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Emprego e empréstimo para ex-mulher; Valério confirma pagamento a Zé Dirceu

Marcos Valério afirma que Dirceu pediu financiamento ao Rural para Ângela Saragosa comprar imóvel, ex-mulher de José Dirceu. Ele também confirmou pagamento para o ex-ministro.


Josemar Gimenez
Da equipe do Correio

Patrícia Aranha
Do Estado de Minas

Paulo de Araújo/CB/16.6.05
José Dirceu não respondeu às novas acusações de Marcos Valério: deputado volta hoje a Brasília
 
O empresário Marcos Valério Fernandes de Souza começa a soltar parte da munição que diz ter contra o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu. As conversas que tem mantido com seus advogados nos últimos dias são pólvora pura, para usar a expressão do relator da CPI dos Correios, Osmar Serraglio (PMDB-RS). Logo depois da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003, a pedido de José Dirceu, Valério fez dois telefonemas para atender a interesses pessoais do ex-ministro. O primeiro foi para o presidente da Brasfrigo e principal acionista do BMG, Flávio Guimarães (pai de Ricardo Guimarães, principal executivo do banco), e teria como objetivo obter um emprego para uma das ex-mulheres de Dirceu, a psicóloga Ângela Saragosa, com quem o ex-ministro tem uma filha, Joana, de 16 anos. Ângela acabou sendo empregada na única agência do BMG na capital paulista, na Alameda Santos, 2.335, próximo à avenida Paulista.

O segundo telefonema de Marcos Valério foi para José Augusto Dumont, ex-presidente do Banco Rural, que morreu num acidente de carro em abril de 2004. Dessa vez, José Dirceu queria e conseguiu um empréstimo para comprar um apartamento para a ex-mulher, na região do Jardim Paulista, em São Paulo. O empréstimo - num valor acima de R$ 200 mil, segundo revela o publicitário a pessoas próximas - teria sido feito na agência do Rural na avenida Paulista. Ângela Saragosa pediu demissão do BMG assim que um outro empréstimo, do PT com o banco, foi revelado no mês passado. Dirceu, segundo interlocutores de Valério, chegou a falar pessoalmente com Flávio Guimarães sobre o emprego de Ângela. E foi atendido prontamente.

Logo que surgiram as suspeitas de envolvimento do Banco Rural no esquema do mensalão, a instituição publicou nota afirmando, entre outras coisas, que Marcos Valério era amigo íntimo do falecido José Augusto Dumont. A maior prova de que tem falado a verdade quando diz que todos os empréstimos contraídos com bancos foram feitos a pedido do PT, segundo Marcos Valério, é resumida numa frase que gosta de repetir: Como posso dever tanto dinheiro a um banco e não ser cobrado?. Segundo ele, os empréstimos somam R$ 55 milhões e não R$ 38,9 milhões como vem sendo noticiado. Banqueiro é tudo igual. Como posso dever uma fortuna dessas e não ser cobrado. Isso mostra que os bancos sabiam para quem estavam emprestando, disse Valério aos seus advogados.

O empresário tratou ontem dos próximos passos para provar que agia em nome do PT e que as operações financeiras foram para o partido. Foi no quarto andar do Palácio do Planalto, onde ficava o gabinete de José Dirceu, que Marcos Valério levou Ricardo Guimarães para uma conversa com o ex-ministro em 2004. Logo depois do depoimento de Renilda, José Dirceu alegou que não se lembrava de encontros. Depois, pensou melhor e divulgou uma lacônica nota dizendo que se encontrou com diretores dos Bancos Rural e BMG em ocasiões diferentes e por socilitação das entidades. Na mesma nota, disse que em nenhum momento tratou de empréstimos ao PT.

Marcos Valério aguarda o depoimento de José Dirceu à Comissão de Ética da Câmara, amanhã. A intenção dele é desenhar melhor sua estratégia depois da sabatina do ex-ministro, Até quarta-feira, Valério irá prestar um novo depoimento espontâneo ao procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza. O empresário quer mostrar que está disposto a colaborar com as investigações. E tentar, assim, evitar seu pedido de prisão. José Dirceu tomou conhecimento na noite de ontem sobre esta reportagem e não fez nenhum comentário.


