- 01 de novembro de 2024
A falta de confiança na Justiça brasileira é fato plausível, a ponto de despertar estudos e mais estudos. E não sem razão. Ela própria faz questão de se pôr nessa situação. O seu mandatário-mor, o ministro presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, concedeu pareceres vários eivados de tendência pró-governista. Descaradamente.
No último deles, negou pedido da CPMI dos Correios para a quebra de sigilo fiscal de Paulo Okamoto, presidente do Sebrae e amigo pessoal do presidente Lula. Amigo do tipo que lhe pagava as contas particulares - ainda que com recursos de origem desconhecida.
Justiça, aliás, é artigo de luxo para os simples mortais. Além da morosidade, quase sempre o altíssimo preço desencoraja quem se sente lesado em seus direitos. Aqueles que dispõem de dinheiro para pagar advogados matreiros - todos muito caros, por sinal - podem contar com alguma chance. Quem não tem, vê-se na iminência de tirar no braço as diferenças com seus desafetos, apesar de não deixar de ser atitude condenável fazer justiça com as próprias mãos.
A Justiça, tal como é hoje, abre longa e bem pavimentada estrada para quem não quer se submeter a ela. O servidor público, por exemplo, ganha uma causa contra a instituição a que serve - em qualquer âmbito, federal, estadual ou municipal. Pensa que vai receber o que lhe é devido. Afinal, o seu direito foi reconhecido. Puro engano. A entidade perdedora recorre uma, duas, tantas vezes necessárias, a ponto da ação se perder num intrincado labirinto, demandando anos e anos sem que nada se resolva.
Este é o caso dos precatórios da Prefeitura Municipal de Boa Vista. Nessa ação a Prefeitura de Teresa Jucá foi condenada ao bloqueio dos recursos por várias vezes. Mas só em tese. Remédios jurídicos imediatos permitiram o desbloqueio e tudo continuou navegando em céu de brigadeiro. Como se nada tivesse ocorrido. Muita gente já morreu sem ver a "terra prometida".
Lamentável que a Justiça seja cega de pai e mãe em alguns casos. Já em outros, enxerga e muito bem, especialmente quando estão em jogo vantagens financeiras de seus membros. A Reforma da Previdência está aí para mostrar que o país tem duas categorias de servidores públicos. De um lado, a grande maioria que desconta um valor. De outro, a categoria dos magistrados, que desconta um segundo valor, é claro, bem menor que o dos demais.
Infelizmente, não se pode negar que a Justiça, em sua versão mais altruísta, fica restrita a uma pequena casta, detentora de alto poder aquisitivo. A Justiça não sobe morros nem se estabelece em favelas. Nesses locais impera a lei do mais forte, decretada pelos mandatários do tráfico.
São os barões da droga que decretam o feriado geral. O comércio e demais atividades obedecem piamente. Baixam as portas sem questionar. Afinal, são eles que fundam escolas e montam postos de saúde em suas zonas de jurisdição. O poder público se diz impossibilitado de prover tais ações. Faltam-lhe recursos. Mas sobram para pagar mensalão, mensalinho, superávit nos balanços bancários e "otras cositas mas".
É nesse caldeirão de injustiça que nos vemos metidos. A impunidade, de tanto grassar no dia-a-dia, remete para a mais espúria das saídas: zerar as diferenças no braço, no meio da rua.