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A comédia da verticalização - Vinícius Motta

Fora disso, o STF estará inapelavelmente fulminando o espírito da anualidade. Toda e qualquer mudança, miúda ou graúda, que seja conveniente à maioria parlamentar poderá ser instalada na véspera do pleito, bastando que seja inscrita na Constituição. A eleição ficará sujeita a distorções graves.


Há muita trapalhada na disputa acerca de que regra de aliança partidária o Brasil deve seguir. Interesses, decisões e argumentos se contrapõem em torno da chamada verticalização: a necessidade de as legendas respeitarem, nas disputas para governos estaduais, os acordos firmados para concorrer à Presidência da República. Vamos aos dois principais passos em falso nesse tema:

1. A reforma jobimiana. Em fevereiro de 2002, o Tribunal Superior Eleitoral resolveu reformar a política. Presidia o órgão o ministro Nelson Jobim, entusiasta de longa data de engenharias institucionais. Respondendo a indagação do deputado Miro Teixeira, o colegiado inventou a verticalização. O dispositivo não estava expresso em lei nenhuma. Algo que produza tal constrangimento à liberdade dos partidos só deveria valer se não houvesse dúvida de que essa seria a vontade da maioria dos legisladores. Mas o TSE rompeu seu padrão de conduta liberal e impôs tutela de inspiração varguista às legendas quando faltavam oito meses para o pleito.

2. O casuísmo de 2006. Após a verticalização ter sido instaurada pelo Judiciário, os parlamentares tiveram três anos e sete meses para produzir uma lei explicitando a regra de alianças que valeria na rodada eleitoral de 2006. Tendo calado sobre o tema nesse prazo, consentiram a repetição da norma que regeu a disputa em 2002. Surgiu, porém, uma malandragem para tentar driblar o dispositivo constitucional da anualidade (lei que altere o processo eleitoral não se aplica no pleito que ocorra até um ano da data da publicação do diploma). O Parlamento derrubou a verticalização não por meio de uma lei ordinária, mas aprovando uma emenda à Constituição. O nome da manobra é casuísmo, ainda que tenha vindo travestida de reescritura da Carta.

Agora, se não quiser disparar o terceiro tiro n'água nessa história, o Supremo Tribunal Federal tem um único caminho a seguir: ordenar que a nova regra liberando as alianças não seja aplicada neste ano, mas apenas em 2010.

Fora disso, o STF estará inapelavelmente fulminando o espírito da anualidade. Toda e qualquer mudança, miúda ou graúda, que seja conveniente à maioria parlamentar poderá ser instalada na véspera do pleito, bastando que seja inscrita na Constituição. A eleição ficará sujeita a distorções graves; e a Carta, a acumular penduricalhos irrelevantes que respondem apenas a humores políticos de ocasião.

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