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PPS de Freire ataca o governo

O presidente do PPS, Roberto Freire (PE), ouviu na terça-feira de Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que Lula não poderia recebê-lo. Freire respondeu que considerava um desrespeito ao partido a demora de mais de 20 dias para conseguir uma audiência com o presidente. E ontem decidiu divulgar o documento que pretendia entregar a Lula. Uma série de ataques a praticamente todos os setores do governo, condensados em 22 páginas. Salva-se apenas a política externa. O restante, não apenas a área econômica como a política social, é duramente criticado no texto.

Helayne Boaventura Da equipe do Correio O presidente do PPS, Roberto Freire (PE), ouviu na terça-feira de Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que Lula não poderia recebê-lo. Freire respondeu que considerava um desrespeito ao partido a demora de mais de 20 dias para conseguir uma audiência com o presidente. E ontem decidiu divulgar o documento que pretendia entregar a Lula. Uma série de ataques a praticamente todos os setores do governo, condensados em 22 páginas. Salva-se apenas a política externa. O restante, não apenas a área econômica como a política social, é duramente criticado no texto. Tanto o silêncio do Planalto como a contrariedade de Freire são os sinais claros da deterioração das relações do deputado com o governo. E uma evidência de que o PPS está com os dois pés fora da base aliada, no que depender dele. Freire destaca que o documento seria uma contribuição do partido sobre a condução do governo. Tanto que o texto diz que ''não é hora de discutir a formatação de um possível campo maior de oposição''. Depois do que considera uma desfeita do presidente, porém, ele diz já não saber como se desencadeará o processo. ''O governo parece só entender o discurso do aplauso'', critica. No capítulo denominado ''O desmonte das políticas públicas'', o partido traça um cenário desolador do governo até agora. Critica o anúncio de medidas que não são postas em prática e a deterioração dos serviços prestados, como nas áreas de educação e saúde. Reclama da falta de investimentos em infra-estrutura e das dificuldades em aprovar o projeto de Parceria Público-Privada no Congresso. Queixa-se de o governo ainda priorizar a unificação de programas assistencialistas ''sem introduzir ou ampliar novas iniciativas'', e dos conflitos de interesse na gestão da reforma agrária, da agricultura e na área do meio ambiente. ''Enfim, o atual governo mistura paralisia, desordem e equívoco na definição de prioridades'', ataca. Como sugestão, o documento pede uma reforma do sistema financeiro, queda nos juros e retomada do crescimento. Propõe a renegociação da dívida interna, a flexibilização das metas de inflação, o que permitiria, diz o texto, atuar com superávits primários menores. Sugere criar um imposto progressivo sobre o lucro dos bancos e controlar capitais. Cobra ainda uma reforma tributária profunda e um novo pacto federativo, para reduzir o controle de recursos nas mãos da União. Questões políticas Apesar do duro tom dos ataques, os governistas preferiram não dar eco às críticas do PPS. Mas o chefe de gabinete do presidente reconheceu que Lula não recebeu Freire por questões políticas. Explicou que a demora na resposta ocorreu por uma falha na burocracia interna, mas que a decisão de não recebê-lo não foi provocada por problemas de agenda. ''Não há um menosprezo ao documento, nem ao partido, mas o presidente achou melhor que o partido divulgasse o documento, sem prejuízo de futuras conversas'', justificou Carvalho. No Planalto, a avaliação é de que, mais do que atingir o governo, o documento serve para aprofundar o fosso que há entre Freire e o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes. Os dois vivem às turras e os governistas acreditam que, após as eleições, haverá uma definição no partido. Ou Ciro sai da legenda, já que Freire controla a direção, ou o ministro consegue uma revolução na sigla para torná-la mais afinada com o Planalto. Procurado pelo Correio, Ciro não quis comentar o documento. Mas o líder do PPS na Câmara, Júlio Delgado (MG), reconheceu que as críticas causam mais constrangimento ao ministro. ''Se o documento for colocado como sugestão para melhorar um governo de esquerda, tudo bem. Mas fazer críticas sem buscar solução pode criar um constrangimento para o ministro'', analisou. Memória - Histórico de desavenças Apesar de presidir um partido aliado ao governo Lula, o deputado federal Roberto Freire, do PPS, é um crítico mordaz do PT. Os ataques são desferidos principalmente contra a condução da política econômica e as propostas que envolvem a região Nordeste. Ao articular essa oposição, o deputado colide com o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, cota do PPS no governo Lula. Freire chegou a afirmar que não nutre nenhuma simpatia pelo governo do PT. Essa posição foi considerada incoerente pela ala governista do PPS, que avaliou que o deputado mantinha uma postura ''oposicionista complacente'' durante o governo no presidente Fernando Henrique (PSDB) e que agora torna-se crítico com aliados. A divergência se agravou na votação da medida provisória que fixou o salário mínimo em R$ 260, quando a direção do PPS chegou a anunciar que o partido votaria contra a proposta. Mas o resultado, no PPS, foi de 11 votos a favor do governo, contra apenas quatro que apoiaram um aumento maior. Na ocasião, Ciro Gomes disse que Freire estava se alinhando aos partidos de oposição, e que seria uma irresponsabilidade do PPS somar-se ao PFL e ao PSDB. O ministro afirmou ainda que Freire, como presidente do partido, deveria atuar como mediador nas divergências internas e não tomar posição em relação às divisões. As eleições municipais também se tornaram foco de discórdia entre Freire e Ciro. Freire articulou a retirada da candidatura do deputado estadual do PPS Arnaldo Jardim para apoiar Serra, contrariando Ciro Gomes, que apoiava posição do deputado federal João Hermann de apoiar a candidata Marta Suplicy, do PT. Freire afirmou ainda que, mesmo contra sua vontade, o PPS está apoiando em Belo Horizonte o candidato do PT, Fernando Pimentel. Nas reuniões partidárias, Ciro Gomes defende o governo e diz que, como integrante da equipe de Lula, só manifesta suas discordâncias em discussões internas. Mas o bate-boca público entre dois grandes nomes do PPS pode ameaçar o futuro político do partido. No rastro da discórdia, o PTB, em busca de cacife para tornar-se o aliado preferencial de Lula na campanha presidencial de 2006, tenta atrair Ciro Gomes para concorrer às eleições para governador do Rio de Janeiro.
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