- 12 de novembro de 2024
Rios ameaçados na Amazônia
Leonardo Siqueira
Do UOL, em São Paulo
O desmatamento, a poluição, a agricultura e a construção de hidrelétricas como a de Belo Monte, no Pará, estão ameaçando os rios da Amazônia, que formam a maior bacia de água doce do mundo. A afirmação é do pesquisador da universidade americana Virginia Tech, Leandro Castello. "A degradação dos rios vai afetar as populações locais, e isso tem sido observado em outros lugares do mundo. Está acontecendo no rio Mekong, no Vietnam, e no rio Ganges, em Bangladesh. E será o futuro da Amazônia, caso nada seja feito", diz.
Na visão do cientista, não há uma estrutura ou política de manejo adequada às bacias hidrográficas da região. "A previsão é infeliz e esse quadro só tende a piorar. O Brasil tem sido pioneiro em questões terrestres e de preservação das florestas, mas em relação aos rios da Amazônia, nada está sendo feito", diz.
"Os corpos de água doce do mundo estão em profundo risco. Então, é claro que a Amazônia não fica fora, pois também acaba sendo contemplada com um enorme conjunto de problemas que afeta a bacia hidrográfica", diz a pesquisadora do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), Maria Teresa Fernandez Piedade.
A Amazônia tem 4.196.943 milhões de quilômetros quadrados e a maior bacia hidrográfica do mundo, que cobre 6 milhões de quilômetros quadrados com seus 1.100 afluentes, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente. O maior bioma do Brasil é fundamental para o equilíbrio ambiental e climático do planeta e a conservação dos recursos hídricos.
Os sistemas de água doce são os mais degradados do mundo. E muitos deles já não são como antigamente graças à ação do homem. Na Amazônia, por exemplo, a pesca excessiva levou algumas espécies à extinção. O tamanho dos peixes também diminuiu ao longo dos anos.
Segundo a cientista do Inpa, estudos realizados pela entidade apontam que, das últimas décadas para cá, as cheias e as secas estão cada vez mais intensas e severas naquela região. "Isso indica que as mudanças climáticas já podem estar se fazendo sentir nestes sistemas", sugere Maria.
Para Castello e Maria, os problemas da Amazônia não estão restritos à região norte do país. "Se os rios secam, o transporte de grãos como a soja, que é exportada, pode ser comprometido, impactando a economia nacional. A seca nos rios também afeta a produção de energia elétrica em represas como Belo Monte. Se essas represas param, o Sul e o Sudeste podem enfrentar apagões", lembra Castello.
Já os efeitos do desmatamento em larga escala, seja para o extrativismo madeireiro ou para propósitos agrícolas, pode mudar o balanço hídrico do território, que é ligado ao de outras regiões, lembra a pesquisadora do Inpa. Maria Victoria Ramos Ballester, do Centro de Energia Nuclear (Cena) da USP, campus Piracicaba, lembra a importância da Amazônia para outros países. "A Amazônia tem um papel importante na redistribuição da umidade, não só no Brasil, mas na América Latina. Trata-se de um sistema de circulação regional", destaca.
O Ibama, em parceria com a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Batalhão de Policiamento Ambiental (Bpam), realizou operação na Terra Indígena Rio Manicoré, localizada no município de Manicoré, sul do Estado do Amazonas. Durante a ação, foram apreendidos aproximadamente 85 m³ de madeira em toras e foram aplicadas multas de R$ 30 mil. A madeira, em sua maior parte, angelim-pedra, estava sendo transportada na balsa Navezon B29, que também foi apreendida.
Floresta Amazônica pode virar cerrado
Outro estudo, que envolve cientistas brasileiros e americanos, aponta numa direção semelhante. A pesquisa irá analisar três eventos extremos que ocorreram na Amazônia na última década a fim de prever o impacto das mudanças climáticas e do desmatamento no ecossistema da região. A investigação receberá um milhão e meio dólares da Nasa, a agência espacial americana. Participam do estudo pesquisadores da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), e das federais de Alagoas (Ufal) e Rio Grande do Norte (UFRN).
A previsão do estudo em relação à ocorrência de eventos extremos é negativa. "Acreditamos que as mudanças climáticas irão, no futuro, contribuir para enchentes e secas cada vez mais severas e frequentes", afirma Michael Cohe, um dos cientistas envolvidos no projeto. Em outras palavras, secas como as de 2005 e 2010, e a enchente de 2009, que ocorreram na Amazônia, poderão se tornar cada vez mais comuns. Para Maria, este e outros trabalhos revelam "a preocupação com a manutenção da integridade desta imensa bacia hidrográfica".
Outro ponto que preocupa os cientistas é a construção de represas e hidrelétricas. "Isso só vai piorar os efeitos das mudanças climáticas e do desmatamento", aponta Castello, que lidera a investigação feita em parceria com pesquisadores brasileiros. Segundo ele, o desmatamento em larga escala faz com que chova menos e a região fique seca. "Isso pode fazer com que a floresta da Amazônia se transforme em uma floresta de cerrado", prevê.