00:00:00

JUÍZES - Ligação que favorece a impunidade

Parte dos juízes brasileiros tem dificuldade de ter uma postura de magistrado em suas decisões pelo comprometimento com o poder político e econômico. Essa é uma das impressões sobre o Poder Judiciário que o relator especial das Nações Unidas (ONU) sobre a independência de juízes e advogados, Leandro Despouy, leva do país, após encerrar uma visita de 12 dias. Esse problema, segundo ele, implica na impunidade. ''Em muitas cidades do interior, a ligação dos juízes com os setores que detêm o poder político e econômico acaba por afetar a independência do Judiciário e explica o alto nível de impunidade verificado nessas cidades'', verificou Despouy.


Paulo Mario Martins Da equipe do Correio Givaldo Barbosa/Agência O Globo Parte dos juízes brasileiros tem dificuldade de ter uma postura de magistrado em suas decisões pelo comprometimento com o poder político e econômico. Essa é uma das impressões sobre o Poder Judiciário que o relator especial das Nações Unidas (ONU) sobre a independência de juízes e advogados, Leandro Despouy, leva do país, após encerrar uma visita de 12 dias. Esse problema, segundo ele, implica na impunidade. ''Em muitas cidades do interior, a ligação dos juízes com os setores que detêm o poder político e econômico acaba por afetar a independência do Judiciário e explica o alto nível de impunidade verificado nessas cidades'', verificou Despouy. O relator mostrou preocupação também com a existência de denúncias de envolvimento de magistrados com a exploração sexual de menores. ''Talvez a situação mais preocupante da realidade brasileira seja a precária situação em que se encontram as crianças e os adolescentes. Os testemunhos mostram que, no Norte e Nordeste, a maioria dos crimes sexuais contra crianças e adolescentes não é investigada e que, em muitos casos, existe o envolvimento do próprio Poder Judiciário'', denunciou. O avanço da criminalidade no Brasil deixou Despouy alarmado. Inclusive as ameaças contra magistrados e integrantes do Ministério Público de que teve conhecimento nos estados de Pernambuco e Amazonas. Minorias A dificuldade de acesso ao Judiciário pelas pessoas mais pobres foi outra conclusão de Despouy. Para ele, a situação é pior quando envolve crianças, adolescentes, mulheres, indígenas, homossexuais, transexuais, quilombolas, negros, idosos e integrantes de movimentos sociais, como os trabalhadores sem terra. Ele observou que aqueles que conseguem vencer esse obstáculo enfrentam outro: a morosidade da Justiça. São Paulo é o estado onde a lentidão é mais grave, disse ele. ''Há cerca de 13 milhões de processos em andamento, sendo que há um juiz - cada um com oito a dez mil processos em curso - para cada 24 mil habitantes. Há lugares no país onde a Justiça está em colapso''. Despouy não foi enfático, mas deixou entrever que está do lado do Ministério Público, que luta para manter o poder de investigação. ''A experiência comprova que a investigação não pode ser monopólio de um único setor. A chave está em definir o papel de cada um dos atores. É preciso uma articulação adeqüada entre o Ministério Público, a polícia e os juízes. E, por outro, em que a resposta investigativa necessita de aprimoramento, o princípio da complementaridade exige uma adequada articulação entre os vários atores encarregados de levá-la a cabo'', disse. A respeito da reforma do Judiciário, ele defendeu o controle externo do poder e a criação do Conselho Nacional do Ministério Público. Despouy demonstrou ser favorável à adoção da súmula vinculante, que obriga as instâncias inferiores da Justiça a decidirem seguindo o entendimento dos tribunais superiores. ''Não é razoável que o Supremo Tribunal Federal resolva uma questão jurídica e a controvérsia continue nas instâncias ordinárias, o que afeta o princípio da segurança jurídica''. O representante da ONU adiantou que vai constar em seu relatório - que deve ser concluído até dezembro e votado pela Comissão de Direitos Humanos da ONU em março de 2005 - a recomendação de que haja autonomia financeira, funcional e administrativa da Defensoria Pública. O relator também vai sugerir que a reforma do Judiciário ''preserve todas as garantias do processo judicial e ao mesmo tempo simplifique seu funcionamento''. Outra recomendação será a de criação de varas judiciais especializadas em determinados temas, particularmente a questão agrária e a defesa da infância e da juventude. Caso seja aprovado, o relatório de Despouy será a posição oficial da ONU sobre a Justiça brasileira, tendo valor de recomendação internacional.

Últimas Postagens