O novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Marco Aurélio Mello, disse ontem no discurso de sua posse no cargo que "o Brasil se tornou um país do faz-de-conta". Há, segundo o ministro, não apenas uma crise de valores, mas um fosso moral e ético. "São tantas e tão deslavadas as mentiras, tão grosseiras as justificativas, tão grande a falta de escrúpulos que já não se pode cogitar somente que há apenas uma crise de valores", disse o ministro que presidirá as eleições de outubro.
``Há no Brasil não apenas uma crise de valores, mas um fosso moral e ético`` Marco Aurélio Mello, presidente do Tribunal Superior Eleitoral
O novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Marco Aurélio Mello, disse ontem no discurso de sua posse no cargo que "o Brasil se tornou um país do faz-de-conta". Há, segundo o ministro, não apenas uma crise de valores, mas um fosso moral e ético. "São tantas e tão deslavadas as mentiras, tão grosseiras as justificativas, tão grande a falta de escrúpulos que já não se pode cogitar somente que há apenas uma crise de valores", disse o ministro que presidirá as eleições de outubro.
Embora não tenha citado diretamente nenhum político, Marco Aurélio mandou um recado aos envolvidos no mensalão, segundo ele, "o maior dos escândalos nacionais". O ministro prometeu que não haverá condescendência de qualquer ordem durante a sua permanência à frente do tribunal. "Passem ao largo das chicanas, dos jeitinhos, dos ardis possibilitados pelas entrelinhas dos diplomas legais", avisou.
O ministro acrescentou que o país parece estar dividido em dois segmentos estanques: um seria o da corrupção, "seduzido pelo projeto de alcançar o poder de uma forma ilimitada e duradoura". Outra seria o do povo que, segundo ele, "apesar do mau exemplo, esforça-se para sobreviver e progredir". O novo presidente do TSE mencionou a denúncia feita pelo procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, dizendo que tornou-se quase banal a notícia de indiciamento de autoridades dos diversos escalões.
"A rotina de desfaçatez e indignidade parece não ter limites, levando os já conformados cidadãos a uma apatia cada vez mais surpreendente", lamentou Marco Aurélio. "Como se todos os homens públicos fossem e tivessem sido igualmente desonestos, numa mistura indistinta de escárnio e afronta em que o erro passado justificasse os erros presentes", afirmou. Irônico na maior parte do discurso, Marco Aurélio Mello foi duro: "Faz de conta que não se produziu o maior dos escândalos nacionais, que os culpados nada sabiam, que não foram usadas as mais descaradas falcatruas para desviar milhões de reais".
O ministro ressaltou o papel da Justiça no processo eleitoral e apontou o Congresso Nacional como o culpado pelas falhas na Justiça, ao dizer que ao Judiciário não cabe outro procedimento senão fazer cumprir a lei. "Se aqueles que deveriam buscar o aperfeiçoamento dos mecanismos legais preferem ocultar-se por trás de negociatas, que o façam sem a falsa proteção do mandato", criticou, na presença do presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL).
O procurador-geral da Repúblico ressaltou em seu discurso que o tribunal precisa interpretar de forma segura temas relativos à propaganda eleitoral e ao conteúdo de comportamentos dos agentes públicos. Antônio Fernando saudou a renovação da corte. "Como já estamos na fase preliminar de um novo período eleitoral, antecedido por acontecimentos graves que de alguma forma deitam raízes na eleição anterior, o evento ganha dimensão ainda maior".
Desvios O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Roberto Busato, também discursou e lembrou que a crise atual decorre dos desvios que se iniciaram na eleição passada e, assim como Marco Aurélio, criticou a omissão do Congresso na elaboração de uma legislação eleitoral mais rígida. "Estas eleições, excetuadas algumas medida tópicas, serão regidas basicamente pelas mesmas regras da anterior, sujeitas, pois, em tese, a repetir-lhes os graves desvios", disse o advogado.
Polêmico, Marco Aurélio será o principal responsável pelas eleições de outubro deste ano. O ministro já presidiu o TSE em 1996, quando comandou a primeira eleição informatizada do Brasil.