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Por um país melhor - Almir Sá

E, ao contrário do que determina a lógica, o que vemos é a sensação de que, pelo menos estando bem a economia, alguma coisa se salva. Mas para quem? Apenas o sistema financeiro colhe os frutos dessa estabilidade artificial, forjada à custa dos juros mais altos do planeta, de arrocho fiscal para produzir superávit que, além de ridículo, não é nem de longe suficiente para cobrir o pagamento de juros da dívida pública, de meta de inflação que retira o crédito de quem quer investir e premia aqueles que especulam.


Brasília - Pode parecer estranho ocupar a tribuna da Câmara dos Deputados para chamar à responsabilidade homens públicos ciosos de seus deveres, mas a verdade é que precisamos fazer um mea culpa. A sociedade brasileira não entende mais o verdadeiro papel do Congresso Nacional, na medida em que parece incapaz de se dissociar dos escândalos que atingem toda a Esplanada, que não é capaz de dar seguimento a importantes projetos em tramitação, que não conseguiu até agora votar o Orçamento Federal para o ano corrente e sequer aprovou a tempo o novo salário mínimo.

Estamos sufocados pela inércia, pelo corporativismo partidário e pelas disputas internas que só engessam a capacidade daqueles que, diante de tantas frustrações, ainda conseguem manter a disposição para fazer deste um País melhor. Já disse que, num ano eleitoral como este, seremos cobrados nas urnas. É certo que a renovação na composição do Parlamento sempre será salutar para a democracia mas, diante disso, o que vemos parece ser a estratégia do salve-se quem puder.

Num País que precisa urgente de reformas estruturantes, que almeja definir estratégica posição no mundo, salvar a própria pele, tanto aqui quanto no Executivo, configura-se cada vez mais como a causa primeira da quebra do compromisso que assumimos com os eleitores e com o Brasil.

Seria conveniente falar da crise moral, ética e de liderança que grassa em Brasília e repercute País afora. Seria conveniente falar da decepção não apenas do trabalhador comum, vampirizado por injustificável carga tributária, mas também de todos nós que acreditamos poder contribuir para a redução da miséria, para a construção da igualdade social, para a geração de riquezas que pudessem chegar até aos menos privilegiados.

E, ao contrário do que determina a lógica, o que vemos é a sensação de que, pelo menos estando bem a economia, alguma coisa se salva. Mas para quem? Apenas o sistema financeiro colhe os frutos dessa estabilidade artificial, forjada à custa dos juros mais altos do planeta, de arrocho fiscal para produzir superávit que, além de ridículo, não é nem de longe suficiente para cobrir o pagamento de juros da dívida pública, de meta de inflação que retira o crédito de quem quer investir e premia aqueles que especulam.

Chegamos ao fim de mais um mandato. Que avaliação podemos fazer desta Legislatura? Que resultados podemos levar aos nossos eleitores? Quão melhor estará o Brasil ao fim destes 4 anos de trabalho duro, penoso e incansável? Imagino que essa seja também a preocupação de muitos parlamentares. Gostaria que assim fosse, porque, certamente, seremos cobrados.

Façamos uma análise: em julho de 2003 fomos apresentados a expressão que refletia a mistura de promessa e esperança. Seria o espetáculo do crescimento. Por trás dessa frase, havia redentora história. Após anos de sacrifício e de timidez econômica, de aperto fiscal e de contenção de investimentos, o País finalmente deslancharia rumo a uma nova era, com mais dinheiro, mais emprego e mais progresso. Três anos depois, continuamos todos na platéia, e o espetáculo não começou. Ao contrário, o Governo esperou o carnaval para minimizar o impacto do anúncio de que o País cresceu 2,3%, em 2005 - o que dá ao Governo Lula crescimento médio anual de 2,6%.

Não há muito o que acrescentar diante do fato de a China ampliar seu PIB em 10% todos os anos. Mesmo a Argentina avançou 9% no ano passado. A Rússia, que saiu de uma moratória recente, cresceu mais de 6%. É humilhante perceber que a economia brasileira só cresce mais que o Haiti - e ainda há quem espere sentado o início do tal espetáculo.

Com crescimento pífio e metas de superávit fixas, de onde virá o dinheiro para realizar obras de infra-estrutura, estradas sem buracos e sem pedágios exorbitantes, silos de armazenagem de grãos? De onde virá recursos para revitalização de rios, melhores escolas e hospitais, salários e aposentadorias dignas?

