- 26 de novembro de 2024
A VERDADE JURÍDICA
JOBIS PODOSAN
Na minha cidade natal havia um cidadão casado e pai de quatro filhas, que passou a ser sistematicamente acusado pelo locutor do serviço de auto-falantes da cidade de ser tolerante com as aventuras sexuais da esposa, embora ninguém na cidade soubesse que aventuras eram essas. O locutor ocupava seu programa diário atacando a reputação da esposa desse cidadão e, na cidade, todos estranhavam o fato da não reação a tão graves acusações. O homem ofendido circulava imperturbável pela cidade, ganhando, por isso, alguns adeptos pela prudência e moderação , embora outros criticassem a sua inação. Essa conduta estimulava o falastrão a aumentar suas invectivas, mesmo sem apresentar prova alguma do que dizia. Certo dia, durante a festa de micareta (Carnaval municipal), num bar próximo a casa do acusado, estando o bar cheio por causa do intervalo dos trios elétricos, eis que chega ao bar o suposto marido traído e manso. Estava no bar o referido locutor que, assim que o homem entrou no bar, gritou para todo mundo ouvir: ei!, dono do bar, suspenda a altura da porta pro corno passar sem quebrar os chifres! Fez-se embaraçoso silêncio e olhares fixos, esperando a resposta do homem insultado. Mas este, voltou as costas e saiu do bar, provocando gargalhadas gerais e discurso inflamado do acusador. Alguns minutos depois, volta o homem e vai direto na direção do acusador, para na frente deste, saca um revólver e o descarrega por inteiro no radialista, matando-o na hora. Em seguida, ainda sem dizer uma palavra, vai em direção à Delegacia e se entrega, ele e a arma, e narra o que aconteceu, sendo preso em flagrante. A cidade ficou estupefata, mas as opiniões se unificaram: o Carlos obrou como homem de honra, esse locutor abusou da paciência de um homem bom levando-o a lavar sua honra com sangue. Passou a ser visitado pelos amigos e pela família, dormia num quarto sem grades, às vezes ficando ele próprio a tomar conta da delegacia e vigiar outros presos. O tempo passou e ele foi julgado e absolvido por unanimidade pelo Tribunal do Juri, passando a gozar da amizade e respeito de todos.
Esta história me veio à lembrança a propósito da acusação de fraude na eleição presidencial deste ano. De que fraude estão falando? A acusação de fraude não torna uma eleição fraudulenta. A acusação é a versão de quem acusa. Para existir a fraude que pode provocar a nulidade das eleições, é preciso: 1) haver uma acusação dirigida ao órgão competente para julgar, com uma petição inicial que descreva minuciosamente as nulidades, com as provas respectivas (provas e não só argumentos); 2) citação dos autores da acusada fraude; 3) produção de provas das fraudes apontadas; 3)intervenção do ministério público; 4) julgamento pelo órgão competente reconhecendo a fraude; 5) trânsito em julgado da condenação. Somente depois desse iter, tem-se que houve fraude nas eleições e outro pleito será realizado. Acusação de fraude não torna a eleição fraudulenta, por mais estridente que seja. Existe um processo legal a cumprir, até porque quem perde uma eleição engendra todo tipo acusação para infirmar o pleito. Querer usar o povo como massa de manobra, como fez Pilatos, não torna a eleição nula, ê preciso respeitar o devido processo legal. Aliás, é estranho que com tanta veemência na acusação e com as "provas" que dizem ter, nenhuma ação tenha sido ajuizada nem no TSE é nem no STF, visando à prova da fraude alegada. Por que recorrer ao emocional da minoria dos eleitores, se havia a via judicial à disposição. Não votei no PT, nem nesta e nem em nenhuma outra eleição, mas é preciso respeitar o resultado das urnas, gostando-se ou não do vencedor.