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Oraculo

A CIRCULO DO PO


A CÍRCULO DO PÓ

JOBIS PODOSAN

A morte física triunfa sempre sobre a vida. Cedo ou tarde, ela chega, de mansinho ou abruptamente e nos arrebata do mundo dos vivos, abrindo uma lacuna momentânea entre os demais que, em embora lamentem a perda sofrida, aguardam apenas a sua vez.
Dois irmãos, alagoanos notáveis, venceram a morte, enquanto vivos, depois de longa doença, entregando a ela apenas os seus despojos físicos, que nada mais são que elementos químicos, a se reduzirem a pó, materializando o brocardo latino memento, homo, quia pulvis es et in pulverem reverteris, que significa em vernáculo: Lembra-te, homem, que és pó e ao pó reverterás, na tradução do Padre Vieira. No Sermão da Quarta-Feira de Cinzas lembra o famoso orador sacro, que somos pó antes de nascer (pó potencial), pó depois de nascer e até a morte (pó animado) e pó após a morte, (pó inanimado). Assim, o nosso corpo não se converte em pó após a morte, mas reverte ao pó que nunca deixou de ser. Ouçamo-lo:
Esta nossa chamada vida não é mais que um círculo que fazemos de pó a pó: do pó que fomos ao pó que havemos de ser. Uns fazem o círculo maior, outros menor, outros mais pequeno, outros mínimo. Mas, ou o caminho seja largo, ou breve, ou brevíssimo, como é círculo de pó a pó, sempre e em qualquer parte da vida somos pó. Quem vai circularmente de um ponto para o mesmo ponto, quanto mais se aparta dele tanto mais se chega para ele; e quem quanto mais se aparta mais se chega, não se aparta. O pó que foi nosso princípio, esse mesmo, e não outro, é o nosso fim, e porque caminhamos circularmente deste pó para este pó, quanto mais parece que nos apartamos dele, tanto mais nos chegamos para ele; o passo que nos aparta, esse mesmo nos chega; o dia que faz a vida, esse mesmo a desfaz. E como esta roda que anda e desanda juntamente sempre nos vai moendo, sempre somos pó.
Porém, somos mais que matéria. Sobre a matéria paira o espirito imortal, que não sucumbe com ela, mas dela se aparta, para que ela cumpra o seu destino de ser apenas pó, de mais nenhuma serventia.
Parafraseando ainda Vieira, perguntamos onde estão os notáveis do Império até a República Velha, onde estão os três Pedros que se notabilizaram desde o descobrimento até a queda do Império em 1889? Onde estão os presidentes da República Velha: Marechal Manuel Deodoro da Fonseca,  Floriano Vieira Peixoto,  Prudente José de Morais e Barros, Manuel Ferraz de Campos Sales, Francisco de Paula Rodrigues Alves;  Afonso Augusto Moreira Pena; Nilo Procópio Peçanha, Marechal Hermes da Fonseca. Venceslau Brás Pereira Gomes, Delfim Moreira da Costa Ribeiro, Epitácio da Silva Pessoa. Artur da Silva Bernardes, e Washington Luís Pereira de Sousa? Onde estão Getúlio Vargas, Juscelino Kubitscheck, Jânio Quadros ou os presidentes militares pós golpe de 1964? Todos mortos. Tudo pó. Todos cumpriram os seus círculos do pó.
Sobreviveram os efeitos da vida encarnada, os bons e os ruins. Mas por detrás da carne fraca e destrutível pelo tempo, há uma outra vida que não se extingue e nem se destrói, sendo esta a crença de toda as pessoas que acreditam na existência dual do ser humano: somos espírito e matéria e esta convicção nos leva a crer, sem lugar para dúvida, na existência de um Ser Supremo que nos guia e nos dirige a vida espiritual, atribuindo significado às nossas ações e às nossas vidas.
Os dois irmãos alagoanos que acima referi são o Cardeal Católico  D. Avelar Brandão Vilela (13 de junho de 1912 — Salvador, 19 de dezembro de 1986) e o empresário e político brasileiro Teotônio Brandão Vilela (Viçosa, 28 de maio de 1917 – Maceió, 27 de novembro de 1983), ambos acometidos de câncer, deixando ambos preciosas lições de prevalência do espírito sobre a matéria. O primeiro consolando o povo baiano que lhe chorava a morte iminente e o segundo calçando as sandálias da humildade e da entrega em holocausto, pregando no Brasil a mensagem cívica da necessidade de restabelecer a democracia no Brasil, percorrendo grande parte do território nacional, buscando o assentimento do povo, ao restabelecimento da democracia no Brasil, enquanto a doença lhe vitimava o corpo.
Ambos compreenderam, ainda em vida, o significado do círculo do pó. O Cardeal, com certeza, leu Vieira, o Senador Teotônio Vilela, deixou fortes indícios que que também conhecia o vigário português, cujos Sermões iluminavam e iluminam a consciência dos homens e mulheres úteis do nosso sofrido pais de aproveitadores..
Que bom seria se esses homens e mulheres que estão brigando pelo poder lessem o Padre Vieira, talvez descobrissem que são apenas pó e dessem um significado diferente ao poder que buscam!
Antes de reverterem ao pó.

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