- 06 de novembro de 2024
Fernanda Odilla Da equipe do Correio
O ofício assinado por Sandra Lia foi distribuído aos 24 procuradores-chefes do Trabalho de todo o Brasil com cópia do formulário na semana passada. Nele, a procuradora solicita que cada um dos servidores declare a matrícula, a função, o local onde exerce suas atribuições e se tem parentes no MPU. "Primeiro divulguei um e-mail a todos, para conhecimento informal", diz a procuradora, que ainda guarda dúvidas com relação à resolução. Ela explica que em São Paulo foram constatados dois casos de nepotismo que podem ser questionados. Um deles, a servidora já trabalhava no MPT quando o irmão passou no concurso para procurador. E o outro é o casamento entre um procurador e um servidor, que já trabalhavam juntos antes do matrimônio. "Vamos fazer uma consulta no Conselho Nacional para evitar injustiças", diz Sandra Lia, dizendo desconhecer casos de nepotismo na Casa. A procuradora, contudo, não considera nepotismo a nomeação de parentes de servidores e de funcionários sem vínculo que já ocupam cargo de confiança. "O nepotismo que foi proibido é o de parentes de procuradores", avalia Sandra Lia. A análise da resolução da procuradora é questionada pelo presidente do Sindicato Nacional dos Servidores do Ministério Público da União (Sinasempu), Luiz Ivan Cunha Oliveira. "É claro que parente de servidor nomeado pode ser considerado nepotismo. É um caso de nepotismo indireto", observa Luiz Ivan, que encaminhou, no início de outubro, ao procurador geral Antônio Fernando de Souza, relatório confidencial de 23 páginas recheado de casos de nepotismo e nomeações irregulares em diferentes estados do Brasil. Entre os casos listados, o de nomeações de parentes de pessoas que ocupam cargos comissionados no MPU. Briga antiga Mas o próprio Luiz Ivan acredita que o maior problema não está no MPT. A procuradora Sandra Lia completa que casos de nepotismo são mais freqüentes em algumas unidades do Ministério Público de estados. Na Justiça do Trabalho, a briga contra o nepotismo é antiga. Em 2001, foi deflagrada uma campanha nacional para acabar com a prática em toda Justiça do Trabalho, investigando casos nos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs). Foram localizados, em apenas sete tribunais, 51 casos de nepotismo. Todos estes casos foram denunciados ao Tribunal de Contas da União, que a partir da iniciativa da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), tem realizado auditorias nos TRTs para descobrir outros casos existentes. |
PENTE-FINO Servidores sem vínculo com cargo de confiança no MPU Ministério Público Federal - 460 Ministério Público do Trabalho - 103 Ministério Público Militar - 5 Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - 9 Fonte: ASMPF/Sinasemp/Sindjus/MPT |
para saber mais Proteção familiar A origem da palavra nepotismo está longe de ser consenso entre lingüistas e historiadores. Há quem diga que vem de "nepote", que significa sobrinho. Historicamente, tudo teria começado no Renascimento, por ação da Igreja Apostólica Romana. Os papas e outras autoridades eclesiásticas, por não terem filhos, costumavam proteger seus sobrinhos dando a eles cargos importantes. Mas há quem garanta que a palavra deriva de nepos, uma espécie de escorpião, cujas crias, assentando-se sobre o seu dorso, devoravam-no pouco a pouco. Representa assim uma forma impura de governo, na qual os governantes visam tão somente o bem particular próprio e dos parentes. A prática passou a ter uso indiscriminado, invadiu o Executivo, o Legislativo, o Judiciário e o Ministério Público e hoje começa a ser combatida com resoluções de conselhos de classe e projetos de lei. |
À procura de irregularidades
O integrantes do Sindicato Nacional dos Servidores do Ministério Público da União (Sinasempu) estão empenhados em descobrir todo e qualquer tipo de nomeação irregular. "Vamos provar que o MPU está desrespeitando a divisão de cargos e funções comissionadas. Além do nepotismo, tem muito contrato irregular e imoral", avisa o presidente da entidade, Luiz Ivan Cunha Oliveira, autor do relatório que indica a contratação irregular de mais de 136 pessoas em diferentes estados do Brasil, somente nos primeiros dez meses deste ano. No documento, entregue ao procurador-geral Antônio Fernando de Souza, está ainda o caso de 26 funcionários reprovados no último concurso que conseguiram trabalho por indicação de procuradores. Seis deles estão na Procuradoria Geral da República no Distrito Federal, de acordo com o Sinasempu, cinco em São Paulo, cinco em Pernambuco, quatro no Rio Grande do Sul. "Alguns deles estão ocupando funções exclusivas de servidores concursados", argumenta Luiz Ivan. O sindicalista entregou ontem ao Conselho Nacional do MP um ofício relatando as falhas do plano de carreira dos servidores da instituição. Para representantes das entidades que defendem a classe e se mostram contra a proposta, o plano de carreira vai oficializar a distribuição de todos os tipos de cargo a pessoas sem vínculo com o serviço público. A secretaria-geral do MPU argumenta que desconhece qualquer tipo de nomeação irregular, mas que está averiguando as irregularidades apontadas pelo Sindicato. O secretário-geral do MPF, Carlos Frederico Santos, afirma que a instituição cumpre a lei, que prevê o limite de 30% de funções e cargos comissionados a pessoas sem vínculo. Quanto à atual minuta do plano de carreira, a administração do MPU diz que se o plano fosse aprovado hoje, seriam 1820 funções de confiança exclusivas aos servidores de carreira e 887 cargos em comissão, dos quais metade ficaria com funcionários concursados do MPF. Para o secretário-geral, os representantes dos servidores são contra a implantação gradual do plano de carreira. Carlos Frederico diz que o impacto financeiro do plano pode violar a lei de responsabilidade fiscal, se implantada de uma só vez. Por isso, a previsão é de cinco anos, para diluir o impacto estimado em R$ 498 milhões. (FO) |