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Oraculo

Reflexoes sobre o Poder Judiciario (3)


Reflexões sobre o Poder Judiciário (3)

JOBIS PODOSAN

  1. A corrupção, quando pontual, exige do acusador prova cabal; quando é generalizada, arrebanha a todos e passa a ser uma verdade que a todos iguala no rodapé da honra. A consequência é nefasta: quando todos passam a ser suspeitos, os verdadeiros corruptos, aqueles da corrupção se beneficiam, riem às gargalhadas dos tolos que creem que a honra não mais existe. Enganam-se. Vão todos eles penar nas cadeias do Estado e nas cadeias da sociedade, estas mais atrozes, porque atingem as famílias desses degenerados, que as degenerou também.
  2. A acusação de corrupção geralmente deixa o corruptodesproporcionalmente indignado. Ele professa sua fé incomensurável na Justiça, acusa e julga os juízes que o condenaram, que passam a sofrer também a pecha de corruptos, alega falta de provas, usa adjetivos em profusão a respeito de sua própria honra, invoca a Deus e à família como valores vetores de suas vidas. Enfim, lembram tudo o que esqueceram nas horas de reflexão anteriores ao cometimento dos crimes. Nesta hora, só veem os gozos desfrutáveis com o dinheiro alheio.
  3. Se o juiz tivesse vinte braços e fosse onisciente faria sozinho todo o trabalha da sua vara. Como não tem, necessita de auxiliares, que vêm a ser as suas mãos e sua ciência. Resulta daí que o cartório é o juiz e o juiz é o cartório. Um é o outro. Só que o juiz é a cabeça, enquanto que o cartório é o corpo. Um comanda e o outro obedece. É por isto que a responsabilidade pelo resultado e qualidade do trabalho é sempre do juiz. Quando o juiz acusa o cartório acusa a si mesmo. Quando o cartório erra (o famoso erro cartorário) entra em ação o poder permanente de correição do juiz. Se o cartório recebe ordem para oficiar, citar, intimar ou notificar e não cumpre no prazo assinalado na lei; se o oficial de justiça recebe o mandado e não cumpre; ou cumpre fora do prazo; fica a aquém ou vai além do mandado; ou demora de devolvê-lo, após cumprido,  a responsabilidade é do juiz, que pode, a qualquer tempo, ser acionado pelo interessado para fazer prevalecer a sua autoridade. Se o cartório ou o juiz praticam represáliascontra quem reclama por direito, aí já não haverá sequer juiz, mas puro arbítrio. O poder de correição sobe e o corregedor que está acima deve fazer a correição desse juiz desatento com os seus deveres. Se tudo se resolve no compadrio ou no corporativismo, aí não haverá mais justiça formal e o Estado de direito faliu.
  4. O juiz encabeça e comanda o sistema dos quatro necessários do qual resulta a entrega da prestação jurisdicional. O Ministério Público, os advogados e os auxiliares do juiz completam o sistema. Da interação permanente desses atores, uns fiscalizando os outros e nenhum se melindrando com a fiscalização, o juiz, fiscal e maior fiscalizado, condutor do sistema, chega à sentença em prazo razoável para o cidadão (CF, art. 5º, LXXVIII). Toda vez que o processo emperra, está parado por culpa de algum desses atores. Cabe aos outros levarem o problema ao juiz, ainda que seja ele o faltoso, para que ele possa, mercê de sua autoridade, impulsionar o feito e fazer as correções de rumo necessárias.Quanto menos o juiz se considerar divino, mais se aproximará Deus. O juiz, quando pensa que é Deus, com certeza, despacha os processos da e para a eternidade.
  5. A substituição do impulso oficial (obrigação) pelo impulso oficioso (atendendo a pedidos) desmoraliza a justiça, enfraquece o juiz, difama os servidores e solapa a crença do cidadão. Expedientes oficiosos, como lembranças, incentivos, colaborações e intimidades são incompatíveis com a dignidade da justiça. Processos devem caminhar. O atraso injustificado, não raro leva à adoção de métodos atentatórios à justiça. Pululam comentários sobre isso. O melhor mesmo é evitá-los, empurrando o processo ao seu destino.
  6. Quando quem pode mandar manda, tem de conferir se quem deve obedecer obedece. Se quem deve obedecer não obedece, manda, ao invés de obedecer. Manda pelo poder de impedir que a ordem superior seja cumprida. Trata-se de omissão reveladora da falta de autoridade de quem devia mandar, mas não manda.  Os comandos do juiz são imperativos para o cartório e para todos os seus auxiliares. Não cumprir, cumprir mal ou retardar o cumprimento,são formas qualificadas de desobediência hierárquica que gera para o interessado no ato procedimental o direito de reclamar.
  7. No que o Estado tem privilégios especiais a parte tem de tolerar. Mas no que não tem e se autoatribui a parte tem o direito de reclamar. O juiz não tem que suportar que o Estado cumpra sua ordem quando quiser. Afinal o Estado também está sujeito à autoridade do juiz, embora nem sempre os juízes lembrem disso.
  8. Quando o Estado tem privilégios no processo não são eles dirigidos ao Estado em si, mas à proteção dos direitos dos demais cidadãos contra direito invocado por um ou alguns. É a proteção do todo contra as investida da parte. Todavia, reconhecido o direito da parte, o todo à jurisdição se curva. Quanto ao juiz, ele deve ter – e tem – autoridade para fazer cumprir a sua decisão, sem aceitar chicana do Estado. Em certos processos o Estado está agindo contra e sobre a decisão judicial. Daí o direito de reclamar que o cidadão exerce, para pedir que faça com que o Estado-Administração obedeça ao Estado-Juiz, como é e deve ser no Estado de Direito, adotado no primeiro artigo da nossa Constituição. Para alguma coisa isto deve valer e servir.
  9. Age bem o juiz quando fiscaliza os atos dos seus auxiliares e os faz cumprir as suas determinações. Age mal quando acoberta as omissões ou os “erros cartorárias”, pois o poder que emana de fora para dentro – que é o poder do povo – é maior que o poder de dentro para fora – que é o poder instrumental do juiz. O poder do juiz é poder do povo, exercido por um do povo, a serviço do próprio povo. Aliás, isto está sonoramente escrito no art. 1º, parágrafo único, da Constituição.
  10. Alguém inventou de guardar os processos em andamento em caixas. Esse alguém esqueceu o perigo que isto representa. As caixas devem ser reservadas aos processos findos. Guardar em caixas é dar chance ao azar. O descuido pode fulminar um processo. A má-fé, certamente adora o aconchego cúmplice das caixas, onde o crime pode se esconder impunemente. Bibliotecas imensas têm todos os seus livros expostos, com numeração e manuseio adequados, sem essas malditas caixas que facilitam e estimulam as perdas, propositais ou não.

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