Ângela age com muita discrição

A psicóloga Ângela Saragosa tem um comportamento discreto "como cabe a uma ex-mulher de um ex-ministro". É assim que se refere a ela um membro do diretório nacional do PT que costuma dizer apenas que José Dirceu parece ter um bom relacionamento com a ex-mulher e, antes da crise, costumava levar a filha que tem com Ângela, Joana, às reuniões do PT em São Paulo. "Dirceu trazia a menina para as reuniões do partido desde que ela era de colo", disse. Outro dirigente que já fez parte do diretório nacional do PT não ficou surpreso com a informação de que havia suspeitas de que Dirceu teria pedido empréstimo para comprar um apartamento para a ex-mulher. "No bunker que o Zé está mantendo em Brasília para se preparar para a defesa na Comissão de Ética, este assunto já surgiu várias vezes, mas ele tem tido que a Ângela tem como provar que o apartamento é fruto de herança ou foi comprado com dinheiro de herança da família dela", afirmou.

Ângela é a segunda das três mulheres com quem José Dirceu se casou. O relacionamento terminou em 1990, e no ano seguinte, José Dirceu conheceu sua atual esposa, Maria Rita Garcia de Andrade, uma antiga companheira de militância. Quando se uniu a Ângela, Dirceu havia voltado ao Brasil, diretamente de Cuba, depois da anistia política, em 1980 e já estava separado de sua primeira esposa, Clara Becker, com quem casou na clandestinidade usando o nome falso de Carlos Henrique Gouveia de Mello.

Dona de três butiques em Cruzeiro do Oeste, interior do Paraná, Clara Becker casou com o ex-ministro em1976 e é mãe de seu primeiro filho, José Carlos, em 1978. Num livro que escreveu contando suas memórias, Dirceu diz que Clara não sabia de seu verdadeiro nome, nem conheceu sua verdadeira face, já que passou por várias cirurgias no exílio em Cuba. "Fiz prótese no nariz, puxei o rosto e mudei os olhos, passei a usar óculos, deixei o bigode crescer e mudei o corte de cabelo", revela ele. Clara só ficou sabendo da verdade no dia da Anistia, em 28 de agosto de 1979 e diz que, diante do choque, não teve alternativa a não ser mandá-lo sumir de vista. O filho conhecido hoje como Zeca Dirceu, prefeito de Cruzeiro do Oeste, diz já ter perdoado o pai, há muito tempo. Dirceu tem uma terceira filha, Camila, de 5 anos, que mora em Itaúna, próximo a Belo Horizonte, fruto de uma relação não conjugal


Empresário confirma pagamento

Marcos Valério confirma que o assessor do ex-ministro José Dirceu, Roberto Marques, sacou R$ 50 mil de uma das contas da SMPB, no Banco Rural. Mais conhecido como Bob, Marques é amigo de Dirceu há 20 anos, prestando serviços de toda a natureza. Um fax com papel timbrado do banco, em que a diretora financeira da SMPB, Simone Vasconcelos, autoriza Marques a fazer o saque referente ao cheque 414270, foi apreendida pela Polícia Federal. Desde que a denúncia veio à tona no último sábado, Dirceu e seu assessor, mais conhecido como Bob, têm repetido que se trata de uma "armação".

A diretora financeira deverá confirmar a versão de Marcos Valério, em depoimento hoje à Polícia Federal. Simone não foi encontrada ontem, em sua residência, um apartamento de luxo no bairro de Lourdes, em Belo Horizonte, mas já confirmou à PF que deporá hoje. Na quarta-feira, ela falará à CPI dos Correios, no dia seguinte ao depoimento de José Dirceu à Comissão de Ética da Câmara.

O dinheiro foi destinado a Marques em 15 de junho de 2004. A SMPB havia admitido que outro poderia ter sacado no lugar de Bob. Conforme documentos em poder da CPI, o autor do saque foi Luiz Carlos Mazano, que teria ido a boca do caixa da agência do Banco Rural, no dia seguinte, 16 de junho. Mas Marco Valério afirma que o autorizado era Bob O assessor tem sustentado que o nome completo que consta no documento, já em poder da CPI, não é o seu e disse que o número do CPF não confere com o do documento do Banco Rural.

O advogado de Dirceu, o criminalista José Luis Oliveira Lima, negou que Marques tenha recebido a autorização e não admite, sequer, que Bob tinha estado "em momento algum em qualquer agência do Banco Rural". José Dirceu divulgou nota, no sábado, se dizendo "indignado" com as denúncias envolvendo o assessor. O deputado Carlos Abicalil (PT-MT) divulgou nota semelhante à de Dirceu, dizendo que o documento apresentado à CPI está sob suspeição. Abicalil é membro da CPI dos Correios.

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