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ORÁCULO

Surge Jobis Podosan


SURGE JOBIS PODOSAN

            Jobis Podosan é o brasileiro mais brasileiro do Brasil, embora pareça um nome estranho. Há muita esquisitice por aí em termos de nome, mas o de Jobis não. Ele vem de um dos nomes mais comuns no Brasil. Ele sozinho poderia eleger prefeitos, vereadores, deputados. Mas Jobis não sabe bem o que é isso, ninguém jamais disse a ele que diabo é eleição, voto, cidadania e coisa que tal. É certo que ele ouve falar aqui e ali que tais coisas existem, mas é um saber sem saber, sem convicção, sem proveito.

            Jobis vive para viver. Cada dia é uma aventura, cada refeição (na linguagem dele, cada vez que come) é uma sensação de felicidade e de angústia: felicidade por ter comido, angústia pela fome que virá sem a certeza de haver alimento. Mas Jobis é um forte, a despeito de nem todos eles serem sertanejos e “não desiste nunca”. É um forte porque, apesar de tudo, resiste. E não desiste nunca porque a alternativa é a morte. Como lenitivo para o sofrimento diário, Jobis é corintiano e sofre alegremente. O timão é sua dor e sua alegria, uma compensando a outra e ambas seu motivo para viver.

            Na eleição passada Jobis foi tentado. Um candidato ofereceu-lhe oito quilos de arroz, que Jobis recusou, mas depois se arrependeu. Todo mundo na rua tinha aceitado e Jobis passou por bobo ou soberbo. Otário, diziam uns; metido a besta, acusavam outros. Onde já se viu pobre recusar comida? Alguma coisa dizia a Jobis que ele estava certo e os outros errados, mas o quê? Jobis não atinava.

Já adulto Jobis resolveu estudar o ensino fundamental, disseram que ele tinha direito, apesar de adulto. Havia uma tal de Constituição, que Jobis já ouvira falar na televisão, mas que era só um livro e Jobis não confiava em livros: cheios de palavras bonitas, mas sem nenhum efeito prático na sua vida. É verdade que Jobis sabia ter alguns direitos, nas eleições os candidatos falavam sobre isso, alguns até foram na favela em que morava, disseram belas palavras, a vida de Jobis ia melhorar, a rua teria asfalto e meio fio, até água prometiam. Bons homens aqueles candidatos, pena que, passada a eleição, todos sumiram, até o que foi eleito. Jobis votou nele, mas de nada adiantou, o homem sumiu, escafedeu-se.

Mas Jobis precisa viver, sobreviver. Ajudante de pedreiro, três filhos, a esposa de barriga do quarto, Jobis precisa trabalhar duro para botar comida em casa, não tem tempo para mais nada. Até da cachaça amiga, por tantos apreciada, Jobis precisava abrir mão.

À noite, após a jornada extenuante de trabalho, Jobis vai à escola, quer compreender certas coisas que não entende, teme não ter a cabeça boa, porque as coisas são difíceis de serem por ele decifradas. Por exemplo, por que nas eleições os candidatos vão aos bairros pobres vestidos com simplicidade, dizendo palavras fáceis de serem entendidas, prometendo tudo de que o povo necessita e depois de eleitos somem? Por que ele, Jobis, tem que decidir se candidato desonesto pode ser eleito ou não. Jobis alega não saber da vida de ninguém, já que mal tem tempo para cuidar da sua, por que então os partidos não apresentam gente limpa. Aliás, Jobis não sabe sequer por que os partidos admitem gente criminosa nos seus quadros. Para ser ajudante de pedreiro a empresa em que Jobis trabalha não permite a ninguém levar um tijolo para casa, mesmo quebrado. Jobis precisa ir para a escola aprender por que essas coisas são assim. O dono da empresa em que Jobis trabalha é todo dia acusado de ladrão pela televisão e pelos jornais, mas é suplente de senador e segundo a “rádio corredor” da empresa vai assumir a vaga no lugar do que foi eleito, que saiu para ser governador. Jobis fica intrigado: o senador pode ser ladrão, mas o ajudante de pedreiro tem de ser honesto!

Jobis não entende.

Na escola outra surpresa: a professora e o professor também não entendem, não sabem explicar a razão, dizem que não foram preparados para ensinar essa matéria. E tem essa matéria no ensino fundamental? Não, Jobis, explicou a professora. Então eu terei que cursar o ensino médio para aprender sobre essas coisas? Não, Jobis, essa matéria não é ensinada no ensino fundamental e nem no ensino médio. Terei que ir à faculdade, então? Não, jobis, nem na faculdade você vai aprender isto, só em certos cursos como o de Direito. Então é pior do que pensei, reflete Jobis: somente os doutores, e nem assim todos, aprendem a votar, mas quem elege é o povo, a quem ninguém ensina? Também não é assim Jobis, você ainda não viu os institucionais da Justiça Eleitoral no qual ela ensina no entroncamento do trem e na passagem do cometa como é que a gente deve votar?

Jobis está confuso, os professores se preocupam com ele. Jobis precisa aprender que para votar não é preciso saber nada a gente já nasce sabendo, é só votar em quem promete mais e nos dá alguma coisa.

Alguma coisa está errada, desespera-se Jobis.

Mas o quê?

Jobis Podosan quer respostas e acha que vai encontrá-las na Faculdade.

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