- 12 de novembro de 2024
Ministérios e outros órgãos e instituições públicas federais fazem a festa de grandes empresas que alugam equipamentos e prestam serviços de fotocópia. Variação de valores pagos supera a 900%
Ana d´Angelo e Paulo Mario Martins
Da Equipe do Correio
As torneiras dos cofres públicos estão abertas e o dinheiro do contribuinte escorre pelo ralo do superfaturamento de contratos de fotocópias. Durante cinco semanas, a reportagem vasculhou cerca de cem contratos e fez um levantamento dos valores pagos por ministérios e outros órgãos federais dos três poderes pelos serviços de reprodução de documentos. Entre os 29 órgãos pesquisados, sete pagam entre R$ 0,05 e 0,07 por cópia em preto- e-branco. Já os outros 23 desembolsam desde R$ 0,10 até R$ 0,51. Os centavos correspondem a diferenças variáveis de 30% a 600%, em relação aos que pagam menos, que representam quase R$ 20 milhões ao ano para o caixa de menos de meia dúzia de empresas. Mas a diferença entre o menor e o maior valor chega a 920%.
Esse prejuízo geral estimado em R$ 20 milhões leva em conta apenas o valor pago a mais por cópia nos contratos analisados. O montante que vai para o ralo é muito maior se forem avaliados o superfaturamento em toda a administração pública e o desperdício em virtude de cópias tiradas desnecessariamente e o aluguel de máquinas subutilizadas nas repartições.
Um contrato que custa aos cofres públicos, por exemplo, R$ 2 milhões por ano, poderia sair por menos de um terço, ou R$ 600 mil, dependendo do órgão que contrata. A situação se repete nas fotocópias coloridas, cuja produção é menor. Entre o preço mais baixo e o mais alto, há um abismo de 738%. A esmagadora maioria dos contratos tem condições semelhantes: prestação de serviço de locação de máquinas novas, incluindo assistência técnica e o fornecimento de material para o funcionamento (o principal é o tonner), exceto o papel e a mão-de-obra, que é do próprio órgão. O serviço contratado pelos ministérios e analisado pela reportagem refere-se ao atendimento da estrutura desses órgãos em Brasília.
O dobro na Fazenda
Dono da chave dos cofres do Tesouro Nacional e rigoroso em cortar recursos de programas sociais e de investimentos, o Ministério da Fazenda, comandado por Antonio Palocci, ostenta medalha de prata numa competição em que o contribuinte brasileiro é o grande perdedor (veja quadro nesta página).
O Ministério da Fazenda chega a pagar por uma cópia em preto-e- branco entre R$ 0,15 e R$ 0,31 tiradas de 114 copiadoras, em contrato assinado com a empresa brasiliense Consel Comércio e Serviços Técnicos, que só em 2004 embolsou R$ 4 milhões no total. A cópia colorida chega a custar R$ 1,58, consumindo mais de R$ 1 milhão por produção de apenas duas copiadoras.
O menor preço pago é simplesmente superior ao dobro do que desembolsam os vizinhos da Fazenda na Esplanada para equipamentos com desempenho parecidos - os ministérios do Meio Ambiente, das Minas e Energia, Transportes e Cidades, além do Supremo Tribunal Federal e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), do Ministério da Educação. O Ministério da Fazenda só não paga mais do que o Senado, que lidera o ranking de preços altos. Lá, a reprodução colorida sai por até R$ 3,10. O preço da cópia em preto-e-branco também é assustador: entre R$ 0,23 e R$ 0,51. Nas dependências do Congresso, basta que o contribuinte atravesse um corredor para conferir que o mesmo serviço pode custar bem menos ao seu bolso: a Câmara paga entre R$ 0,06 (a maior parte) e R$ 0,13 por cópia.
O contrato está sendo reavaliado e, se for o caso, será feita nova licitação |
Preços exorbitantes fazem do Senado o maior gastador O contrato do Senado para serviços de reprodução de documentos, de R$ 3 milhões por ano, se destaca entre os analisados pela reportagem. O órgão chega a desembolsar R$ 0,51 por uma cópia em preto e branco - praticamente o valor que a Câmara paga por uma colorida (R$ 0,48), tradicionalmente bem mais cara. O contrato já nasceu com preços altos, em 2002: os da cópia em preto e branco variavam entre 0,27 e R$ 0,40. A cópia colorida já foi mais cara, R$ 3,40. Apesar da queda do dólar e da redução de preços dos insumos importados, o Senado concedeu desde então dois reajustes, totalizando 28%. O último, de 4,6%, foi em outubro de 2004. A locação das duas copiadoras coloridas até sofreu redução e o preço da cópia foi para R$ 3,10. A cópia excedente preto e branco - aquela que ultrapassa o limite previsto na locação mensal - pode variar de R$ 0,09 a 0,31, ou seja, preço bem mais alto que até mesmo o pago por muitos ministérios dentro da franquia. O Senado alega que a franquia baixa é o motivo do preço alto. Difícil é explicar por que paga R$ 3.104 mensalmente por copiadora colorida simples (velocidade de seis cópias por minuto), com direito a apenas mil reproduções, pagando pelas excedentes, se o Ministério das Minas e Energia gasta menos por mês, R$ 2.124, tendo direito a três vezes mais de cópias. Ou até mesmo o Ministério dos Transportes que desembolsa R$ 2.991,67 por mês para 8 mil unidades por mês. O Senado admite que paga caro pelo serviço. Diz que o órgão "tem consciência de que está pagando um preço maior para ter esses equipamentos". Um deles fica na residência oficial do presidente do Senado. A empresa contratada - a CTIS Informática - foi procurada na última sexta-feira, mas o representante da empresa que poderia atender a reportagem não foi localizado. O Ministério da Agricultura ocupa o terceiro lugar do pódium. Desembolsa R$ 0,28 por cópia em preto e branco paga à empresa Xerox Comércio e Serviços Ltda., com franquia de 4.500 cópias/mês. Nos ministérios da Justiça e do Desenvolvimento Social cada cópia, do mesmo tipo de máquina, custa R$ 0,10 e a franquia, do mesmo fornecedor, vai de 5 mil e 6 mil, respectivamente. A Agricultura, que paga R$ 0,28 à Xerox, desembolsa apenas um quarto daquele valor - R$ 0,07 por cópia tirada - pelo trabalho das máquinas alugadas da empresa Type Máquinas e Serviços. Segundo o ministério, o contrato com a Xerox "está sendo reavaliado e, se for o caso, será feita nova licitação". A estatal Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, também tem um contrato lucrativo - para a empresa Consel - assinado recentemente, em novembro do ano passado. A Finep aceitou pagar R$ 0,25 por cópia em preto e branco. A estatal ainda paga R$ 1,35 por cópia colorida. Um mês depois da assinatura do contrato da Finep com a Consel, o Ministério do Meio Ambiente contratou com a empresa Type o serviço de 26 impressoras e copiadoras em preto e branco, dotadas de velocidade e recursos, na média, maiores que as da Finep e com consumo mensal estimado no total pouco maior (de 299 mil reproduções) para todo o conjunto, pagando apenas R$ 0,07 por fotocópia. Detalhe: o contrato inclui todo o material, inclusive papel, e cinco operadores. O preço é quase um quarto do valor pago pela Finep. A estatal alegou que foi o preço mais baixo na concorrência e que a empresa anterior, a Xerox ,cobrava mais caro - R$ 0,27. |