- 26 de novembro de 2024
A INELEGIBILIDADE QUE FALTA
JOBIS PODOSAN
Quando Tancredo Neves ganhou as eleições presidenciais indiretas, realizadas pelo Colégio Eleitoral Eleitoral, no ano de 1985, adoeceu depois de eleito e veio a falecer antes do dia marcado a posse. Após alguma instabilidade política, graças à ação destemida de Ulisses Guimarães, ficou decidido que o vice-presidente eleito deveria ser empossado no lugar do presidente falecido. Como se tratava de José Sarney, o então presidente a ser sucedido, o general João Figueiredo, devido ao fato de Sarney ter sido presidente do partido de sustentação ao governo e ter aderido à corrente contrária ao governo militar, Sarney afigurava-se-lhe um traidor. Não compareceu à transmissão e, segundo consta em muitas versões, saiu do Palácio pelas portas dos fundos.
Nos EUA o presidente Trump resolveu não comparecer a posse do seu sucessor, o democrata Joe Biden, o que representou uma quebra de protocolo na tradição democrática americana, o que poderá resultar em algo lá inédito: um ex-presidente ir parar na cadeia. Porém, no Brasil, o presidente atual encontra apoio na ala conservadora da política brasileira e imagina poder reverter o resultado das edições pondo medo nos outros. No Brasil, como acima mencionado, temos como exemplo mais recente de um chefe do Executivo que se recusou a comparecer à posse de seu sucessor, foi o general João Baptista Figueiredo, o último presidente da ditadura militar, a quem atribuiu a Sarney a pecha de traidor. É preciso dar consequência a esse modo de pensar e agir. Governos são recebidos e devem ser passados aos sucessores, sob pena de sanção. É preciso dar consequência jurídica a esse ato. Quem passa o cargo é o presidente sucedido e não o cidadão. Este pode pensar o que quiser, mas o presidente em fim de mandato é ainda presidente e deve comparecer à posse do sucessor, seja dele simpatizante ou não. O que se obedece é à vontade popular. A regularidade da eleição foi atestada pelo órgão competente, assim, sejam quais forem os motivos, o resultado é válido até que, através dos meios competentes, seja a decisão declarada nula. O presidente derrotado não se transforma num tribunal de exceção e passa a julgar os atos eleitorais competentes e de lhes declarar a nulidade. Aliás, se assim fosse, nenhum presidente jamais seria derrotado. Declarar uma eleição nula não é atribuição de candidato derrotado ou de seus seguidores, por mais altos e estridentes que sejam os seus brados. Existe um caminho para se declarar a nulidade de um pleito eleitoral e não é o grito da população induzida por líderes da minoria derrotada. Há, juridicamente, somente um caminho para infirmar o resultado das eleições: os recursos judiciais ao próprio TSE ou ao STF, fora daí a situação desbordará para o crime e, os que clamam pela nulidade, correrão o risco de ir para a cadeia. As questões de direito não são resolvidas por torcidas organizadas, mas por recursos dirigidos aos órgãos competentes, uma vez que alegar não é provar. Alegar todos podem, mas tais alegações são inúteis para produzir algum resultado juridico na direção da tese sustentada. poderá, sim, produzir resultados opostos, pois se poderá, devido ao uso da força, se transbordar o campo da licitude, provocar efeitos penais e, ao invés de anular as eleições, serem os revoltosos presos sob acusação penal.
Poder-sá argumentar que os contestadores agiram dentro do quadro das liberdades constitucionais. É certo, porém, até mesmo esse limite quem estabelecerá será o Poder Judiciário, pois dele depende a interpretação do direito. Este é o pacto que está na Constituição. Estão sendo publicadas matérias nas redes sociais, atribuindo ao STM a atribuição de julgar os ministros do STF, por isto ou por aquilo. Só pelo fato de escrever isto, tudo o mais que se diga nas tais matérias, algumas até longas, resulta claro como o sol que quem escreveu tal tal disparate jurídico não tem a menor ideia do que está dizendo.
Há também, muito difundido, o argumento de que os contrários ao resultado das eleições estão agindo "dentro das quatro linhas" da Carta Magna. Além de simplória esta tese das quatro linhas é um argumento pueril, até porque quem decide se a constituição está sendo cumprida, ou não, é o Poder Judiciário, que é quem fala por último na interpretação da Constituição, especialmente o STF que, quando fala, define a direção da interpretação constitucional, sem recurso a mais ninguém.
É preciso, pois, dar consequência juridica ao atos do presidente que apregoa ou estimula a revolta da população contra atos do Poder Judiciário, sem recorrer às vias apropriadas dentro do direito e tenta mostrar ter razão manipulando a população na direção da quebra da ordem jurídica. Urge que se coloque na constituição dispositivo que obrigue o sucedido a comparecer a posse do sucessor passando-a faixa presidencial e, se quiser e achar que tem motivos para infirmar a eleição, que o faça dentro da lei e não rasgando a Constituição. E essa obrigação deve ter consequência: a inelegibilidade pelo maior prazo previsto na constituição, afinal a presidência pertence ao povo e deve ser passada e recebida dentro do ritual de respeito que o povo merece. O derrotado, como representante da minoria, deve passar a faixa, símbolo do poder, ao representante da maioria. Aliás, não ê isto que chamamos democracia?