- 19 de novembro de 2024
Manaus teme novas mortes
Do G1 AM
Após 60 mortes, 184 foragidos e rebeliões em quatro presídios do Amazonas, Manaus vive uma onda de violência. Ao menos 12 pessoas foram assassinadas na capital, entre quarta (4) e sexta-feira (6). A sequência de crimes tem deixado moradores da cidade assustados. "Eles ficaram em liberdade e agora nós estamos presos", disse um dos entrevistados pelo G1.
Com medo das ruas, um comerciante, que é dono de uma lanchonete no entorno da Cadeia Pública Raimundo Vidal Pessoa, no Centro de Manaus, optou por mudar o horário de funcionamento do estabelecimento. Antes das rebeliões, o local ficava aberto até 22h30. Agora a opção para manter a segurança é fechar às 19h30.
O comerciante, que não quis ser identificado na reportagem, diz que teme ainda uma nova rebelião, dessa vez na Cadeia Pública, que foi reativada para receber 279 presos ameaçados de morte em presídios. O local estava fechado desde outubro de 2016, por recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
"A Cadeia [Raimundo Vidal Pessoa] não está totalmente preparada para receber esses presos. Então, todos que moram ou trabalham aqui por perto estão com medo. O que aconteceu pode acontecer novamente. Não conhecemos de fato quem é ou não fugitivo, quem tá ou não tá preso. Estamos todos em alerta. Como eles estão dizendo, vão matar pai de família, qualquer um. Isso é preocupante", disse.
O administrador Leandro Alberto mora próximo da BR-174, onde estão localizados o Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), o Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat) e o Centro de Detenção Provisória Masculino (CDPM). As duas primeiras unidades registraram mortes e a última, um princípio de rebelião, nesta semana.
"Tenho medo pelo fato de estar próximo da barreira. Minha casa fica na divisa entre o início da cidade e a Zona Rural, onde os presos geralmente se escondem. Ficamos assustados, com medo deles invadirem nossas casas para se esconder ou algo assim", comentou.
Uma moradora do Nova Cidade, bairro na Zona Norte de Manaus, disse que anda pelas ruas da cidade amedrontada. Ela esperava um ônibus perto da Cadeia Pública para ir ao trabalho. "Uma nova rebelião pode acontecer a qualquer momento, principalmente pela falta de estrutura. Nem um animal consegue sobreviver ali", desabafou ela, que também não quis ser identificada.
Um engenheiro que mora no Campos Eliseos, na Zona Centro-Oeste, contou ao G1 que não se sente seguro nem no próprio conjunto onde mora. "Não há mais segurança em lugar algum da cidade. Até mesmo o conjunto em que moro, que sempre considerei seguro, e nunca havia presenciado nenhum ato de violência se tornou alvo, com um assassinato a sangue frio em um acerto de contas de traficantes. É um absurdo. Como é possível planejar sua vida com tanto medo?", contou.
O sentimento é o mesmo vivido por uma moradora da Cidade Nova que, assim como os demais, preferiu não ser identificada. "Se antes já nos sentíamos com medo, imagine agora, o pânico tomou conta de todos. As ruas estão mais desertas que antes, parece que eles ganharam liberdade e nós fomos presos, temos que ficar atrás das grades das nossas casas enquanto eles estão por aí. Não sabemos a quem recorrer", lamentou.
Paralisações
Frente ao cenário, policiais civis do Amazonas fizeram uma paralisação para cobrar o pagamento de benefícios concedidos à categoria, segundo o investigador Nilson Ribeiro. "O governo se preocupa com estrutura física, mas não investe em recursos humanos. Tiraram nosso ticket alimentação, falta promoção, o pagamento da data-base e a terceira parcela do escalonamento. É triste a nossa situação", disse.
Nesta quinta (5), dezenas de peritos fizeram uma mobilização para denunciar a desvalorização da categoria e as condições de trabalho no IML que, de acordo com eles, é precária. Segundo os servidores, houve falta de gazes, luvas e outros materiais para trabalhar no dia da chacina no presídio, no domingo (1º).
Entenda o caso
O primeiro tumulto nas unidades prisionais do estado ocorreu no Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat), localizado no km 8 da BR-174 (Manaus-Boa Vista). Um total de 72 presos fugiu da unidade prisional na manhã de domingo (1º).
Horas mais tarde, por volta de 14h, detentos do Compaj iniciaram uma rebelião violenta na unidade, que resultou na morte de 56 presos. O massacre foi liderado por internos da facção Família do Norte (FDN).
A rebelião no Compaj durou aproximadamente 17h e acabou na manhã desta segunda-feira (2). Após o fim do tumulto na unidade, o Ipat e o Centro de Detenção Provisória Masculino (CDPM) também registraram distúrbios.
No Instituto, internos fizeram um "batidão de grade", enquanto no CDPM os internos alojados em um dos pavilhões tentaram fugir, mas foram impedidos pela Polícia Militar, que reforçou a segurança na unidade.
No fim da tarde, quatro presos da Unidade Prisional do Puraquequara (UPP), na Zona Leste de Manaus, foram mortos dentro do presídio. Segundo a SSP, não se tratou de uma rebelião, mas sim de uma ação direcionada a um grupo de presos.