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EDUCAÇÃO - O preço da ignorância

Desde o Império, o país convive com a descontinuidade de investimentos no ensino, por sucessivos governos. O resultado é que, em pleno século 21, ainda se convive com índices vergonhosos de instrução.






Erika Klingl
Da Equipe do Correio
 

Daniel Ferreira/CB
Retrato do descaso: escola 53 em Taguatinga teve portão atingido por 12 tiros. uma semana antes, um corpo foi encontrado nas proxiimidades
 
Mesmo com dois séculos de investimentos em política educacional, o Brasil ainda amarga índices vergonhosos quando o assunto é a instrução de seu povo. Apenas 9% das pessoas com idade entre 18 e 24 anos estão no ensino superior, 30% dos jovens fazem o ensino médio e só 12% das crianças com menos de três anos estão em creches. O motivo desse descompasso não é tão complexo como se imagina: a educação nunca foi verdadeiramente uma prioridade dos governos e até do povo. Foi importante, mas não prioritária. A diferença desses dois adjetivos define se as ações voltadas para a educação serão duradouras e, principalmente, se haverá dinheiro para o ensino.

"Podemos dar teto, comida, roupas, que são itens importantes. Mas, sem educação, não estaremos desenvolvendo o ser humano. O Brasil é a 12ª economia mundial, mas está em 73ª lugar quando o assunto é IDH", afirma Viviane Senna, presidente do Instituto Ayrton Senna. "São duas fotografias de um mesmo país. E o grande desafio é diminuir a distância entre os dois retratos."

Na última sexta-feira, em um discurso no Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva resumiu a histórica falta de investimentos. "Há 20 ou 30 anos, o país poderia ter pensado em investir na educação, já que todos os governantes tinham, no mínimo, diploma universitário", provocou. "Nós precisamos reconhecer que o Brasil não pode mais discutir o dinheiro da educação como gasto. É um investimento sagrado." Apesar da afirmação de Lula, o Brasil assistiu, nos últimos 18 meses, a uma queda-de-braço entre os ministérios da Educação (MEC) e da Fazenda para definir os recursos da União que seriam investidos no Fundo de Desenvolvimento do Ensino Básico (Fundeb), Proposta de Emenda Constituicional (PEC) que está no Congresso há dez dias.

Causas
O Correio ouviu mais de uma dezena de especialistas, economistas e políticos para descobrir porque ainda faltam professores, vagas para alunos, e a qualidade de ensino é aquém da necessária. Apesar da declaração do presidente, ainda há quem veja com grande desconfiança a lista de importâncias do atual governo. Juçara Dutra Vieira, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) garante que no topo das prioridades está a manutenção do equilíbrio fiscal. Apenas 12% dos gastos públicos do país são voltados para o ensino. A média dos países da América Latina é de quase 14%.

Em um aspecto todos concordam: o quadro já foi muito pior. Em 1970, por exemplo, 33% dos adultos brasileiros eram analfabetos. Em 2003, o número caiu para 11,8%. "Não acredito que o cenário é de terra arrasada, como se a educação do país fosse um caos", afirma o ministro da Educação, Tarso Genro. "Estamos trabalhando para mais que dobrar o número de jovens nas escolas nos próximos anos."
O prazer de ir à sala de aula diminui quando os atores do ensino se sentem ameaçados. Adultos e crianças que freqüentam a escola 53 do Chaparral, em Taguatinga, correm esse risco. Há menos de um mês, o portão da escola foi atingido por uma rajada de tiros. Foram mais 12 marcas que se somaram às dez que já estavam lá. Na frente da escola, há duas semanas, as crianças com idade entre quatro a 12 anos que estudam no colégio encontraram o corpo de um jovem de 16 anos estirado com dois tiros, em frente ao local.

"Uma coisa é certa, se pelo menos metade das políticas no setor tivessem sido concluídas, o cenário seria bem melhor", afirma Vera Mazagão, presidente da Ação Educativa. Um exemplo recente confirma. O Fundo Nacional pelo Desenvolvimento do Ensino Fundamental (Fundef) só não será extinto, no prazo previsto de dez anos, porque deve ser substituído pelo Fundeb. Em oito anos de existência, esse fundo garantiu acesso a 97% das crianças à escola.

Desde o Império
Antes do Fundeb, foram inúmeras idas e vindas. Em 1827, uma lei promulgada pela Assembléia Geral do Império, determinava a criação de escolas em todas as vilas e localidades do país. Não foi implementada porque, alguns anos depois, a responsabilidade foi transferida para as províncias e municípios, que não tinham condições para a missão.

Durante o Império ou na fase republicana, não faltaram intelectuais e políticos para denunciar o caos na educação brasileira. Rui Barbosa, em 1882, chegou a calcular que o Brasil, mantendo o mesmo percentual de crescimento de matrículas, levaria 799 anos para chegar ao patamar de países desenvolvidos.

Em 1932, o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, redigido por Fernando de Azevedo e assinado por intelectuais, anunciava que nada superaria em importância a educação. Não foram ouvidos. Em 1945, eles voltaram a defender o ensino no primeiro Projeto de Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Novamente a reforma foi postergada, vindo a ser retomada apenas nos anos 50.

Recentemente, mais perdas. O Plano Nacional de Educação, aprovado em 2001, determinava o investimento de 7% do PIB na educação. O item foi vetado pelo ex-presidente Fernando Henrique. "A gente estimava que seria necessário investir 10% do PIB, mas hoje são apenas 4%. Naquele momento, ficou claro que a educação não seria prioridade", argumenta Juçara Dutra, do CNTE.


Precisamos reconhecer que o Brasil não pode mais discutir o dinheiro da educação como gasto. É um investimento sagrado

Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República



O número
30%
dos jovens brasileiros estão matriculados no ensino médio

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