- 12 de novembro de 2024
Cristiane Jungblut
BRASÍLIA
Tenso e abatido, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez ontem um pronunciamento de dez minutos à nação para dizer que se sente "traído e indignado" com as denúncias envolvendo o PT e parte do governo, afirmando que não sabia dessas "práticas inaceitáveis". Em seu discurso, o presidente não citou o deputado e ex-chefe da Casa Civil José Dirceu (PT-SP) e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, nem qualquer nome dos que o teriam traído. Também não se referiu diretamente às revelações sobre o uso de caixa dois por seu partido, mas, no fim do discurso, afirmou que PT e governo têm obrigação de pedir desculpas ao povo brasileiro.
- Quero dizer a vocês, com toda a franqueza: me sinto traído. Traído por práticas inaceitáveis das quais nunca tive conhecimento. Estou indignado pelas revelações que aparecem a cada dia e que chocam o país - disse Lula, na abertura da reunião ministerial na Granja do Torto.
O presidente pediu que a população não perca a esperança e continue acreditando nele.
- Quero dizer a vocês: não percam a esperança. Sei que vocês estão indignados e eu, certamente, estou tão ou mais indignado do que qualquer brasileiro. E tenho certeza de que posso contar com o povo brasileiro - disse, acrescentando estar consciente da gravidade da crise política.
Lula ainda manda recado à oposição
Num recado à oposição, Lula ressaltou que a crise política não pode afetar o bom desempenho da economia. E pediu que os ministros trabalhem mais para impedir a paralisia do governo.
- É obrigação do governo e da oposição não permitir que essa crise política possa trazer problema para a economia. Temos que arregaçar as mangas - disse Lula.
O presidente começou o discurso falando das realizações de seu governo, sobretudo na área econômica. Disse ter certeza que o povo "sente a diferença" de seu governo, citando ações como a geração de 3,1 milhão de empregos.
No pronunciamento feito na reunião na Granja do Torto, Lula leu pausadamente o discurso, que vinha sendo preparado desde a véspera, quando o publicitário Duda Mendonça revelara ter recebido dinheiro de caixa dois pela campanha de 2002 e que os recursos foram pagos num paraíso fiscal a pedido de Marcos Valério, o empresário acusado de operar o mensalão. Em muitos momentos, o presidente pareceu estar pouco à vontade, olhando para baixo ou repetidas vezes para o alto. Apenas no fim, quando falou da necessidade de PT e governo pedirem desculpas, é que improvisou.
Olhando fixamente para a frente, onde estava a câmera de televisão que transmitia o discurso, Lula recorreu à primeira pessoal do plural para falar em desculpas:
- Queria, neste final, dizer ao povo brasileiro que não tenho nenhuma vergonha de dizer ao povo brasileiro que nós temos que pedir desculpas. O PT tem que pedir desculpas. O governo, onde errou, tem que pedir desculpas, porque o povo, que tem esperança, que acredita no Brasil, não pode, em momento algum, estar satisfeito com a situação que o nosso país está vivendo.
O começo da reunião atrasou três horas para que Lula se preparasse. Antes, seus assessores leram a entrevista do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, à revista "Época", afirmando que o presidente tinha conhecimento do acordo financeiro do partido com o PT.
"Estou consciente da gravidade"
No discurso, Lula disse que, se dependesse dele, todos os responsáveis já teriam sido punidos. Lembrou que afastou desde o primeiro momento os integrantes de seu governo envolvidos nas denúncias de um esquema de financiamento de campanha. Mas o presidente não citou o nome dos dirigentes petistas que o traíram e nem aqueles que foram afastados do governo, como o ex-ministro José Dirceu.
Ao falar da criação do PT, Lula garantiu que, na década de 80, fundou o partido para "moralizar as práticas políticas". E que não mudou seus ideais desde então.
- Estou consciente da gravidade da crise política. Ela compromete todo o sistema partidário.