- 19 de novembro de 2024
O Plano Real
JOBIS PODOSAN
Caminhava o Brasil ladeira abaixo desde o governo Sarney quando sobreveio a eleição de Fernando Collor, em 1989. Os que nele votaram, imaginavam que não era possível piorar, esquecidos que piorar é sempre possível. Disputando a eleição em segundo turno contra o futuro Fundador do Brasil, Collor se comparou com ele e levou vantagem aos olhos do povo dizendo, entre outras coisas, que o Fundador não sabia distinguir uma promissória de uma duplicata, ressaltando a pouca instrução do seu opositor.
Havia muitos candidatos bons naquela eleição, mas o povo se vingou da subtração ao seu direito de votar atirando contra o próprio peito, colocando no segundo turno duas figuras que, a rigor, nem deveriam ter coragem de concorrer ao cargo de Presidente do Brasil, se tivessem desconfiômetro. No Brasil, todos se acham capazes de exercerem qualquer cargo público eletivo, quanto mais alto o cargo maior o atrevimento dos candidatos. Pessoas sem qualificação para ocuparem simples cargos de execução nas carreiras mais simples do serviço público, acham que podem ser dirigentes do país ocupando cargos políticos, providos pelo voto, nos quais os requisitos são somente ser cidadão e alfabetizado. Uma vez eleitos, começa o martírio, que acaba no impedimento ou, modernamente, na prisão. Eleição não atribui a ninguém qualidades que já não estejam dentro do eleito. O eleito é o mesmo no dia anterior e no dia posterior à eleição. É um imbecil? Continua sendo imbecil. É despreparado? Continua despreparado. É um iletrado? Continua sendo um iletrado. O eleito leva para o cargo a bagagem que tinha antes da eleição. Eleição mede o candidato quantitativamente. Teve mais votos? Venceu, embora despido de qualidades para o exercício da função. Este é o Calcanhar de Aquiles da democracia: o eleito é autorizado a governar, preparado ou não para a função. Se for despreparado, o povo paga o preço pela sua escolha. Quando o povo age de maneira inteligente, elege o melhor; quando elege estupidamente, elege o mais demagogo e enganador e sofre os efeitos de sua má escolha. É assim, aliás, com todas as escolhas que fazemos.
A democracia é o pior dos regimes, com exceção de todos os demais, disse Winston Churchill, assinalando que viver numa democracia tem o seu preço. O preço é este. Às vezes se elege alguém, que não tem condição nem de dirigir um armarinho, para o mais alto cargo de país. Às vezes elege-se alguém de baixa extração moral, que usa a honestidade e a moral como recursos de retórica, quando, na verdade, são requisitos mínimos de convivência entre as pessoas. Sequer são virtudes, são condutas apenas obrigatórias, exigíveis em todos os relacionamentos. Mas a situação pior ocorre quando as duas mazelas estão presentes: reúnem-se na mesma pessoa o demagogo despreparado e o louco moral. O país todo desce ao precipício e a meta a buscar a é restauração da moralidade, pois sem esta nenhum progresso material é útil. Veja-se o caso das sucessivas operações das polícias e do Ministério Público. Nenhuma serve de freio à sanha dos corruptos. As pessoas se refestelam na imoralidade como se isto fosse virtude. Apresentam-se como vitoriosas quando são lixos sociais.
Defenestrado Collor pelo impeachment em 1992, ascende à Presidência mais um presidente improvável (no Brasil o cargo de vice-presidente passou a ser mais atraente do que o de presidente, pois estes, para se elegerem precisam enganar tanto que terminam vítimas de si mesmos e o improvável, aquele que jamais seria eleito se disputasse a eleição para presidente, se torna o chefe da nação sem os votos legitimadores do mandato): Itamar Franco, que pegou o Brasil na lona. Tinha rara qualidade (só isto, nada mais que isto) de ser um homem honrado, neste país de políticos desonestos. Triste país onde ser honesto é qualidade! Honestidade não é virtude, virtude é o que se associa a ela e torna o cidadão prestante. Honestidade é o degrau mais baixo da escada da virtude. Com ela se começa, mas ela só não basta para governar um país.
Mas no Brasil, dada sua raridade, a honestidade fez-se virtude e Itamar, em meio ás trapalhads do seu governo, nomeou Fernando Henrique Cardoso para o Ministério da Fazenda e este, sendo sociólogo culto e um intelectual de escol, sabendo de sua pequenez de conhecimentos econômicos, escolheu uma equipe de especialistas e juntos conceberam o Plano Real, que criou uma nova moeda e deu establidade ao país, plano que perdura há mais de 20 anos.
O Plano Real visou à estabilização econômica, tendo iniciado oficialmente em 27 de fevereiro de 1994, com a publicação da Medida Provisória nº. 434 no Diário Oficial da União. Instituiu-se a Unidade Real de Valor (URV), estabeleceram-se regras de conversão e uso de valores monetários, iniciou a desindexação da economia, e determinou o lançamento de uma nova moeda, o Real. O objetivo principal foi o controle da hiperinflação que assolava o país. Utilizou-se de diversos instrumentos econômicos e políticos para a redução da inflação que chegou a 46,58% ao mês em junho de 1994, época do lançamento da nova moeda.
Já não dava para crer o que o Brasil tivesse jeito, que alguém pudesse recolocar o país nos trilhos, dado a quantidade de planos fracassados que antencederam o Plano Real.
O Fundador e seu partido, naturalmente, foram contra Plano Real, contra a emenda que possibilitou a reeleição de Fernando Henrique Cardoso em 1998, enfim continuou contra tudo que se tentava criar no país. Contra tudo, até que sobreveio a eleição do Fundador em 2002, quando ele se apropriou de tudo que votou contra e passou a afirmar com uma naturalidade espantosa que tudo fora obra sua, abusando da sua insciência e da não menos espantosa ignorância da maioria de famintos que o fazem líder do nada.
Foi assim com acréscimo de que o Fundador se cercou de gente desonesta e gulosa de recursos financeiros e viram o filão magnifico a sua frente, com o cego dirigindo a manada.
Deu no que deu.