- 26 de novembro de 2024
LOBOS ESPECIAIS
JOBIS PODOSAN
Dentro em pouco surgirá no Brasil a discussão eterna sobre a constitucionalidade da prisão especial, prevista para os portadores de diploma de nível superior no Brasil. Quando entrou em vigor o atual Código de Processo Penal, em 1941, pouquíssimos eram os brasileiros que faziam um curso superior, daí a norma não ser tão saliente como é hoje, dada a enorme quantidade de cursos superiores espalhados país afora e a facilidade de cursá-los. Para muitos, inclusive eu, esse privilégio ofende a Constituição vigente, por não haver qualquer finalidade na sua existência, pois desiguala brasileiros sem razão lógica que o justifique, principalmente porque, sendo portador de nível superior, o brasileiro tem muito mais discernimento sobre a gravidade das suas condutas para se manter dentro da lei. Por outro lado, o uso perdeu a importância e o abuso desse direito tornou-se um escudo protetor para criminosos. De prerrogativa transmudou-se em privilégio injustificado e injustificável, pois desiguala os cidadãos sem razão suficiente para a desigualação. Recentemente, nos escândalos do Mensalão e do Petrolão os portadores de curso superior - e até um que não tinha e não tem - foram beneficiados pela regra esdrúxula desse privilégio. Estão já todos soltos e com o produto do crime no bolso, vivendo como os reis que se tornaram ao escolher o tesouro público como meta de subtração. Mas a cada dia esse quadro vai mudando lentamente.
Autoridades começam a ver privilégio descabido no instituto, apesar de ser previsto em lei. A Procuradoria Geral da República-PGR questionou esse privilégio perante o STF por identificar violação aos princípios da dignidade humana e da isonomia. O caso será julgado em plenário virtual do STF. Se for declarada a inconstitucionalidade para derrubar a previsão de prisão especial para quem tiver diploma de curso superior, todos ficarão, no particular, iguais perante a lei.
Alexandre de Moraes é o relator de uma ação protocolada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2015 que questiona o benefício previsto no Código de Processo Penal. A PGE defende que a norma viola a Constituição, ferindo os princípios da dignidade humana e da isonomia, como acima referido. A prisão especial prevista em lei não tem características específicas para as celas – consiste apenas em ficar em local distinto dos presos comuns.
No voto apresentado, diz Moraes que a norma é inconstitucional e fere o princípio da isonomia. O ministro afirmou que não há justificativa para manter um benefício que, segundo ele, transmite a ideia de que presos comuns não se tornaram pessoas dignas de tratamento especial por parte do Estado.
“A norma impugnada, prossegue, não protege uma categoria de pessoas fragilizadas e merecedoras de tutela, pelo contrário, ela favorece aqueles que já são favorecidos por sua posição socioeconômica." Diz, ainda que, "embora a atual realidade brasileira já desautorize a associação entre bacharelado e prestígio político, fato é que a obtenção de título acadêmico ainda é algo inacessível para a maioria da população brasileira", diz Moraes e que "a extensão da prisão especial a essas pessoas caracteriza verdadeiro privilégio que, em última análise, materializa a desigualdade social e o viés seletivo do direito penal, e malfere preceito fundamental da Constituição que assegura a igualdade entre todos na lei e perante a lei”, escreveu.
Estamos numa quadra civilizacional no Brasil na qual os pobres cometem crimes principalmente contra a vida e contra o patrimônio dos particulares, causando danos às pessoas atingidas, e são arremessadas em prisões abarrotadas, nas quais faz graduação e pós-graduação em criminalidade e saem piores do que entraram. Por outro lado, esses mesmos crimes são cometidos por pessoas portadoras de curso superior, em escala de danos muito maior, mata pessoas em número indeterminado e subtrai o patrimônio publico calculado já em bilhões. Essas pessoas ficam em “prisão especial”, com tudo do bom e do melhor, utilizando para os privilégios o próprio património subtraído. Ao final, porque dispondo de defesas de alta qualidade técnica e ética nem tanto, passam dois ou três anos na prisão, como em férias no Caribe, os crimes prescrevem, o Estado perde o direito de puni-los, ficam com o produto do roubo e voltam para os holofotes da mídia e da sociedade, como se inocentes fossem, e reingressam na política ululando a injustiça da prisão e usam o produto dos crimes para obterem mais mandatos e mais dinheiro.
Perguntar-se-á: e onde está a tão decantada sabedoria popular, que elegem e reelegem estes facínoras? A resposta é simples: pergunte a um homem morrendo de sede e fome, se ele quer água e comida ou ouro? E exiba-lhe um copo cheio de água, um prato de comida e um pote cheio de ouro. Quais deles o sedento e o faminto preferirão? Na situação de premência, o ouro tem utilidade marginal zero e a água e a comida significam vida.
Há certas localidades no país nas quais a água é o elemento primordial da vida. Ainda a pouco vimos que a região mais sedenta do país elegeu um Presidente da República ao argumento de fome e da sede, prometendo fartura de tudo e, acredite, dizendo que construirá faculdades mil, de baixa qualidade, mas deixará mantidas a fome e a sede, fonte imediata de poder dessas pessoas. Mas o presidente eleito não tem curso superior, dirão alguns. Porém, no seu entorno, os manejadores dos cordéis que controlam a marionete, todos têm curso superior e estão em derredor do mágico apenas para usá-lo, como fazem há décadas, deixando o tolo parecer e pensar que é sabido. É perceptível o alvoroço das sanguessugas que rodeiam o bobo com olhos injetados de ambição e atitudes gulosas.
Talvez a quebra da prisão especial sirva para fazer os lobos refletirem.