem estar em instituições públicas. Essa meta estava prevista no Plano Nacional de Educação (PNE) e foi vetada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Para as federais, o aumento de recursos está em outro dispositivo da lei. O artigo 52 determina que 75% da verba do governo federal para manutenção e desenvolvimento do ensino serão gastos em instituições federais, sendo que as despesas que não se caracterizam como gasto em educação não devem fazer parte dessa porcentagem. "Isso pode deixar de fora da conta das federais os gastos com hospitais universitários e representar um ganho efetivo nos recursos para ampliação das vagas", comemorou a Ana Lúcia Gazzola, reitora da Universidade Federal de Minas Gerias (UFMG).
Aulas noturnas Boa parte desses recursos será usada no cumprimento de uma da principais novidades da nova versão da reforma universitária. Um terço das vagas e dos cursos de todas as federais do país deverão ser noturnos. Atualmente, isso acontece com apenas 24% dessas vagas. Na Universidade de Brasília (UnB), dos 60 cursos oferecidos, 15 são à noite. Atualmente, 20% dos 21.502 alunos que estudam na instituição fazem curso noturno.
Para conseguir realizar o sonho de ser jornalista, Ionara Talita Silva, 19 anos, precisa trabalhar das 8h às 18h. Do salário de R$ 980, sobram apenas R$ 149; o resto vai para a mensalidade da faculdade particular. Moradora de Planaltina, a estudante está acostumada com a labuta: desde os 14, faz bicos para ajudar a família.
Ela diz que não se importa em trabalhar, mas, se a UnB oferecesse o curso de Jornalismo à noite, poderia aproveitar o dinheiro ganho como coordenadora de projetos da Fundação Athos Bulcão para auxiliar os gastos em casa. É inadmissível que, em um país rico como o Brasil, jovens tenham de trabalhar o dia todo para pagar universidade, sendo que há a possibilidade de ensino gratuito, critica.
Para cumprir a meta de cursos noturnos no prazo de cinco anos, conforme determina o projeto do MEC, os reitores das federais vão ter que enfrentar um grande desafio. Cada instituição tem um problema para superar. Na UFMG, o problema é a conta de luz. "No horário de pico à noite, pagamos quase 10% a mais", conta Ana Lúcia, que conseguiu praticamente dobrar as vagas noturnas, apesar de estar abaixo da meta.
Mudança nas cotas Em Brasília, a UnB é isenta de pagar a luz, mas enfrenta problema ainda mais grave: a falta de professores. Desde 1994, o número de docentes se manteve em cerca de 1,3 mil. "Acho corretíssimo o plano do governo. A UnB foi uma das primeiras a abrir cursos à noite, mas precisamos de apoio do MEC ou não vai adiantar nada estar na lei", ressalva decano de Ensino de Graduação da UnB, Ivan Camargo.
O avanço na democratização do acesso ao ensino superior, na nova versão do projeto, não refletiu em todo o texto. O texto traz mudanças em relação às cotas para negros e índios, dando prazo de dez anos para que as instituições federais de ensino superior atinjam a proporção de pelo menos 50% de alunos egressos da rede pública do ensino médio.
Antes, a reserva de vagas era imediata, a partir do primeiro vestibular após a aprovação da reforma em que metade das vagas oferecidas deveriam ser preenchidas com alunos da rede pública, dentre os quais um percentual mínimo de negros e índios, de acordo com a proporção que cada grupo racial representa no respectivo estado. O número 2011 é o prazo para que 40% do total de vagas no ensino superior brasileiro estejam em instituições públicas