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Artigo

Êh maluco, se é cem, deixa rolar...


\"\"Êh maluco, se é cem,
deixa rolar...

Eliane Rocha

Vinte reais para entrar, cinco pra estacionar e cem pra sentar. Estes foram os cumprimentos de boas vindas, dispensados aos convidados que entravam no antigo Cat – clube dos servidores da extinta Telaima – para curtir o “Primeiro Luau Reggae”, com shows das bandas Guy-Bras e Johnny Jack Mesclado, de Manaus.

Até chegar às margens do rio Branco, onde seria o luau, vai aí uma caminhada de cinco minutos (pra quem pagou os cinco reais),  que  desce por uma escada para (Ufa! Cansei só de lembrar), então, avistar o local. Anda mais um pouquinho, primeiro respira, e, finalmente, chega ao ponto, caprichosamente decorado para a noite de lua cheia.

Tudo bem arrumado, palco preparado, uns poucos gatos pingados – com roupas leves e coloridas – se aproximando. No relógio, os ponteiros marcavam 23 horas e alguns minutos. Ué? Mas a festa não começava às 21h? Eu li em algum lugar necessário. Se bem que disseram, também, que um DJ iria fazer um set com o melhor do reggae music atual. A música tocando ao fundo é o tal do “set”? Hummmm. Então tá, né, Mané?

Eu, enferrujada, comecei a balançar os quadris ouvindo o som mecânico que vinha do palco. Depois de ensaiar dois pra cá, dois pra lá – esse passo combina com qualquer ritmo, já perceberam? – resolvi sentar em uma das dezenas de cadeiras arrumadas em espaço “reservado”.

Lá, toda prosa, relaxada no meu vestidinho tubinho rosa-florido tomara-que-caia  – graças às minhas sessões de massagem não preciso usar cinta – chega um moreno alto. Pensei: “Jésusss! Lá vem a primeira cantada da noite. Tudo bem. Sou guerreira, não fujo às minhas obrigações com a receita. Declaro tudo”.

Esperei o canino mostrar a mandíbula. Pro meu desalento, o cara veio com essa: “Boa noite. As princesas (Princesa é f..., né? Pior mesmo é o cara te chamar de “paixão”. Aí f... É melhor ir pra casa assistir ao Malafaia ou então ao batismo das águas no Curupira) compraram a mesa?” Eu: “Como assim? Comprar mesa? Se quase não aguento descer as escadas sozinha, quanto mais com uma mesa na cabeça.

Não sua tonta. O bofe, bofinho, explicou: “É que as mesas estão sendo vendida (Puts! O cara é filho do Gerúndio e a mãe fugiu com a concordância verbal) a seis reais. Olhei para o bíceps do rapaz – nessa hora ele já estava ajoelhado me explicando tuudo. Pensei:  “Vou quebrar esse caboco agora”. E imaginei a cena: nós dois rolando naquela areia grossa, travando luta corporal até ficarmos cansados. “Nada disso, Eliane... Calma, disciplina e elegância”, lembrei-me de minha amiga Flora.

Acuada, meti a mão na bolsinha Victor Hugo (comprada na Feira dos Importados em Brasília). Tinha saído o pagamento. Tava forrada. Enquanto procurava os courinhos de rato – as garoupas estavam todas em casa, debaixo da minha box financiada em 12 vezes sem entrada –, a surpresa. “O quêêêê???” Imagine o grito que dei no ouvido do cabrinha. Ele desmontou todo.

De seis pulou pra cem. Isso mesmo, meus irmãos. Era cem paus – e as mesas nem eram de madeira – para ocupar quatro cadeiras. Não acreditando naquele absurdo, minha amiga chama o promoter. Pela “profissa”, dá pra sacar a figura.

Lá vem um rapaz todo serelepe, pulando mais que calango em areia quente. Ao se aproximar, afetado, foi logo avisando: “As mesas estão sendo vendidas (de novo seu Gerúndio) a cem reais, e já só temos três”. Olha o papo de vendedor de peixe na xepa.

O bofe - esse é bofe mesmo - foi mandando o recado e expulsando quem não tinha “feito reserva”. Não deu um minuto pra que todas as cadeiras estivessem escoradas nas mesas para que ninguém sentasse. Mas ele não disse que já estavam quase todas vendidas?

Depois do assalto à mão-armada, eu e minha amiga reggueira fomos pastar. Que horas? Já passava da meia-noite, mana. E nada de começar o “Primeiro Luau Reggae”. Mas o set reggae music tava rolando. Só não vi o DJ. Deve ser parente do finado Lombardi.

De longe avistei um negrinho dos bons. Mike esperava para cantar com sua Guy Bras em companhia da mulher e da filharada – só numa sentada contei seis. Fico imaginando o que o guianense faz quando não está compondo reggae. Mas, deixa rolar...

“Ô, Eliáani! Como que cê tá?” O sotaque de Guy-Bras e simpatia do seguidor de Bob Marley são inconfundíveis. Conversamos algumas amenidades, e outra surpresa: Mike não abriria mais o show como anunciado em algum lugar necessário. A banda amazonense, não sei por qual motivo atrasada, seria a primeira a se apresentar. Detalhe: se Mike e sua turma quisessem ser os primeiros, tudo bem. Desde que abrissem o show, cantassem duas ou três músicas e, depois, saíssem de fininho, no escurinho, pra rapaziada de Manaus entrar. Consolo dos “brothers”: voltariam no final – passando das quatro da manhã, quando quem não tá chapado já tá pra lá de noiado – para encerrar a festa.

Dez pra uma da manhã. Chegam os reggueiros manauaras. Hora de começar o show. Alguém, acho que o DJ sei-lá-o-quê, avisa: “O show vai até as quatro e meia da manhã com muito reggae pra vocês”. Inda bem, né? Por um momento pensei que estava na festa errada.

E o promoter? Ah, o bofe agarrou o microfone e disparou: “Carnaval em Pacaraima! Compre logo seu camarote porque vai ser bom Pacaraima”. Estão avisados, né? Se não comprarem, já sabem pra onde vão.

Ê maluco, se é bom, deixa rolar... Ê maluco, se é cem, deixa rolar...

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