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JUSTIÇA - Sob ameaça

Entidades de classe que representam magistrados e integrantes do Ministério Público não calculam a quantidade de ameaçados, vítimas de agressões físicas ou assassinatos. A Polícia Federal (PF), por sua vez, se limita a oferecer proteção para os que comprovarem correr risco de vida.


André Carravilla
Da equipe do Correio

Evelson Freitas/AE/29.6.05
Juiz Odilon de Oliveira, DE PONTA PORÃ (ms), é obrigado a viver no fórum, onde dorme no seu gabinete
 
Telefonemas anônimos, ameaças freqüentes e preocupações como a de não colocar em risco a própria vida e a da família fazem parte da rotina de profissionais habituados a conviver com o perigo. Parcela significativa dos juízes, procuradores e parlamentares brasileiros que dedicam a carreira ao combate à criminalidade tem que alterar a rotina para garantir a sobrevivência. Para esses profissionais, andar com escolta policial e repetir o menor número de vezes o trajeto de casa para o trabalho fazem parte do dia-a-dia.

Entidades de classe que representam magistrados e integrantes do Ministério Público não calculam a quantidade de ameaçados, vítimas de agressões físicas ou assassinatos. A Polícia Federal (PF), por sua vez, se limita a oferecer proteção para os que comprovarem correr risco de vida. Ao todo, de acordo com um delegado que não quis se identificar, 12 pessoas, entre juízes, procuradores, promotores e políticos andam sempre escoltados por dois agentes da PF. Os nomes não são divulgados por motivos de segurança. O custo do serviço gira em torno de R$ 70 mil por cabeça. O gasto inclui despesas com diárias, viagens e combustível das viaturas. Um dos que integra este grupo é o juiz Odilon de Oliveira, de Ponta Porã (MS), obrigado a viver no fórum da cidade depois de ameaças feitas por traficantes de drogas.

Na luta contra o trabalho escravo, o juiz trabalhista Jorge Vieira viveu um verdadeiro inferno. Há três anos, quando ainda morava em Paraopebas, no sul do Pará, era usual chegar no alojamento, oferecido pelo fórum para juízes titulares que não moram na cidade, e encontrar um bilhete ameaçador. Responsável por aplicar a maior multa da história do país, R$ 3 milhões, contra um fazendeiro que submetia os trabalhadores a situações degradantes de trabalho, Vieira ficou conhecido na região e quase pagou com a própria vida por dar sentenças contra fazendeiros.

"O nosso trabalho contrariava interesses. Fez com que o trabalho escravo deixasse de ser lucrativo. O fazendeiro não quer mais correr o risco de ser descoberto e ter que pagar uma multa", explica Vieira. Depois de viver dois anos acompanhado sempre por agentes da PF, ele foi transferido para Marabá, a 200 quilômetros de Paraopebas. A distância não pôs fim aos problemas. Há um mês, quando viajava para Belém em visita à mulher, o juiz teve o carro apedrejado por manifestantes orientados por um fazendeiro que estava em um carro de som e que reconheceu o veículo onde ele estava.

O procurador da república no Pará Ubiratan Cazetta coleciona histórias de colegas vítimas de ameaças e agressões físicas. "Sei de um procurador em Santa Catarina que teve o carro metralhado", relata Cazetta, 36 anos, que há nove anos deixou o departamento jurídico de um importante banco privado em São Paulo para viver no Pará. Casado com uma paraense, ele sabia quanto o estado era violento, mas nunca se deixou intimidar. "Olha, essa história de ameaças eu nunca levei muito a sério", conta o procurador que há dois anos, quando participava de uma investigação sobre o tráfico de drogas, recebeu um telefonema anônimo em que a pessoa perguntava se ele já havia providenciado a internação de um parente no hospital.

Risco constante
Em seu primeiro mandato como deputado federal, o padre Luiz Couto (PT-PB) já está familiarizado com a companhia de policiais. "Tenho seguranças desde 1997", conta o parlamentar que, na época, era deputado estadual e vivia escoltado por policiais militares.

Atualmente, a segurança do deputado é feita pela PF, que há três meses cogitou retirar a proteção, mantida por ordem do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. "Teve um parecer de um delegado da PF que defendia o fim da proteção, mas os agentes que me acompanham alertaram que seria um erro", argumenta.

Enquanto ainda estava na Paraíba e integrava comissões parlamentares de inquérito da assembléia estadual que apuravam denúncias de exploração sexual de menores e a atuação de traficantes no estado, Couto começou a receber ameaças. "Uma vez, estava dormindo, recebi um telefonema e do outro lado ouvi o barulho de uma rajada de metralhadora", conta o padre. Apesar de trocar o número de telefone várias vezes, não se livrou das ameaças.


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