- 19 de novembro de 2024
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados: Ante-ontem, sábado, dia 16 de abril, Roraima amanheceu de LUTO. As trevas cobriram meu Estado. O manto negro da desesperança cobriu de luto o meu coração e os corações de todos meus irmãos roraimenses: homens e mulheres, crianças e adultos, índios e não índios. A causa de tanta dor e desesperança, Senhor Presidente, foi a Portaria número 534, do Ministro da Justiça e publicada no Diário Oficial de sexta-feira passada e que culminou com a homologação da Área Raposa Serra do Sol como Terra Indígena contínua. A tristeza maior, foi a confirmação de que tudo aconteceu de forma orquestrada, combinada em detalhes mínimos que, não fosse trágico, sem dúvida seria cômico. Foi tudo muito rápido. A portaria, conforme podemos verificar, é datada de 13 de abril, mas somente publicada no dia 15. Dia 14, o Supremo Tribunal Federal decidiu extinguir todos os processos que questionavam a demarcação da Área. No mesmo dia 14 a imprensa já publicava que a decisão do Presidente Lula era pela homologação da área em terra contínua, o que efetivamente se deu. Ontem, dia 17, domingo, numa ação espetacular, o Ministério da Justiça enviou para Roraima mais 100 policiais federais para se juntarem a outros 40 do Estado. Até isso, Senhor Presidente, foi astuta e ardilosamente estudado. Não bastaram as ações conjuntas para desnortear quem aguardava por uma solução pacífica e democrática. Além dessas, também foi planejada essa verdadeira operação de guerra composta por força federal para, conforme palavras do próprio coordenador da operação em Roraima, "neutralizar quaisquer ações que venham a ferir o Estado Democrático de Direito"... Houve inversão de valores, Senhor Presidente. Acho, sim, que a PF deveria ir para Roraima exatamente para proteger aqueles que foram feridos em seus direitos mais elementares. Ora, Senhor Presidente.... Porque tanta pressa? Porque esse verdadeiro "toque de caixa" na decisão de um assunto extremamente delicado, espinhoso, considerado por muitos intelectuais, juristas e até mesmo no meio militar como "uma verdadeira bomba" merecedora de profundos estudos? Cadê os exaustivos estudos prometidos pelo Ministro da Justiça para apresentar à sociedade antes da tomada de decisão? Onde estão os trabalhos que seriam elaborados pelo Grupo Interministerial, criado no próprio Governo, para apresentar diagnóstico técnico e viabilidade de uma pacífica solução do problema? Alguém viu? Que critérios foram realmente usados para banir, via Portaria, milhares de famílias legalmente instaladas em suas próprias terras, muitas com legítimas e perfeitas escrituras públicas e que lá convivem com os índios há centenas de anos? Nós roraimenses, índios e não índios, fomos surpreendidos, injustiçados e mutilados em nossa própria casa. Sem aviso prévio, num fim de expediente de uma sexta-feira, fomos comunicados de que a partir daquele dia também estávamos impedidos de trabalhar, de gerar emprego, renda e até mesmo o pão nosso de cada dia... Sinceramente, não sei que palavras usar para definir estes gestos, essas ações de surpresa a nós impostas de repente. No centro oeste e no nordeste, seriam definidas como "TOCAIA". No sul, como "COVARDIA". Lá no norte, meu povo se refere a elas como gestos e ações típicas de um "TRATANTE", não cumpridor da palavra dada. Quanta iniqüidade, Senhor Presidente. Afinal, é muito fácil, daqui de Brasília, de gabinetes arejados, ser emitida uma ordem de despejo com essas proporções e ainda dar um razoável tempo, não superior a um ano, para que famílias inteiras, comunidades inteiras, deixem para trás seus direitos, suas terras, suas posses, seus bens, suas lembranças, seu ganha pão, seu orgulho e sua dignidade. Ouvi, de muitos desses que hoje choram sobre as tumbas de seus antepassados a dor pela obrigação de também deixá-los para trás, que a Justiça Brasileira merece o símbolo que possui: a figura eternamente cega às causas verdadeiramente justas. Roraima, que já cede 9 milhões e 600 mil hectares para a reserva indígena Ianomâmi e outros 654 mil hectares para a Reserva São Marcos, a partir de agora também é obrigada a ceder mais 1 milhão e 700 mil hectares, totalizando área restrita aproximada de 12 milhões de hectares para manter isolados, contra sua vontade, pouco mais de 14 mil pessoas, sendo a esmagadora maioria homens, mulheres e crianças já acostumados ao convívio com o não índio. É isso mesmo, Senhor Presidente. Quem vive em Roraima ou conhece nosso Estado, não estranha encontrar índios a cada esquina, como qualquer cidadão não índio, conosco trabalhando, produzindo, comercializando, estudando e também exercendo funções públicas, seja no serviço e mesmo na condição de