- 19 de novembro de 2024
ELVIRA LOBATO DA SUCURSAL DO RIO JOSIAS DE SOUZA COLUNISTA DA FOLHA A TV Caburaí de Roraima, controlada pelo ministro Romero Jucá (Previdência), está funcionando irregularmente. A emissora foi alugada para uma firma dos filhos de Jucá. Negociado à revelia do Ministério das Comunicações, o contrato de locação afronta a lei. Analisando caso idêntico de 2002, o governo cassou a outorga de emissora no interior de São Paulo. Jucá criou novo embaraço para o governo Luiz Inácio Lula da Silva. Documentos internos do Ministério das Comunicações, obtidos pela Folha em Brasília, classificam o arrendamento de emissoras de TV como "irregularidade de natureza gravíssima". O constrangimento alcança agora também o PMDB, partido de Jucá. O Ministério das Comunicações é gerido por Eunício Oliveira, outro peemedebista. Pela lei, Eunício teria de abrir um procedimento administrativo que pode levar à cassação da licença da TV dos Jucá. Chama-se "processo de apuração de infração". A Folha solicitou, há oito dias, manifestação das Comunicações. A assessoria de Eunício disse que ele não falaria. Aventou a possibilidade de pronunciamento da área técnica do ministério, mas nada foi dito até ontem à noite. A licença para retransmissão da TV administrada pelos filhos de Jucá pertence oficialmente à Fundação de Promoção Social e Cultural do Estado de Roraima. Foi outorgada em 1989, quando José Sarney (PMDB-AP) era presidente da República. Em outubro de 1999, a gestão da emissora foi assumida pela empresa Uyrapuru Comunicações, que pertence a quatro filhos de Jucá: Rodrigo, Marina, Ana Paula e Luciana. A transação foi formalizada em ""Contrato Particular de Locação de Canal de Televisão" entre a Uyrapuru e a fundação. O contrato fala explicitamente no aluguel e operação do canal de TV. Esse tipo de terceirização já foi declarado ilegal pelas Comunicações. A punição aplicada em caso semelhante foi a cassação da licença. Deu-se em 2002, sob Fernando Henrique Cardoso. O Ministério das Comunicações cancelou a licença de retransmissão da Televisão ABC (canal 40), do grupo Diário do Grande ABC, de Santo André (SP). Descobriu-se à época que a empresa tinha transferido a exploração do canal à Rede Vida, da Igreja Católica. A decisão foi contestada pela Justiça porque o ministério não deu direito de defesa aos acusados. O grupo Diário do Grande ABC ganhara a emissora em 1986, no governo Sarney. Retransmitiu a programação da TV Educativa do Rio até 1995. Acionista, a família Dotto fechou, então, um contrato com a TV Independente de São José do Rio Preto, da Igreja Católica, para retransmitir a Rede Vida. Pelo contrato, a Rede Vida pagaria US$ 25 mil por mês à TV Diário do Grande ABC. O documento deveria ter ficado sob sigilo. Uma cópia, porém, chegou ao governo, em março de 2002. Para a cassação da licença da TV ABC, consumiram-se apenas quatro dias entre a investigação (8/3/2002) e a anulação da outorga (12/3/2002). Os fundamentos da cassação constam do parecer MC 011/2002, da Secretaria de Serviços de Radiodifusão. À época, o ministro das Comunicações era o tucano Pimenta da Veiga. O documento anota: ""A permissão para o serviço de RTV (retransmissão de televisão) é concedida a empresa para executar o serviço de forma exclusiva, não podendo repassar a terceiros os direitos concedidos pela administração pública". Com a anulação da licença, o canal foi declarado vago e, dois meses depois, foi concedido ao publicitário Nizan Guanaes, que havia adquirido a TV Sul Bahia (em Teixeira de Freitas), um ano antes. A família Dotto e a TV Sul Bahia disputaram a posse do canal na Justiça, numa sucessão de liminares. O Ministério das Comunicações baixou e revogou portarias favoráveis ora a um grupo ora a outro, seguindo as liminares. A última liminar, de junho último, foi emitida pelo STJ. Favorece o grupo da TV ABC que, depois, fez parceria e retransmite a Sul Bahia. Cada uma reivindica canal de retransmissão em Brasília. Para ex-dirigentes das Comunicações ouvidos pela Folha, a terceirização ou arrendamento de emissoras é ilegal. A decisão de 2002 só foi questionada pela Justiça por ter havido cerceamento do direito de defesa.