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Cara, lenta e, às vezes, parcial

Pesquisa realizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros aponta os principais problemas da Justiça e identifica o STF como o tribunal com a menor agilidade no andamento dos processos.


Lilian Tahan
Da equipe do Correio

Wanderlei Pozzembom/CB/27.1.99
 
A Justiça brasileira é ineficiente. E quem pensa assim são os próprios juízes. A avaliação faz parte de uma pesquisa inédita realizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que ouviu 3.258 integrantes do Poder Judiciário. O levantamento, apresentado ontem na sede da AMB, com a presença do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Nelson Jobim, revelou, por exemplo, que praticamente metade dos juízes entrevistados considera ruim ou muito ruim o quesito agilidade no andamento de processos. O número de juízes críticos às custas processuais é três vezes maior do que os magistrados que avaliaram bem esse item. E um terço da categoria colocou em prova a imparcialidade no STF.

Para os juízes, os maiores problemas de agilidade são constatados no STF. Entre os entrevistados, 45,3% consideram que a lentidão é mais percebida quando os processos se encontram na instância máxima do Judiciário. Com relação às custas processuais, 44,1% dos magistrados apontam a Justiça Estadual como campeã dos problemas. E boa parte dos entrevistados deixou claro que desconfia de decisões, quando o caso está no STF. Isso porque a diferença entre os que dizem ser ruim a imparcialidade no Supremo é três vezes maior se comparada, por exemplo, à Justiça Federal, Estadual e Militar.

Nelson Jobim avalizou a pesquisa da AMB, mas se mostrou reticente às críticas feitas ao Supremo. "A pesquisa tem o mérito de ser feita por uma instituição de dentro do Poder Judiciário. Temos a tendência de menosprezar os outros levantamentos ao afirmarmos que suas conclusões sobre o Judiciário não são verdadeiras por não entenderem o sistema", afirmou. Mas, ao ser perguntado especificamente sobre a avaliação do Supremo, Jobim respondeu que os apontamentos precisam ser analisados melhor.

Na opinião do presidente da AMB, Rodrigo Collaço, a pesquisa reflete o desejo de mudança da magistratura. "Os juízes reconhecem que a lentidão é um dos principais problemas do Poder Judiciário, mas ao mesmo tempo o levantamento demonstra um desejo de mudança", interpreta. Collaço diz isso com base em dados da mesma pesquisa que aponta a redução da possibilidade de recursos aos tribunais superiores como uma sugestão dos juízes para resolver o problema da morosidade. Quase 90% dos magistrados se mostram favorável à medida. Apenas 7,5% dos entrevistados se disseram contrários à proposta.

Os juízes também emitiram opinião sobre temas debatidos pela reforma do Judiciário. Parcela considerável dos entrevistados (85,6%) propôs transformar o STF em Corte Constitucional, o que limitaria a atuação do órgão nos assuntos ligados à Constituição, transferindo as demais competências para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Outros 75,6% demonstram desejo por instituir a Súmula Impeditiva de Recursos para decisões do STJ e TST, o que significa que quando houver ação a respeito de assunto cujo entendimento já estiver superado por esses tribunais, automaticamente terá de ser aplicado o entendimento da corte superior.


Avaliação

48,9% dizem que a agilidade no Poder Judiciário é ruim
40,9% têm avaliação negativa quanto às custas processuais
31,7% consideram ruim o Judiciário em termos de imparcialidade


Reprovação ao governo

O Judiciário não aprova o governo do presidente Lula. A maioria dos juízes que participou da pesquisa realizada pela AMB avaliou negativamente as políticas econômica e social implementadas pelo Executivo. Seis em cada 10 entrevistados consideram ruim a área social do governo. A política econômica foi criticada por mais de um terço da magistratura. A opinião dos juízes também demonstrou distanciamento entre o Executivo e o Judiciário. Na opinião de 59,8% dos magistrados, a relação entre as duas esferas de poder é ruim.

Mas esse índice cai a menos da metade quando os interlocutores passam a ser o governo e o Supremo. A relação com o Congresso também é considerada crítica para 42% dos avaliadores. Na esteira do que é visto como deficiente pelo Judiciário também aparece a agenda de reformas. Mais de 60% dos participantes disseram que ela é ruim e apenas 5,6% mantiveram posição contrária.

Rodrigo Collaço, da AMB, avalia que os números da pesquisa revelam sintonia fina entre o que pensa a magistratura e o senso comum. "Quando uma pessoa não tem saúde, não tem educação, não tem transporte, ela bate à porta do Judiciário que, dessa forma, passa a ser espectador da falência das políticas públicas", afirma.


Contra o nepotismo

Os juízes são contra empregar parentes. A conclusão está na pesquisa divulgada ontem pela AMB. O nepotismo foi criticado por 67,9% dos magistrados que participaram do levantamento. Os mais intolerantes com a prática são as mulheres e os juízes com menos de cinco anos de magistratura. Os mais velhos se mostraram mais complacentes com o emprego de parentes. No próximo dia 6, o Conselho Nacional de Justiça julgará pedido de providência formulado pelo Colégio Permanente de Presidentes dos Tribunais de Justiça, que entrou com ação contra a resolução do CNJ proibindo o nepotismo no Judiciário.

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