Crônica do Aroldo - A GARANTIA

Ele é desses médicos à antiga: empenha-se em conhecer a fundo o paciente; uma consulta com ele não leva menos de quarenta minutos. Psiquiatra conceituado e atencioso tenta viajar pela alma dos seus pacientes. Toda a sua via acadêmica foi financiada com árduo trabalho como rádio-técnico numa eletrônica de terceira categoria. Aliás, eletrônica sempre foi a sua paixão.

Ao final de tarde numa sexta-feira, doutor Jack Areh, nosso médico, entrou numa mercearia e deu de cara com João Caporal que há algum tempo, numa crise maníaco depressiva, tinha feito uso de seus serviços. Durante conversa informal, o psiquiatra notou que a senhora que acompanhava seu antigo paciente tinha o olhar perdido no espaço e agia como um robô.

- Quem é esta senhora que está com você? - Perguntou. Ao saber que era dona Ambrozina, mãe de Caporal, ficou deveras preocupado e assuntou:

- Sua mãe não está bem... Vejo que ela está apática..., perdida... O quê que tá acontecendo com ela?

- Ah, doutor Jack Areh..., mãeinha tem me preocupado muito... Sua vida não tem sido fácil... Derna o início do ano ela tem levado tanta porrada que azuretou... Em fevereiro, painho teve um enfarte e bateu a caçuleta... No início de março minha irmã, Edilzanete, morreu na mesa de parto...; o menino dela, Desmoine Jerry, sobreviveu, mas morreu três meses depois: caganeira... Os pessoal diz que foi infecção hospitalar... De lá pra cá mãeinha ficou assim, meio alesada... Ela fala muito pouco..., esquece de tudo..., não sorri... Ela tá só sendo levada pela vida...

Doutor Jack Areh dirigiu-se àquela senhora e, depois de muitas perguntas e considerações sacou o receituário, escreveu algo naquela caligrafia que nem os médicos conseguem ler, chamou Caporal, entregou-lhe a receita, colocou a mão em seu ombro e falou usando o linguajar dos técnicos em eletrônica:

- Olha, Caporal, eu vou curar a sua mãe... Ela vai tomar estes medicamentos aqui da receita e eu garanto que em uma semana o seu comportamento vai mudar completamente... Eu dou garantia: se a velha não sarar nesse espaço de tempo, pode trazê-la de volta que o defeito deve ser noutro circuito integrado e nós vamos fuçar até descobrir... Eu garanto que a velhinha vai ficar tinindo.