- 26 de novembro de 2024
Eu não disse?!
No dia 23 de setembro do ano passado, em meio ao furor da campanha política para o primeiro turno, escrevi o a cr�?nica que transcrevo abaixo. Hoje, um dia depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) haver se decidido pela não aplicabilidade da Lei para as eleições do ano passado, parece-me que nem tudo ainda está esclarecido.
Tudo bem, não vale para as eleições de 2010, e sim para as de 2012. Mas, espera um pouco: será que a partir de 2012 nenhum político que tenha sido punido no passado – mesmo que remoto – poderá ter o registro de candidatura referendado pelos Tribunais Regionais Eleitorais? Seria condenar por presunção de que o tal tornará a transgredir no futuro. E isso, parece-me que não pode.
Pela decisão de ontem (23), o problema constitucional contemplado no artigo 16 da Carta Magna está resolvido. Beleza! Mas, uma mosquinha continua a zunir nos meus ouvidos: onde fica, por exemplo, a máxima da presunção de inocência?
Sim, porque para ficar com a ficha suja pela Lei da Ficha Limpa basta que o político tenha sido condenado por um colegiado de juízes. Isso, no entanto, não quer dizer que ele tenha diante de si esgotados todos os recursos que lhe cabem nesse latifúndio.
Por exemplo: o Tribunal de Contas da União é um colegiado de juízes, porém, está longe de ser a última palavra em termos de coisa transitada em julgado. Penas aplicadas são para ser cumpridas, e, depois disso, tudo deve voltar à estaca zero. Ou seja, é como se nunca tivesse o político praticado malfeitorias.
Terminando, fico feliz pela decisão de banir da vida pública políticos de vida torta, mas ficarei mais feliz se vir tudo sendo feito dentro da mais lídima legalidade. Fora disso, fica instituído o regime da LQQ (Legislação do Que eu Quero). Nesse regime, ninguém está livre do naufrágio.
Reveja o artigo de alhures:
Ficha Limpa e a Constituição
A Lei da Ficha Limpa é um tremendo exemplo de boa vontade. Mas dizem que de boa vontade o inferno está cheio. O aparecimento dela não deixa de ser elogiável. De iniciativa popular, prova que o povo brasileiro começa a trilhar o caminho certo com relação à visão política. Mas, ao mesmo tempo, creio que, à luz da Constituição Federal de 1988, ela não se sustenta.
Lei inconstitucional por legislar sobre cláusula pétrea. O inciso LVII do artigo 5º enfatiza que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. A valer a Ficha limpa, esse direito constitucional terá ido para o espaço. Ao invés de fatos incontestáveis, legisla sobre suposição.
Um candidato punido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) ainda pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ali encontrar guarida para sua retórica de defesa. O princípio é de presunção de inocência e não de culpa. Um gestor público ainda que inid�?neo, tem todo o direito de reivindicar tal dispositivo legal, doa a quem doer.
Por outro lado, a Lei quebra também o princípio de direito que prega que ninguém pode ser punido por um crime que não tenha a devida cominação legal à época de sua execução. Assim, é in justo e ilegal que alguém seja punido agora, em 2010, por haver renunciado ao mandato eletivo em 2002, por exemplo. Havia algo naquela ocasião dizendo que renunciar era crime?
E, por último, como fazer vistas grossas para o artigo 16 da Carta Magna, que explicita: “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência. (Nova redação, dada pela Emenda Constitucional nº 4, de 1993)”.
Morder a Constituição nesses pontos significa quebrar a segurança que cada cidadão recebe – ou deveria receber – dela própria. Ou alguém aí pensa que político é burro? Se eles aprovaram a bendita é porque sabiam que seria derrubada com facilidade no STF. Ou não? O julgamento vai sair daqui a pouco. Espero queimar a minha língua.