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Sonhando - Jorge Barroso*

Quanto mais sonhos sonhamos mais melhoramos a realidade. A realidade, quando só, é dura, dolorida, pesada, lacrimosa, é só queixa. Mas quando acompanhada do sonho é alegre, suporta a dor, na expectativa de dias melhores que virão. A senhora Esperança, por ser a última que morre, vive num mundo ainda mais distante, quer que todos sejam felizes, é tão etéreo que precisa ser chamada ao mundo dos sonhos, que é mais próximo da realidade.


O Partido do Sonho (PS) anunciou a possibilidade de lançar candidato próprio ao Governo do Estado nas eleições de outubro. A decisão está sendo tomada em razão da disputa feroz que está sendo travada entre as correntes políticas que comandam o Estado desde a sua criação. O nível de desrespeito mútuo e com o povo chegou a tal ponto que o partido resolveu, ao invés de coligar com qualquer dessas correntes, oferecer uma alternativa à população lançando um candidato que reúna os requisitos de competência, moralidade e confiabilidade para que o povo, se quiser, mude a história de Roraima, reescrevendo o seu próprio destino.

O partido estuda vários nomes, dentre os quais o da Senhora Esperança, se ela aceitar, já que anda muito ocupada em tentar convencer o povo de que a Senhora Dura Realidade pode ser mudada. Esperança já decidiu que quer participar na construção de uma utopia, um lugar onde todos comam, morem, vistam, estudem e riam sem precisar para isso serem humilhados, batidos, vilipendiados, mas ainda não sabe a que cargo se candidatar. Não sabe se quer ou se não quer ser governadora. Havendo acordo, porém, poderá, se encontrar possibilidade de apoio para as mudanças, entrar na disputa pelo governo do Estado.

O PS está aberto a coligações com outros partidos de idealistas no sentido de unificar a candidatura alternativa, evitando dispersão de voto. Indagado sobre recursos para a campanha, o Presidente do PS disse que a ausência de recursos será a arma da campanha, afinal, pergunta: os que dispõem de recursos tiraram o dinheiro de onde? E responde: do povo para enganar o povo. Por outro lado, quem sonha não precisa vencer, precisa disputar. Se ganhar melhor. Se não ganhar, continua sonhando, porque em sonho o nosso é um mundo de gente feliz. Quem tem sonhos, constrói sua realidade num ambiente sempre favorável. Quem só tem realidade, é vizinho do sofrimento.

Quanto mais sonhos sonhamos mais melhoramos a realidade. A realidade, quando só, é dura, dolorida, pesada, lacrimosa, é só queixa. Mas quando acompanhada do sonho é alegre, suporta a dor, na expectativa de dias melhores que virão. A senhora Esperança, por ser a última que morre, vive num mundo ainda mais distante, quer que todos sejam felizes, é tão etéreo que precisa ser chamada ao mundo dos sonhos, que é mais próximo da realidade. Mas há momentos tão ruins que a Esperança é necessária, para nos elevar a crença; para nos ajudar a subir as escadas do inferno, na tentativa de sair do fundo do poço; a nos lembrar que, sendo todos iguais, podemos nós mesmos mudar a realidade adversa, sem esperar salvadores; a nos fazer acreditar que a mudança está em nós, dentro de nós e por nós deve ser realizada.

Roraima está como o grego Diógenes que, desiludido, à noite, andava pelas ruas com uma lanterna a procura de um homem de respeito. Aqui, nós procuramos um candidato. Desde a sua origem, Roraima é governado pelas mesmas idéias atrasadas, com poucos momentos de lucidez. Não temos base territorial; a economia gira em torno dos cofres públicos; o emprego é no governo e precário; os concursados ganham pouco; a administração é centralizada, as finanças passam por uma só pessoa; o clientelismo corre solto, o mérito é estar no rodapé da dignidade; as autoridades não têm autoridade; a suspeita de corrupção está na cabeça de todos; o beija-mão é um método de galgar melhores lugares, a humilhação pública de subordinados é notória; enfim, tudo que já deixou de se praticar a muito tempo nos lugares de progresso, aqui é a regra.

Entretanto, nem tudo está perdido. Aliás, nunca está tudo perdido. É preciso crer. A crença é alimento que vivifica. Existe uma luz já acesa para o futuro. Vem aí uma fornada de jovens com pensamento crítico apurado, com capacidade de discernir, pensar e compreender que o modo de governar Roraima está equivocado, porque visa a pessoas determinadas, realiza sonhos individuais. Forma-se uma mentalidade nova nas faculdades de Roraima, lugar de fabricação diária de sonhos, que hoje já conta seus egressos e estudantes em dezenas de milhares. São pessoas que já estão no mercado de trabalho ou nele ingressarão em breve, que sabem que o futuro não se localiza no agora, é objeto de construção permanente e não dispensa os valores morais. Já sabem que o "eu" deve se transformar no "nós". Decerto buscarão no esforço pessoal e no relacionamento respeitoso e limpo a construção dos seus sonhos individuais, tendo em conta e respeitando o esforço alheio. Não colocarão o pescoço debaixo do pé de ninguém, materializarão o princípio da dignidade humana, respeitando-se a si mesmos e, por conseqüência, aprendendo a respeitar os outros. É o que deles se espera.

*Mestre em direito, magistrado aposentado, professor universitário e advogado - E-mail: [email protected]
 

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