- 19 de novembro de 2024
RUBENS VALENTE ENVIADO ESPECIAL A BOA VISTA (RR) Financiado com recursos públicos, o projeto avícola da empresa Frangonorte, que pertenceu ao ministro Romero Jucá (Previdência) entre 1994 e 1996, está abandonado há dez anos na periferia de Boa Vista (RR). Mato, sujeira, ferrugem e deterioração de materiais caros, como silos e sistemas de alimentação das aves, são hoje o cenário do que deveria ser o maior abatedouro de frangos de Roraima, financiado com mais de R$ 5 milhões do FNO (Fundo Constitucional do Norte), formado por parcelas do IR (Imposto de Renda) e do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). Com juros e correções, hoje a dívida cobrada pelo Basa (Banco da Amazônia) é de R$ 18 milhões. Entre os devedores, está o ministro Jucá. De toda a estrutura, que tem 16 construções entre galpões, abatedouros e casas, hoje apenas o escritório está ocupado, em regime de comodato, por uma cooperativa de agricultores familiares. Embora Romero Jucá e o ex-governador de Roraima Getúlio Cruz tenham saído juntos da empresa, no final de 1996 -abrindo mão de 50% das cotas cada um deles para dar lugar a dois outros empresários-, foi com Cruz que a cooperativa tratou para assinar o contrato de comodato, em setembro do ano passado. "Ele disse que ainda estava na responsabilidade dele e ele poderia passar para nós [o uso do escritório] em termos de comodato por quatro anos. Aí ele mandou fazer um contrato no qual a cooperativa se responsabilizava pelo patrimônio", disse o presidente da cooperativa, Raimundo Targino Bento. O contrato de comodato está em nome de Luiz Carlos Fernandes de Oliveira, o mesmo suposto proprietário de sete fazendas inexistentes no interior do Amazonas dadas como garantia ao Basa pelo ministro e por Cruz em 1996. A paralisação das atividades da Frangonorte, datada de 1995, coincide com a passagem do ministro na sociedade da empresa. Ele entrou em dezembro de 1994, logo depois da campanha que o elegeu senador e derrotou o antigo proprietário, o deputado estadual Sérgio Ferreira (PPS). Um alto funcionário da empresa revelou à Folha que cerca de 40 mil aves morreram de fome na virada de 1994, por falta de capital de giro para compra de ração. Entre 1991, quando começou a ser montada, até 1994, a empresa viveu bons momentos. Cerca de 70 funcionários tocavam os oito galpões, construídos em oito hectares na periferia de Boa Vista e operando com a capacidade máxima, cerca de 80 mil frangos e abate semanal de 10 mil frangos. O faturamento médio da Frangonorte era de R$ 45 mil por semana. Dos criatórios, as aves seguiam de caminhão para o abate em outro prédio, no centro de Boa Vista. Ali, as aves eram mortas a choques elétricos e preparadas (depenadas, limpas e embaladas com o nome de fantasia da empresa, "Frango Sabor"). Dez anos depois, só esse mesmo nome, apagado em letras pequenas na parede da empresa, lembra que ali funcionou o que deveria ter sido o maior projeto de investimento do Basa na cidade. Motores elétricos das câmaras frias estão enferrujados. Na periferia da cidade, parte do teto de um dos galpões desabou. As linhas de comedouros e bebedouros para as aves estão no chão ou com as engrenagens tomadas pela ferrugem e as telhas de betume verde, importadas da Venezuela, estão pontuadas de furos.