O mercado internacional tem dinheiro sobrando à procura de países atraentes para investir. Todos os países estão competindo pelos investimentos produtivos, e o Brasil não pode perder tempo. Perdemos porque não foram feitos os investimentos necessários para evitar novos surtos de febre aftosa; porque as estradas, portos e ferrovias sem manutenção aumentam em 30% o preço final de nossos produtos no mercado externo; porque câmbio, os juros altos, a falta de crédito, tudo isso corrói a capacidade de investimento do produtor rural; porque é melhor colocar dinheiro no mercado financeiro e especular do que investir na produção, gerar emprego e renda para os trabalhadores e arrecadação para o Governo.

Em meio a tudo isso, ficamos aqui brigando contra o Planalto, e de lá eles tratando o Congresso, os representantes do povo, como marionetes.

Voltando a analisar os números, no conjunto, a economia mundial cresceu 4,3% no ano passado, exatamente 2 pontos percentuais acima da média brasileira. A diferença parece pequena, mas as aparências enganam. Quem costuma debater as taxas de crescimento em geral se debruça sobre as casas decimais. Uma diferença de um percentual por ano pode fazer a riqueza do País dobrar na metade do tempo - num prazo de 25 anos, não de 50. Por isso, é um verdadeiro desastre que o Brasil tenha completado 10 anos de desenvolvimento, desempenho econômico fraco, sempre atrás da média mundial. Se no ano passadotivéssemos ao menos repetido os números do resto do planeta, o Brasil teria irrigado a economia com algo em torno de 35 bilhões adicionais.

Percebemos claramente que mudou, portanto, a essência do debate sobre o futuro do País. O Brasil passou tempo demais vidrado no combate à inflação e na manutenção da estabilidade. A dívida já não mais émais externa, e, sim, interna, explosiva e extorsiva. Se a inflação não come mais o salário do trabalhador, temos os juros do cheque especial e as tarifas bancárias.

O que, afinal, está errado? Por que países pobres como a Índia e a China estão conseguindo erguer a cabeça e sair da miséria e não conseguimos crescer mais rápido?

O empresariado ficou assustado com a crise política do mensalão que, nos momentos mais dramáticos, gerou até o medo de um processo de impeachment do Presidente Lula. Tudo somado, o setor produtivo investiu menos do que tinha planejado no ano anterior.

Para muitos economistas e para o próprio Vice-Presidente da República, José de Alencar, o Banco Central também errou ao manter os juros a um patamar elevado por tempo demais. A política monetária apertada feita pelo Banco Centralno ano passado matou o crescimento. Seria surpreendente se o País crescesse mais rapidamente com uma taxa de juros tão alta.
Para completar o quadro cinzento, o nosso setor, a agricultura, que vinha adubando a economia, de tanto ser esmagado, quebrou. Houve quebra da safra de vários produtos e a desvalorização do dólar afetou o preço das mercadorias exportadas. Hoje o campo e o setor agropecuário amargam demissões e perdas de patrimônios pessoais.

Mas de todos esses problemas circunstanciais. A verdadeira causa da paralisia brasileira está na incapacidade de lidar com as questões mais difíceis; de eternamente empurrar com a barriga reformas que, independentemente de interesses políticos e de cores partidárias, são necessárias para todos; está, sobretudo, na insistência de ver o Estado como provedor de soluções, não como a raiz de problemas.

Recursos que poderiam ser aplicados no crescimento do País acabam eternamente tampando os buracos do Governo.

O Governo é muito grande, gasta mal e investe pouco. De cada 100 reais gerados no País, 38 vão para os cofres públicos na forma de tributos. Na China e na Índia, a carga tributária é metade da brasileira. Só países muito ricos tiram tanto de seus cidadãos mas, em compensação, garantem a oferta de serviços públicos de qualidade, o que decididamente não é o caso do Brasil.

A carga tributária brasileira, todos nós aqui sabemos, além de altíssima é distorcida. Os impostos são altos quer se gere renda ou não. Os que têm dinheiro guardado preferem aplicar em títulos do Governo, que dão boa remuneração para si e para os bancos, do que correr os riscos de investir em produção e pagar uma altíssima carga tributaria, seja direta nas mercadorias, seja referente aos encargos com trabalhadores.

É quase um consenso no País que o sistema tributário precisa ser refeito. Fernando Henrique Cardoso tentou, Lula também. Mas, no fundo, nenhum governante aceita abrir mão de arrecadação, seja para pagar juros, seja para alimentar a máquina pública. Por esta razão, entende-se outro dos grandes gargalos que impedem o crescimento econômico: embora arrecade muito, o Governo investe pouco, menos de 3% do PIB.

