- 01 de novembro de 2024
Letícia Sander e Rodrigo Lopes Da equipe do Correio
Sob orientação do ministro da Justiça, Márcio Thomas Bastos, coube ao senador Tião Viana (PT-AC) a tarefa de livrar o ministro Palocci. A CPI afirma que os dados para redigir o mandado de segurança impetrado pelo senador foram solicitados ao Senado pelo Ministério da Justiça e o Palácio do Planalto. A ordem era fazer tudo para evitar que o caseiro confirmasse à CPI o que dissera em entrevista à imprensa - que Palocci freqüentava a mansão alugada em Brasília por um grupo de ex-assessores na prefeitura de Ribeirão Preto (leia mais na página 3), ao contrário do que sustentou até agora o ministro. Tião Viana entrou com o mandado de segurança no STF pouco antes do horário marcado para a CPI começar a ouvir o caseiro. Enquanto a resposta do Supremo não chegava, o presidente da comissão de inquérito, senador Efraim Moraes (PFL-PB), se apressou em dar início ao depoimento, que só durou 40 minutos. Exatamente as 14h08, a senadora Ideli Salvatti (PT-SC) tentou impedir o avanço da sessão, anunciando que a decisão do STF havia sido proferida. "Esta mesa não foi notificada", reagiu Efraim, tirando a palavra da senadora, que reagiu aos berros. O senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT) reclamou. "Quase 42 anos depois (da ditadura), o STF tenta calar o Congresso. Isso não é bom para a democracia brasileira". Eram 14h12 quando Efraim anunciou que estava suspendendo a sessão. Leu a decisão do ministro Peluso aos colegas e lamentou a atitude de Viana, de recorrer ao tribunal. "Com essa decisão, o Senado fica menor. A decisão tira poderes do Senado. Estamos buscando a verdade que a sociedade cobra", afirmou o pefelista. Tião Viana alegou que a CPI tentava expor a vida pessoal do ministro. Francenildo, muito à vontade durante o tempo em que pôde falar, deixou a sala da CPI aplaudido pela oposição. Assessores e curiosos que assistiam ao depoimento gritavam: "Parabéns, parabéns". Oposição reage A oposição reagiu com indignação e prometeu tentar reverter a decisão do STF. O senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) afirmou que dará entrada em uma proposta de emenda à Constituição (PEC) limitando a ingerência do Judiciário nos trabalhos do Legislativo. "Considero esse o fato mais grave já ocorrido desde a ditadura militar. O autor da liminar não é um mau juiz, mas cassar o depoimento de uma pessoa porque compromete um ministro do governo é atender a pedidos de favores do presidente da República". O relator da CPI, senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), avaliou que, à primeira vista, a decisão cerceou a liberdade da CPI. "Esta decisão, a meu ver, não tem a ver só com o Francenildo. Ela cerceia as atividades da CPI. E não podemos abrir mão de determinadas prerrogativas", afirmou. Além de atividades relacionadas aos Bingos, a CPI investiga acusações de corrupção contra Palocci e o assassinato de Celso Daniel, o ex-prefeito petista de Santo André. Aliado do governo, o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), aparentemente compactuou com a estratégia de tentar limitar as investigações da comissão. Horas depois da polêmica, prestigiou Tião Viana, enviando-lhe para representar o Senado na cerimônia de posse do mais novo ministro do STF, Enrique Lewandowski. Questionado por jornalistas a respeito da polêmica, Renan foi dúbio: "Se for preciso recursar, vamos recursar. Farei isso com satisfação. Mas é importante lembrar que esta CPI foi criada por decisão do STF. E se ela tem poder judicante, tem que se ater ao processo legal". Os petistas ficaram isolados na defesa do STF e de Viana. "Esta CPI não tem nenhuma isenção, perdeu a credibilidade há muito tempo. Não dá para investigar nada neste palco de proselitismo e demagogia dos senadores. Esta comissão virou uma inquisição contra o governo Lula", afirmou o líder do PT na Câmara, Henrique Fontana (RS). O ministro Peluso, após a posse no STF, alegou ter determinado a interrupção do depoimento, sem pedir explicações aos parlamentares, porque ele já estava em curso. E afirmou: "Juiz que não consegue conviver com críticas tem que deixar de ser juiz". Nomeado em 2003 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Peluso é casado com a consultora jurídica do Ministério da Justiça, Lúcia de Toledo Piza Peluso. Colaboraram Ugo Braga e Sandro Lima |
MEMÓRIA A crise do terreno Em 9 de outubro de 2005, uma reportagem do Correio revelou que três dos cinco assessores do ministro Cezar Peluso, à época, trabalharam no escritório do advogado Brasil do Pinhal Pereira Salomão. Palocci, quando era prefeito de Ribeirão Preto (SP), tentou legalizar a situação de um terreno invadido, segundo a Justiça, por Brasil Salomão. Hoje, o terreno abriga o escritório de Salomão, um dos mais luxuosos da cidade. Os assessores de Peluso à época eram Heloísa Estellita, Aldo de Paula Junior e Roger Galino. Segundo a reportagem, o então prefeito Palocci tentou solucionar o caso do terreno com um acordo proposto pelo próprio Salomão. Mas a Justiça se negou a homologar o acordo. O juiz Ricardo Braga Monte Serrat escreveu: "Salta aos olhos o absurdo de tal acordo, pois, por intermédio dele, não alcança a administração proveito algum". À época, a assessoria do STF informou que Heloísa Estellita foi convidada a integrar o gabinete de Peluso em 2003. Os outros dois advogados teriam sido convidados por ela para ocupar os cargos. Heloísa e Aldo já deixaram o gabinete. Heloísa foi trabalhar com advogados da Leão Leão, a empresa acusada por fraudes na gestão Palocci em Ribeirão. Só Roger Galino continua trabalhando com o ministro Peluso. Ontem, questionado a respeito da proximidades de seus assessores com Palocci, Peluso afirmou: "É mentira que eu tenha três assessores de Ribeirão. É uma falsidade. Só tenho um funcionário de Ribeirão, e acho que ele nem conhece o Palocci. Que eu saiba, não é crime nascer em Ribeirão". |