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Até já, Jucá - João Mellão Neto

A cada dia que passa, novas denúncias são produzidas contra Romero Jucá. Por tudo o que eu ouvi a seu respeito, quando estava no Congresso, o que se apurou até agora é apenas a ponta do iceberg. O mínimo que se pode afirmar é que Jucá, quando morrer, com certeza não vai para o céu.


No início de abril de 1992, às vésperas de ser nomeado ministro, fui convocado para uma reunião importante na Presidência da República. Estava em gestação o 'Ministério ético' do presidente Collor e o então ministro da Secretaria de Governo, Jorge Bornhausen - que até então eu não conhecia -, encarregado da coordenação política, queria me entrevistar. Eu me recordo de que ele tinha em mãos um volumoso documento, meticulosamente preparado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos, antecessora do atual Gabinete de Segurança Institucional. O assunto daquele relatório, disse-me o ministro, era a minha pessoa. Fiquei impressionado com o grau de profundidade daquele trabalho. O governo sabia tudo sobre mim e sobre a minha vida pregressa. Até mesmo detalhes de que eu mesmo me havia esquecido. Bornhausen fez-me algumas perguntas sobre passagens de minha carreira pública. Percebi que, se não fosse absolutamente sincero, minha trajetória política se encerraria ali. Após o 'interrogatório', o ministro, dando-se por satisfeito, dispensou-me, dizendo que eu havia sido aprovado e que esperasse notícias do presidente. Três dias depois, Collor convidou-me para assumir o Ministério do Trabalho e da Administração. Estou narrando esse episódio para dar ciência ao leitor de que o governo federal, quando quer, sabe muito bem como triar os candidatos a cargos de alto escalão. Instrumentos para tanto não lhe faltam. Assim sendo, não consigo entender como o presidente Lula nomeou ministro alguém com passado tão polêmico como o senador Romero Jucá. O sistema de informações da Presidência não funciona mais? Ou será que é o presidente que não mais se dá ao trabalho de acessá-lo, quando nomeia os seus auxiliares? No caso do sr. Jucá, nem era necessário um grande esforço da Agência de Inteligência. Bastava enviar ao Congresso algum araponga para tomar conhecimento do que se fala abertamente - e há muitos anos - a respeito de Sua Excelência. Romero Jucá iniciou sua carreira na década de 1980, quando ocupou a presidência da Funai e depois foi nomeado governador do então Território de Roraima. Falam-se horrores de sua gestão. O menos que se diz trata de supostas relações duvidosas com garimpeiros, madeireiros e contrabandistas. Nada se provou, é verdade, mas o fato é que, ao término de seu mandato, o governador, de origem humilde, se tornara um homem muito rico. Elegeu-se várias vezes para o Congresso Nacional, onde tive oportunidade de conhecê-lo. Na incansável defesa dos altos interesses de Roraima, tornou-se um assíduo freqüentador de todos os gabinetes federais de alguma forma ligados às questões da Amazônia. Empresário de sucesso, seu patrimônio se multiplicou na mesma velocidade com que conquistava amizades poderosas - governo após governo - em Brasília. Seus opositores diziam que, na mansão que construíra em Boa Vista, entre outros itens de conforto, todas as torneiras eram de ouro maciço. O tema mereceu uma reportagem da revista Veja. Jucá respondia que tudo não passava de intriga mesquinha. Mesmo assim, ele jamais permitiu que a imprensa fotografasse o interior de sua residência. E foi ficando cada vez mais rico. Se o presidente Lula se tivesse dado ao trabalho de colher informações no Senado, certamente ficaria sabendo que nenhum colega de Jucá se arriscaria a comprar dele um carro usado. Mas Lula, ao que parece, não se interessa por informações. Prefere dar ouvidos ao que lhe dizem os mais chegados. Um deles, Renan Calheiros, lhe afiançou que o senador Jucá é um bom sujeito. Como, para Lula, amigo de amigo também é amigo, bastou a sugestão do presidente do Senado para que o estadista de Roraima fosse ungido ministro. A malvada da imprensa não precisou de muito esforço para descobrir que o novo titular do Ministério da Previdência tinha um imenso telhado de vidro. E vem fazendo, pelo presidente, o volumoso dossiê que este não se preocupou em encomendar anteriormente. O bem-sucedido empresário Jucá, por exemplo, está inadimplente com o Banco da Amazônia em R$ 18 milhões. Levantou um empréstimo para financiar um aviário, deu como garantia propriedades rurais que não existiam e, pelo visto, não pretende saldar o compromisso tão cedo. Situação irônica, descobriu-se também que o ministro da Previdência, quem diria, deve dinheiro ao próprio INSS, que agora dirige. Virou cobrador de si mesmo. Dotado de alma cristã, ele fundou, no passado, uma instituição filantrópica que recebia verbas federais. Sabe-se agora que o objeto maior de sua caridade era ele próprio. Isso é pecado, ministro! A cada dia que passa, novas denúncias são produzidas contra Sua Excelência. Por tudo o que eu ouvi a seu respeito, quando estava no Congresso, o que se apurou até agora é apenas a ponta do iceberg. O mínimo que se pode afirmar é que Jucá, quando morrer, com certeza não vai para o céu. Como Lula tem uma notória dificuldade para defenestrar os seus auxiliares, o próprio ministro, se tivesse escrúpulos, já deveria ter percebido que não tem condições políticas para permanecer no cargo. Deveria renunciar e voltar ao Senado, onde poderá usufruir, sem maiores amolações, os muitos milhões que arduamente amealhou. Bye, bye, Jucá. Se for por falta de adeus, até logo.

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