prefeitos, vice-prefeitos e vereadores. Nossos índios portam registros de nascimento, identidades, cartões de créditos, contas bancárias, são eleitores e também se elegem para o executivo e o legislativo. Será que realmente nossas autoridades superiores levaram em conta as palavras proferidas pelo General Luiz Lessa, ex-Comandante Militar na Amazônia que literalmente afirmou: "Está faltando visão estratégica e de segurança. A polêmica (sobre a Área Raposa Serra do Sol) é fruto de pressão internacional. O Governo não está atento que aquela área, de fronteira, é sensível e pode se transformar em um ponto de conflito". Outro ex-Comandante da Amazônia, General Alcedir Pereira, afirmou que "Roraima está se tornando inviável de governar. Vão conseguir que toda a área de fronteira norte fique sem a presença de qualquer órgão representante do Estado brasileiro. O próximo passo será tentar tornar ali um Estado Independente." Essas palavras, Senhor Presidente, proferidas pelos próprios generais, estão publicadas no jornal O Estado de São Paulo e podem ser lidas por qualquer um. Mais grave ainda, também publicado no mesmo jornal, é a denúncia de que "Os órgãos de inteligência do Governo, inclusive das Forças Armadas, alertam o Palácio do Planalto para o risco que a demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol poderá trazer para a segurança nacional". Será que realmente dá para entender tudo isso, onde o próprio governo e suas autoridades induzem que NÃO PODE CONCRETIZAR uma demarcação em área contínua e este mesmo Governo, de repente, faz exatamente o contrário? À boca pequena, como se diz nos bastidores da política, contam que, muito além de apenas participar dos funerais do Papa, o que houve no AeroLula, naquela viagem onde se reuniram além do atual Presidente, mais 2 ex-presidentes e a nata da representatividade nacional, foi um CONCLAVE para decidir também sobre essa questão, cuja pressão internacional exigia ação imediata. Não afirmo, pois lá não estava. Mas também não jogo no lixo a máxima popular que nos ensina que "ONDE HÁ FUMAÇA, EXISTE FOGO". Afinal, que força estranha e poderosa é essa que faz calar os próprios interessados na questão e impõe sua vontade? De onde realmente emana essa força que, da noite para o dia, decide que milhares de trabalhadores, legítimos proprietários, ficarão sem terra, sem casa, sem bens e que suas famílias ficarão ao relento, mendigando favores de um Governo que parece não mandar em seu próprio quintal? Que poder invisível é esse que nos faz engolir goela abaixo nossa própria soberania, exigindo não termos sequer o direito de espernear? Até quando nós, os roraimenses, teremos que suportar essa insana política da FUNAI, voltada exclusivamente para a demarcação de áreas e mais áreas de terras sem critérios justificáveis e em total desrespeito aos cidadãos, sejam índios ou não índios? Porque esse Governo, ao invés disso, não procura meios para frear a eterna indefinição fundiária de Roraima, que deságua na total falta de planejamento nos assentamentos do INCRA e provoca um caos rural e social? Senhor Presidente, meus nobres colegas. Como disse antes, estou de luto, como de luto está toda a Grande Família roraimense, índios e não índios. Não sei o que dizer ou o que pensar. Não sei para onde irão os milhares de não índios que residem, trabalham e vivem no interior da Área e que, desde sexta-feira passada, são considerados violadores de espaço proibido. Ou seja, da noite para o dia, via Portaria, passaram da condição de prósperos cidadãos respeitados para a de indigentes criminosos... Não sei, também, o que será dos próprios índios sem a presença e os cuidados dos médicos, enfermeiros, professores, comerciantes e outras centenas de pessoas dedicadas à sua causa, aos seus valores e à sua própria sobrevivência... O que sei, Senhor Presidente, é que os devaneios da FUNAI conseguiram suplantar a racionalidade, a lógica e a razão. Sei, também, que essa Portaria agride nossa soberania, fere princípios constitucionais e outros inalienáveis ao ser humano. Iremos lutar contra isso e, enquanto esperança houver, lá estaremos empunhando nossa bandeira de Fé, de Luta contra a Injustiça e em busca de Liberdade e Progresso. É difícil, sei disso, mas não desanimo, como não desanimarão todos os filhos de Roraima, hoje imbuídos do espírito do Bom Combate, aquele que gera os melhores frutos. Aumentam minha coragem e certeza de vencer essa batalha o que nos ensina o próprio Jesus Cristo, conforme está escrito em Mateus, Capítulo 7, Versículo 14: "Estreita é a porta e apertado o caminho que conduz para a vida e são poucos os que a encontram". Nós a encontraremos, Senhor Presidente. Com Fé em Nosso Senhor Jesus Cristo, amém. Era o que tinha a dizer. Muito Obrigado.