Brasília se esqueceu de que é preciso cuidar da infra-estrutura. Não há prova mais contundente do que a Operação Tapa-Buracos, tentativa de remendar as estradas que ficaram abandonadas até o momento.

O País fez uma opção: gastar mais com despesas correntes e menos com educação, saúde e transportes, e novas gerações vão se perdendo na esperança vã de que, um dia, desfrutarão dos benefícios de viver um país do futuro.

O agricultor brasileiro está quebrado. O Governo tem de tomar medidas imediatas e lançar uma medida provisória do bem voltada para a agricultura, no sentido de ajudar a recuperar o setor rural, que representa parte significativa das exportações brasileiras.

Além de haver necessidade urgente de reformas do Estado, o País também leva uma enorme desvantagem em razão de deficiências na área de educação. As estatísticas de investimento não incluem o capital humano,

Mas isso não quer dizer que ele não seja importante. Pelo contrário. Neste quesito, o Brasil está muito mal. Em testes matemáticos, de ciências e de leitura, os alunos brasileiros ficam muito atrás dos coreanos, mexicanos ou espanhóis. Num estudo recente, encomendado pela Confederação Nacional da Indústria, CNI, a educação foi apontada, ao lado da infra-estrutura e do ambiente institucional e regulatório, como uma das principais barreiras ao crescimento sustentado do País. Educação éum investimento de longo prazo, e o Brasil está muito atrás. É preciso acelerar!

O que o País ganha investindo em educação? Com mão-de-obra qualificada, ganha em produtividade, o que aumenta a geração de riquezas. No Brasil, a produtividade da indústria decresceu entre 2001 e 2003, segundo o estudo da CNI. Enquanto isso, na Coréia, país onde os alunos têm as notas mais altas, a produtividade aumentou 9% apenas em 2003, o maior aumento do mundo. Aqui o Governo tem investido em números e não em qualidade. O Brasil precisa crescer tanto ou mais que os demais países. Esse será o desafio do próximo Governo.

Em meu Estado, Roraima, a situação é tão desesperadora que milhares de pessoas, migrantes ou residentes, agricultores ou jovens com o segundo grau, não encontram caminhos e soluções para a geração de emprego e renda.

Desesperança se combate com Parlamento forte e bons políticos. Há anos luto por uma agricultura forte, uma educação mais eficaz e de boa qualidade.

Luto pela melhoria na saúde do meu Estado e do Brasil e pela qualidade do servidor público, em especial os servidores do Executivo e os militares, que percebem os salários mais aviltantes da história do nosso País. Luto pelo futuro das crianças, que têm direito à saúde, escola, lazer e emprego para seus pais. Luto por uma polícia que respeite o cidadão, o ser humano. Em suma, é preciso aumentar o volume de investimentos e melhorar a eficiência da alocação desses recursos.

Como o País pode crescer mais se o Estado drena 40% de todas as riquezas com impostos que transporta para gastos correntes? Existe algo profundamente errado nas contas públicas do Brasil. Aproveito para fazer um resumo de como caminham as contas do nosso Governo.

O Governo aumenta os impostos: em 1995, 28,2% do PIB; em 1997, 29% do PIB; em 2001, 33,5% do PIB; em 2003, 34%; em 2005, 37%. Além disso, gasta mais para manter a máquina administrativa: em 1995, gastávamos 14,8% do PIB; em 1997, 15,4% do PIB; em 1999, 16,1% do PIB; em 2001, 17,3% do PIB; em 2003, 16,9% do PIB; e em 2005, 18,8% do PIB para manter a máquina administrativa. Além disso, investe menos: em 1995, 0,6% do PIB; em 1997, 0,6%; em 1999, 0,4%; em 2001, 1,2%; em 2003, 0,4%; e, em 2005, 0,4%. Ou seja, um percentual ridículo perto da grandiosidade deste País. Esses dados são dos Ministérios do Planejamento e da Fazenda, do IBGE e do Banco Central.

Na verdade, este é um País altamente burocrático. Milhares de pessoas estão na informalidade, querem a formalidade, mas não conseguem. Há uma corrida de juros altos e do percentual abusivo da carga tributária.

É preciso que haja consciência do Governo para se buscar a viabilização dos impostos e a desburocratização das instituições. Devem ser estudadas medidas que façam com que o País cresça, assim outros estão crescendo, conforme citamos. Para isso, basta que tenhamos gestores públicos sérios, responsáveis, e que o Parlamento contribua para esse objetivo.

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