- 23 de julho de 2025
Há quem acredite que a existência, embora cruel sob muitos aspectos, é espécie de purgação de pecados cometidos em outra esfera ou dimensão. Que as pessoas se purificam enquanto sofrem e que nada acontece ao acaso, pois fazemos parte de um grande organismo autofágico (o universo), eternamente a se consumir.
A mente humana é extremamente fértil na elaboração de esquemas e representações que ajudem a diminuir, mitigar as dores do cotidiano, num mundo em que a maioria se preocupa tão somente com a opulência e o poder.
Agora mesmo, nosso planeta testemunha, estarrecido, o bombardeio inclemente de Israel no Líbano, na utilização de armas sofisticadas e avançado apuro tecnológico para o assassinato de crianças na mais tenra idade. Todos nós presenciamos o fato, inconformados e impotentes diante da loucura.
Idéias e dogmas existem em profusão. Saber exatamente o que mais se aproxima da realidade não vem ao caso. Cada qual alimenta seus próprios sonhos e ilusões, ou gritante indiferença. O homem, já se disse, é o lobo do próprio homem.
O ser humano se imagina capaz de aprisionar o instante. De perpetuar acontecimento prazeroso, ou de exercer controle permanente (manipulando fatos e circunstâncias), quando, na verdade, tudo flui e se dissipa e se esvai e se transforma e se renova e se arruína.
Que possuímos de concreto e imutável, num mundo onde os grandes impérios revertem ao pó, eternizando-se unicamente no registro da história? Mesmo assim, nada aprendemos! A maioria confia que a realização só tem como ser alcançada através da aniquilação do semelhante.
Não basta ter ou possuir, é preciso impor. Não é suficiente usufruir, mas arrasar o que não se alcança nem se conquista, assegurando-se da impossibilidade do próximo em receber o que algumas vezes, por merecimento, lhe é devido.
Desejar a morte de outra pessoa, como se significasse a emissão de salvo-conduto para a realização pessoal, através de programas e projetos, geralmente resulta em acontecimento invertido.
Há 52 anos, no século passado o intelectual e jornalista Carlos Lacerda travava incansável combate contra a gestão do presidente Getúlio Vargas, governo que dizia naufragar num "mar de lama".
Numa mobilização sem trégua, em argumentação brilhante e inexcedível, escrevia artigos na sua trincheira, a Tribuna da Imprensa (RJ), despejando-os como petardos certeiros que causavam fortes abalos no Palácio do Catete.
Até que o chefe da guarda pessoal de Getúlio Vargas, Gregório Fortunato, decidiu por conta própria "dar um susto" em Lacerda, no atentado da Rua Toneleros, em Copacabana, Rio de Janeiro. Ali, o jornalista foi atingido por um tiro no pé e o major da Aeronáutica, Rubens Vaz, perdeu a vida. Instalou-se a crise!
A população foi às ruas pedir a renúncia de Vargas que guardava um último trunfo: em 24 de agosto de 54, no Catete, o presidente suicidou-se com um tiro no peito e reverteu o quadro completamente. A Tribuna da Imprensa foi empastelada e destruída.
Para se salvar da turba enfurecida, Lacerda teve que se refugiar na embaixada dos EUA. Em Roraima, o episódio é relembrado na semelhança, em função da "torcida" cruel e desalmada que certos órgãos de comunicação fazem ao desejar a morte do governador Ottomar de Sousa Pinto (PSDB).
Se conhecessem um pouquinho de história, não enveredariam por tal caminho.
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