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Crônica do Aroldo - HIERARQUIA

O poder embebeda. Às vezes, o poder torna-se cachaça. Com o passar do tempo, a administração desandou: o governador e seus asseclas tinham descoberto o prazer de ganhar dinheiro fácil e a roubalheira passou a nortear os passos da quadrilha. Todo mundo roubava.


 

Eleito, o governador daquele Estado montou o secretariado e, no começo, a engrenagem funcionava perfeitamente: azeitada.

O poder embebeda. Às vezes, o poder torna-se cachaça. Com o passar do tempo, a administração desandou: o governador e seus asseclas tinham descoberto o prazer de ganhar dinheiro fácil e a roubalheira passou a nortear os passos da quadrilha. Todo mundo roubava: vigias, porteiros, copeiras, cozinheiros, ajudantes, agentes, detentores de cargos de confiança e, naturalmente, o Chefe de Estado. Até os secretários de Segurança e de Justiça participavam na dilapidação do bem público.

Cobravam-se  10% sobre compras, 10% para encaminhamento de processos e 20% para efetuar pagamentos; assim, a aquisição de materiais ou a compra de serviços alcançava  preços astronômicos. Os contratantes com o Estado eram achacados de maneira tão acintosa que o "por fora" passou a incorporar os negócios e a ficar "por dentro".

A plebe assistia à esnobação dos novos-ricos em seus carros importados reluzentes, lanchas de luxo, esquis à jato, aviões, fazendas-modelo, viagens ao exterior, roupas de grifes caríssimas,  regabofes monumentais à base de Moet & Chandon e Schotch 12..., 15..., 60 anos. Os larápios pareciam disputar o posto de quem roubava e ostentava mais.

A Secretaria de Educação era aquinhoada com as verbas mais polpudas naquele governo. Raciocinava-se, então: se tem mais dinheiro, é a que mais rende. A detentora da pasta, antes senhora humilde e de parcos recursos, entregou-se à farra com o que lhe era repassado (Não se falava em comissão ou roubo; tudo eram repasses): construiu luxuosa mansão, montou uma grande loja de departamentos, comprou imóveis no Rio de Janeiro e em Brasília, presenteou cada um dos seus rebentos com carros luxuosos; enfim, um esbanjamento só.

Certo dia, numa simples canetada, o Governador exonerou a secretária de Educação. Ela que, no ato, viajava pelas praias nordestinas, voltou apressadamente para falar com o Chefe do Executivo e saber a razão da medida. Quando recebida pela autoridade, foi direto ao assunto.

- Governador, nós formamos uma equipe tão coesa... Não entendi o porquê da minha exoneração...

- É tudo uma questão de hierarquia: um Secretário não pode se sobrepor ao Governador...

- Governador, onde foi que eu errei? Por Deus...

- Eu já lhe disse: tudo é uma questão de hierarquia...

- Governador, eu sempre acatei suas ordens e determinações... Os projetos vêm sendo executados dentro do que o senhor estabeleceu...

- É tudo é uma questão de hierarquia...

- Governador, não consigo entender... O senhor podia ser mais explícito?

- Tudo é uma questão de hierarquia, minha filha... Desde quando um Secretário pode roubar mais que o Governador? Daqui a pouco o vão até fazer troça da minha incompetência em arrumar o meu pé-de-meia...

 

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